quinta-feira, 23 de maio de 2024

[Daqui e Dali] A culpa é (sempre) do anterior


Humberto Pinho da Silva

Na semana passada mandei reparar as fitas das persianas. Encontravam-se em péssimo estado de conservação. Consultei várias casas da especialidade. Confrontei custos, e acabei por entregar a tarefa a quem me fez melhor preço.

No dia designado apareceu-me sujeito esgrouviado, de meia-idade, portador do material necessário. Olhou as janelas, abalou doutoralmente a cabeça, e disparou: “Veja se é trabalho que se apresente! Logo se vê que foi serviço de biscateiro ou oficial incompetente. As barras estão mal casadas...”

Sorri contrafeito, recordando que o operário que as colocara, criticara acerbamente o mau trabalho do construtor por não ter executado as “caixas” devidamente espaçosas.

Em regra, critica-se o serviço do anterior: seja o pedreiro, seja o mecânico do automóvel, seja o dentista, seja o médico que, muitas vezes, sorri arteiramente do diagnóstico do colega...

Na política, que é o espelho da sociedade, acontece o mesmo: a culpa de todo o mal é sempre do anterior.

No século XIX, os liberais diziam que devido aos maus governos dos absolutistas, o país estava na penúria. Os republicanos, por sua vez, acusavam o desgoverno de D. Carlos.

Quando Salazar tomou a diretriz da nação, amargamente se lamentava que encontrou os cofres do Estado vazios, o que obrigou a um colossal aumento de impostos. Após a queda do Estado-Novo, que estava velho, todos acusavam Salazar do deplorável estado da nação, e o enorme atraso que existia perante a Europa.

Após a Revolução de Abril, sempre que se formava novo governo, o primeiro-ministro queixava-se de ter recebido a nação, mal orientada.

A culpa, em regra, é do anterior. É sempre assim, e assim será…

A propósito, há quantos anos se diz que o Brasil é o país de futuro? A nação irmã ou filha – como alguns dizem – aguarda, ao longo de vários lustres, pelo futuro que nunca chega.

E Portugal? Há quantos anos se espera por um futuro melhor? Passam décadas e décadas, gerações e gerações, e nunca se vê a prometida luz ao fundo do túnel...

Quando será que e chegaremos ao "Futuro"?

Título e Texto: Humberto Pinho da Silva, maio de 2024

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