sexta-feira, 24 de maio de 2024

Revista Oeste, Edição 128, Carta ao Leitor: O poder do povo

O desempenho dos voluntários que socorreram o Rio Grande do Sul e a aparição dos aproveitadores de tragédias estão entre os destaques desta edição


Em 11 de maio deste 2024, a repórter Tauany Cattan voou de São Paulo para Florianópolis só com a passagem de ida. Com Porto Alegre interditada por enchentes, que também suspenderam pousos e decolagens na capital gaúcha, sobrou a opção catarinense para quem quisesse ver o que acontecia no epicentro do drama. Para completar a viagem, Tauany pegou carona com um grupo de voluntários empenhados em transportar diariamente doações originárias de todo o país e voluntários de todos os sotaques.

Oito dias, mais de 20 horas na estrada e 50 entrevistas depois, Tauany voltou à redação de Oeste com a bagagem ampliada por uma coleção de histórias que ajudam a visualizar as causas e as consequências da catástrofe. As mais relevantes estão agrupadas na reportagem de capa desta edição. Trata-se do mais revelador relato da atuação dos incontáveis voluntários no socorro ao Rio Grande do Sul, que fortaleceram ainda mais a unidade nacional.  

Entre outros fatos, chamou a atenção de Tauany a agilidade com que civis se mobilizaram para a materialização de um milagre logístico: colocar em funcionamento, em curtíssimo prazo, um tipo de operação que os governos demoram meses para esboçar. Sem os voluntários, o número de mortes teria sido maior, faltariam abrigos para as vítimas, e os alimentos não chegariam a tempo.  

É verdade que, mais uma vez, a tragédia mostrou o lado escuro da humanidade. Assim, coube aos voluntários lutar também contra os assaltantes de casas despovoadas pelas águas e até deter tentativas de abuso sexual. Taunany viu com alguma frequência grupos de civis armados que tentavam substituir um esquema de segurança que naufragou nas águas do Guaíba. Numa das casas em que esteve hospedada, seguranças armados foram contratados pelos próprios voluntários para manter os criminosos do lado de fora e garantir que nenhuma das doações recebidas fosse roubada. A escalada de violência na capital gaúcha é o tema da reportagem de Sarah Peres.

Previsivelmente distantes do mundo real, os governantes enxergam a paisagem que lhes convém. Antes que as chuvas chegassem, a história do Brasil mencionava três governadores-gerais: Tomé de Sousa, Duarte da Costa e Mem de Sá. Tornaram-se quatro depois que Lula resolveu premiar o companheiro Paulo Pimenta, secretário da Comunicação Social da Presidência da República, com um exotismo oportunista: a Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul. Escolhido para chefiá-la, Pimenta assumiu imediatamente a pose de governador geral do Sul. Até agora, providenciou alguns purificadores de água. Pretende ampliar essa folha de serviços com a punição de quem criticar a inação do governo federal.  

“Acho que nós tínhamos que tentar focar numa área específica e tentar construir alguma coisa que pudesse ter um resultado concreto”, disse Pimenta durante uma reunião. “Não sei exatamente que área seria essa, mas, se a gente pudesse pensar uma estratégia de uma ação para alguma coisa que pudesse mobilizar o esforço para ajudar a resolver uma situação, seria muito importante.” O tempo que Pimenta demorou para recitar essa frase é o mesmo que vários voluntários levaram para salvar alguém.  

Para se ter ideia da falta de agilidade do poder público, nesta quarta-feira, 22 de maio, a prefeitura de Canoas publicou um comunicado: vai gastar quase R$ 220 mil com a compra “emergencial” de camisetas para “identificação dos voluntários nas frentes de trabalho”.  

Faz quase um mês que as águas começaram a subir no Rio Grande do Sul. Ainda bem que os voluntários não esperaram a chegada das camisetas de identificação da prefeitura de Canoas para agir. Para alívio das vítimas, também não perderam tempo esperando que Pimenta resolvesse a dúvida que o atormentava: qual área merecia o foco do chefe de outra invencionice administrativa.

Boa leitura.

Branca Nunes, Diretora de Redação, Revista Oeste, 24-5-2024 

2 comentários:

  1. Claríssima introdução da Diretora de Redação, Branca Nunes. A incompetência e despreparo das diversas instituições públicas (me refiro principalmente aos gestores e coordenadores, pois aos comandados na ponta resta seguir as ordens e diretrizes - ou falta delas) ficaram cruelmente expostas, apenas amenizadas um pouco pela enorme demonstração da capacidade do povo se organizar, se proteger, ajudar, alimentar... salvar-se. Não fossem os civis, essa tragédia seria de proporções gigantescas. Mesmo assim, vejo que a reconstrução de tudo (em todos os sentidos), ainda vai depender mais de nós civis (trabalhadores, empresários, desempregrados...), do que das promessas já conhecidas dos governantes e políticos.
    Alexandre Vieira (Gramado/RS)

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  2. Cláudio Humberto
    @ColunaCH

    Pensando bem...: ...no Brasil, o crime não só compensa como virou investimento. #ColunaCH #DiariodoPoder

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