A tragédia que assola o Rio Grande do Sul tem produzido cenas que ficarão como cicatrizes invisíveis nas retinas de quem as contemplou. Por exemplo, a imagem do homem arrastado pela correnteza depois do desabamento do telhado da casa onde se abrigara — segundos antes de ser alcançado pelo helicóptero que o resgataria. Ou o vídeo em que um menino de 11 anos conta como sobreviveu ao lado do avô — “sem nenhuma comida ou bebida” — até que um barco se aproximou do galho de árvore ao qual permaneceram agarrados. A avó não teve forças para abraçar a salvação. E foi levada pela correnteza.
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Equipes de resgate conduzem um barco numa rua inundada de Porto Alegre, 7-5-2024, foto: Diego Vara/Reuters |
“Em Brasília, o que se viu ao
longo da semana foi um festival de incompetência, oportunismo e autoritarismo,
nessa ordem”, afirma Silvio Navarro, na reportagem de capa desta edição.
“A responsável pela pasta do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou
que o dinheiro emergencial para o Estado será liberado ‘quando a água baixar’.”
Ao mesmo tempo, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, foi taxativo:
“Estão faltando barcos, botes e coletes na cidade. Isso não pode esperar dois
dias. Tem que ser hoje, tem que ser agora. Não adianta dizer que tem dinheiro
se o dinheiro não chega”.
Enquanto a tragédia no Rio
Grande do Sul se intensificava, no Rio de Janeiro Madonna fazia um show para
cerca de 1 milhão de pessoas. Até Che Guevara e Marielle Franco foram
lembrados. Mas ninguém sequer mencionou as vítimas das enchentes que tiveram a
vida destruída a 1,5 mil quilômetros dali.
“Ser diva dos gays e botar Che Guevara no meio não funciona — nem como fetiche sadomasô”, observa Guilherme Fiuza nesta edição. “Guevara não tolerava gays. E tratar ditadura como símbolo de libertação não é nada sexy.”
Por falar em Che, um dos
símbolos da ditadura cubana, o Brasil acaba de garantir seu lugar na lista de
países que inclui, além de Cuba, lugares como Venezuela, Nicarágua e Coreia do
Norte, entre outras ditaduras. Depois dos presos políticos, o país agora
coleciona exilados políticos — pessoas que fogem em busca de refúgio em países
vizinhos para escapar da sanha autoritária de Alexandre de Moraes. Nesta
edição, Cristyan Costa conta a história de três presos do 8 de janeiro
que largaram a família e a pátria em que nasceram para viver em liberdade.
Existem muitos outros na mesma situação. São uma das provas vivas da falência
do Estado.
Outra dessas provas está no
desastre no Rio Grande do Sul. Enquanto governos e entidades oficiais
naufragavam na inépcia e na incompetência paralisante, multidões de anônimos
formaram em poucas horas uma vasta corrente de solidariedade, que se ampliou por
todo o Brasil e logo se estendeu a outros países. “O Estado brasileiro”,
registrou Adalberto Piotto nesta edição de Oeste, “tem se
mostrado caro e incapaz na mesma proporção em que sua sociedade consegue ser
proativa, rápida, com senso de prioridade e que resolve seus problemas”.
Segundo o colunista, “não é só dinheiro que falta para prevenir ou mitigar os
efeitos de uma chuva que causa uma tragédia sem precedentes. Faltam ideias e
homens e mulheres públicos da dimensão e da grandeza da sociedade deste país”.
Oeste juntou-se à
mobilização nacional provocada pela constatação de que um pedaço do país
precisava de socorro imediato — e, em menos de uma semana, já arrecadou quase
R$ 4 milhões. Como atestam as prestações de contas divulgadas diariamente, que
revelam os valores recebidos e o destino do dinheiro, as doações vêm sendo
repassadas a instituições idôneas, desvinculadas de governos ou de partidos
políticos. Os leitores que quiserem colaborar devem enviar um Pix para o
seguinte e-mail: ApoioRS@revistaoeste.com
Branca Nunes, Diretora de Redação, 10 de maio de 2024
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