segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Os americanos não abrem mão de suas armas

Na cidade americana da chacina em escola a maioria resiste ao endurecimento das normas e se sente à vontade com suas armas.
Francisco Vianna

Pessoas enlutadas expressam seu pesar acendendo velas e depondo flores num memorial improvisado às vítimas do tiroteio em Newtown, Connecticut, EUA. A cidade não parece uma arena óbvia a favor de um maior controle de posse e porte de armas.
O jornal americano menos conservador, o The New York Times, nos faz conhecer através de uma matéria publicada ontem, como o americano preza a Segunda Emenda à sua Constituição, que garante o direito do cidadão em possuir e portar armas de defesa pessoal, algo que é respeitado na maioria dos condados do país.
A própria cidade de Newtown, no pequeno nordestino de Connecticut, abalada e chocada com o massacre seguido de suicídio perpetrado por um demente de vinte anos e que tirou a vida de vinte e oito pessoas, vinte das quais, crianças de um jardim-de-infância e incluías a sua própria e a de sua mãe, numa enquete promovida pelo jornal, não parece disposta a se por a favor de uma proibição de armas a partir da reforma ou anulação da Segunda Emenda Constitucional.
A cidade, como muitas outras, está acostumada com tiros de armas de fogo. Há, nos seus bosques a sudeste da cidade, dois clubes: o Clube de Pesca e Caça Pequot e a Associação Rural Protetora da Caça e da Pesca Fairfield, onde seus membros têm à sua disposição pesqueiros cultivados e temporadas de caça controlada a certas presas, clubes esses que estão separados por cerca de um quilômetro e meio um do outro, sem que isso perturbe as pessoas que moram nas proximidades.

A população de Newtown chocada e chorosa pela incompreensível chacina na Escola Sandy Hook, no entanto, não quer nem ouvir falar em controle ou proibição de armas de fogo.
Muitas pessoas, na cidade, colecionam armas, como parece ser o caso de Nancy Lanza, a infausta mãe assassinada pela própria demência de seu filho, a besta que chacinou vinte e seis pessoas numa escola de primeiro grau da cidade, e essa prática de possuir, colecionar e até portar armas com discrição, apesar de tudo, não se constitui em algo que seus habitantes desejam mudar.
Todavia, ao longo de alguns anos, os residentes de Newtown, começaram a observar a incidência de tiros repetitivos e aparentemente mais potentes vindo de novos lugares, além dos referidos clubes onde de rotina se praticam tiro ao alvo. Também têm ouvido explosões, ora vindas de uma área de estacionamento de trailers, de uma marina, ou mesmo de casas. Numa tarde de quarta-feira desta primavera, múltiplos tiros foram relatados terem sido ouvidos num bosque na estrada de Cold Spring, próxima à Rua Principal do Sul, nas proximidades de uma escola de primeiro grau.
Apesar dos esforços da polícia e de outros líderes locais para controlar tais armamentos e tiroteios, isso só serviu para desencadear uma tumultuosa luta cívica, com os caçadores tradicionais e portadores de armas com discrição – como manda a lei – opondo-se aos entusiastas por armas de assalto, e uma modesta tolerância ao porte de armas competindo com os firmes e fiéis argumentos da associação industrial de armas, a Fundação Nacional de Esportes de Tiro, que tem feito de Newtown a sua sede.

A polícia cerca a escola com a população aglomerada e apreensiva em torno dela. O mal já havia se manifestado...
Assim, o local que testemunhou um dos piores massacres da história dos EUA na última sexta-feira é uma pequena e bucólica cidade de New England que parece se sentir confortável com suas armas de fogo e considerar a tragédia como um ato de loucura individual isolado, não é obviamente uma arena para o debate nacional sobre o controle de armas. Portanto, a batalha legislativa que se inicia também em seu âmbito mostra como mesmo a mais leve tentativa de se impor restrições sobre a posse e o porte de armas de fogo desencadeia uma feroz resistência entre seus habitantes.
No entanto, parece crescer um sentimento entre eles de responsabilidade coletiva sobre o assunto, e muitos que apoiam e exigem o respeito à Segunda Emenda da Constituição do país, já afirmam com convicção que “algo deve ser feito para otimizar a qualificação dos proprietários de armas, bem como da capacidade individual das pessoas as usarem e as portarem”, como diz Joel T. Faxon, um caçador membro de uma comissão policial da cidade, que pleiteia algumas normas restritivas para a posse e porte de armas de fogo. “O que mata não é a arma, mas a mão que puxa o gatilho”, diz ele, ao afirmar que “qualquer pessoa que queira possuir e portar uma arma de fogo tem que ter pré-requisitos indispensáveis para tal, como uma reputação pública de pessoa de bem, cumpridora da lei, um certificado de equilíbrio e normalidade psicossocial e uma habilidade mínima eficaz de manuseio e uso das armas que possui”. O que está a ocorrer aqui, segundo Faxon, é que as armas que as pessoas estão adquirindo ultrapassam em muito a necessidade normal de autodefesa bem como a defesa de seu patrimônio e até de terceiros, numa cidade de baixíssimo índice de criminalidade. “Não se justifica o arsenal que algumas pessoas acumulam em casa, como se estivessem preparados para uma guerra civil iminente. Isso acaba eventualmente fazendo com que tais armas de assalto caiam nas mãos de lunáticos, como Lanza, e que perpetram barbaridades como a de sexta-feira passada. Vivemos numa cidade pacata e não num front de guerra”, completou Faxon, para logo a seguir dizer que, no entanto, “este não é um assunto para Washington resolver, mas cuja solução deve se restringir a cada comunidade”.

O Presidente Obama, transmite o seu pesar pelo ocorrido e acena com medidas de controle de armas, que a maioria dos americanos não aceita
O brasileiro deve aprender lições importantes de soberania deste e de outros dramas isolados que ocorrem nos EUA. Num país onde a posse e a portabilidade de armas são proibidas, como o Brasil, ocorrem mais mortes por armas de fogo num dia, do que as ocorridas em quase um ano nos EUA. Só em Jacareí, SP, hoje, morreram nove pessoas assassinadas por armas de fogo. Aqui, a bandidagem, que não respeita proibição legal de qualquer espécie, está cada vez mais armada, enquanto os cidadãos decentes e trabalhadores são mantidos desarmados e longe da indispensável capacitação mínima necessária ao manejo e uso de armas de fogo para a sua autodefesa, bem como a de seu patrimônio, de seus familiares e até de terceiros. O resultado não poderia deixar de ser outro senão o de um enorme índice de assassinatos por essas e outras armas de assalto.
No entanto, aqui como lá, parece ser primordial o critério com que as pessoas devam usufruir o direito de possuir e portar armas de fogo. Como todo o direito envolve deveres e obrigações que o consubstanciam, é preciso que as pessoas, que optem em ter em seu poder e portar armas de fogo, nitidamente compreendam a responsabilidade que isso acarreta. Às autoridades, está reservada a responsabilidade de fazer cumprir leis específicas eficazes em selecionar com eficiência as pessoas aptas a possuí-las e portá-las, dentro de padrões razoáveis de segurança coletiva.
Quando os bandidos souberem que poderão receber por parte de suas vítimas potenciais uma reação capacitada que possa mandá-los desta para pior, pesarão dez vezes antes de se aventurarem em suas iniciativas criminosas.
Uma coisa parece certa: não interessa ao crime organizado, tanto privado como estatal, que o cidadão de bem seja capacitado, técnica e emocionalmente, para possuir, portar, e eventualmente usar armas de defesa pessoal. Cabe aos brasileiros exigir do governo que esse direito seja respeitado.
Título, Legendas e Texto: Francisco Vianna, 17-12-2012

6 comentários:

  1. Eu sei que a comparação não tem nada a ver, mas se em PT (Portugal) se discute que o OE 2013 (Orçamento do Estado) tem normas inconstitucionais, a restrição do uso e porte de armas nos EUA, também choca com a sua constituição. Foi este livre acesso às armas por parte dos cidadãos que fez (em parte) despoletar a luta contra o Império Britânico, levando à independência da colónia. Tal como o artigo refere, tais situações também acontecem em países em que o acesso às armas, por parte dos cidadãos, é fortemente restringido. Mas, quando isto acontece nos "infames USA", a coisa toma outras proporções. Quase ao mesmo tempo que esta tragédia se desenrolava, na China algo de muito semelhante aconteceu. O cenário era em tudo idêntico (uma escola primária), a arma era mais "rudimentar" (arma branca) e o desfecho menos trágico (umas dezenas de crianças feridas, algumas com gravidade). O eco é que não foi, nem de longe, nem de perto semelhante. É fácil para os "anti" vociferar contra os "maléficos e dementes USA", mas é preciso um distanciamento, por um lado, e conhecimento por outro, para entender o porquê das coisas serem assim por aquelas bandas. Nem todos se querem dar a essa reflexão.
    Carlos T. Pereira

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  2. Como já afirmei aqui do meu canto cibernético várias vezes, os EUA jamais serão um país controlado pelo governo central de Washington. Antes que isso aconteça, os EUA terão que desaparecer para em seu lugar surgir outro tipo de nação, o que me parece muito ppouco provável que ocorra no atual século.
    Ao invés de leis que restringem a posse, o porte, e o uso de armas de autodefesa pelos americanos para que protejam a si próprios, ao seu patrimônio, às suas famílias e até a terceiros, o que se espera dos estados e dos condados (municípios) é que haja mais rigor na qualicação das pessoas para que se habilitem a ter armas e a usá-las quando necessário.
    Tal rigor passa necessariamente pela maturidade, pelanormalidade psicossocial, pela reputação de pessoa de bem e cumpridora das leis, pela capacidade econômica de indenizar terceiros quando for o caso, e pela dextreza mínima em manusear a arma que postula possuir, portar e usar.
    Daí, fica evidente que quem tem que exigir tais obrigações que irão consubstanciar esse direito do cidadão é o governo local, que não apenas conhece quem é quem como também tem condições de acompanhar os fatos oriundos do desempenho individual dessas pessoas armadas.
    Abraço,
    Francisco Vianna

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  3. Muitos combatem os americanos pelo seu gosto pela velha tradição de ter armas. Criticam tal tradição que se avolumam quando acontecem essas coisas bestialógicas de algum desequilibrado mental qualquer, só que se esquecem que aqui no brasil cerca de 46 mil pessoas são assassinadas anualmente e é proibido ter armas, digo, os bandidos não podem ter armas...
    Mozart Oliveira

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  4. Eu entendo que arma para se defender não deve ser uma metralhadora. Um bom revolver é o suficiente.
    Quem compra metralhadora não está pensando em matar um peru selvagem (comum nos Estados Unidos) logo, poderia ser investigado já ao sair da loja.
    Aqui no Brasil só bandidos podem ter armas. E terão sempre.
    Irene Sandke

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  5. Creio que lá não vendem metralhadoras, mas armas de repetição como o famoso M 16 pode ser modificado da versão de tiro intermitente para função rajada com a troca de uma simples peça. Aí a arma fica ilegal!
    Claro que ninguém quer matar perú com uma arma dessas mas pode simplesmente gostar de possuir e pronto. Nada mais do que isso.
    Tal sentimento faz parte da cultura deles e nem por isso deixa de ser uma Nação espetacular.
    Mozart Oliveira

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  6. E onde o índice de assassinatos por arma de fogo é um dos mais baixos do planeta. No Brasil, morre mais gente por bala NUM DIA do que nos EUA em quase um ano...
    O QUE MATA NÃO É A ARMA, MAS A MÃO DE QUEM PUXA O GATILHO (E CONTINUA IMPUNE, LIVRE, LEVE E SOLTO NESSA REPÚBLICA DE FANCARIAS).
    Francisco Vianna

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