2014 será, de novo, um ano
importante para Portugal e o sucesso está hoje mais próximo. O programa de
ajustamento gizado pela UE/FMI termina em Maio.
Portugal superou com êxito as
dez avaliações trimestrais do programa, reflexo da forte determinação dos
portugueses em romper com os tempos económica e socialmente difíceis em que o
país esteve mergulhado.
Muitas medidas significativas
foram tomadas desde o início do programa em Maio de 2011. A consolidação
orçamental tem ajudado a recuperar o controlo sobre a dívida pública, bem como
a garantir a sua sustentabilidade. O sector bancário foi estabilizado mediante
um processo de desalavancagem e recapitalização dos bancos, mas o ajustamento
em curso pretende ser, acima de tudo, um programa que promova o crescimento
sustentado e mais e melhor emprego. As reformas estruturais nele inscritas
desempenham um papel-chave na prossecução desse objectivo, uma vez que têm
melhorado a competitividade e a flexibilidade da economia, assim como a sua
capacidade de crescer de forma sustentável e de criar emprego.
O êxito de todas estas medidas
deve-se ao ajustamento notável de que a economia portuguesa foi alvo. Desde
2012 que o orçamento, em termos estruturais e líquido do pagamento de juros,
tem registado excedente, que as exportações se mantêm fortes, ajudando ao
reequilíbrio externo da economia, e que as condições de financiamento da banca
melhoraram consideravelmente.
Estou ciente de que os progressos
alcançados no âmbito do programa de ajustamento foram conseguidos num contexto
social particularmente difícil para o povo português. Os elevados níveis de
desemprego e de pobreza que afectaram em especial os mais jovens têm sido, e
continuarão a ser, um motivo de preocupação para todos nós, daí o programa
considerar fundamental aliviar o impacto do mesmo junto dos mais vulneráveis.
As condições de implementação
do programa foram mais desafiantes do que o inicialmente esperado devido, em
grande parte, aos efeitos negativos da recessão económica e da fragmentação
financeira na zona euro. Para contrabalançar os efeitos mais graves, o rumo do
ajustamento orçamental foi revisto a fim de manter um equilíbrio adequado entre
a consolidação orçamental e o crescimento e o emprego.
Este percurso difícil também
ficou marcado por outros obstáculos. Algumas das reformas orçamentais e
estruturais que o governo português adoptou e implementou foram consideradas
inconstitucionais, enquanto outras esbarraram na resistência de interesses
instalados. Em resultado, o impacto dessas reformas na promoção do crescimento
potencial da economia foi mitigado. Também ocorreram episódios de tensão
política no início do ano, no entanto, a coesão e o sentido de responsabilidade
nacional acabaram por prevalecer.
No geral, a determinação
política de Lisboa e a excelente cooperação entre Portugal e os seus parceiros
internacionais foram cruciais para ultrapassar todos esses desafios e os
esforços começam gradualmente a dar frutos num contexto de retoma em toda a
Europa, sob a forma de crescimento económico e de criação de emprego.
Olhando para o futuro,
Portugal deve reforçar os progressos já alcançados focalizando-se em medidas
que fortaleçam o crescimento e o emprego, reponham a criação de riqueza e
protejam os elementos mais vulneráveis da sociedade. É igualmente essencial que
Portugal preserve a sua disciplina orçamental e reformas estruturais nos
próximos anos. A dívida pública terá de manter-se sustentável combinando
défices orçamentais baixos com um sector público mais reduzido e eficiente e
uma taxa de crescimento mais alta, a par de uma maior dinâmica na criação de
emprego.
O sucesso ou o fracasso da
estratégia para repor a sustentabilidade da dívida pública será aferido pelo
acesso de Portugal aos mercados de dívida soberana a taxas de juro
comportáveis. Esse acesso pressupõe reforçar a confiança dos investidores e
atenuar os receios que relevem de eventuais riscos percepcionados (económicos,
legais, políticos) associados ao processo de ajustamento.
As condições para o futuro
êxito económico de Portugal serão as mesmas quer o governo solicite, quer não,
apoio adicional aos seus parceiros europeus após o término do actual programa.
É natural questionar o que irá acontecer depois, mas, neste momento, qualquer
resposta será pura especulação. Muito sinceramente, entendo que não devemos
desviar a nossa atenção da importante tarefa que temos em mãos. A prioridade
absoluta é, pois, concluir o programa em curso com êxito. Portugal pode estar
tranquilo, uma vez que a Europa tenciona cumprir a sua palavra se o país
necessitar de ajuda adicional, na condição de Portugal levar por diante as
reformas em curso.
Todos os Estados-membros da
UE, sem excepção, estão sujeitos a procedimentos de supervisão económica, os quais
foram consideravelmente fortalecidos em resposta à crise económica e
financeira. A União Bancária está em construção tendo em vista reduzir a
fragmentação financeira na Europa e romper com a ligação tóxica entre a dívida
dos bancos e o Estado. O primeiro pilar estará concluído em 2014 com a criação
do Mecanismo Único de Supervisão. Não obstante, o novo quadro de supervisão da
UE não garante por si só o desenvolvimento da economia portuguesa. A crise
revelou as fragilidades do modelo de crescimento de Portugal, marcado por uma
forte dependência da despesa pública e da dívida privada, e pelo peso excessivo
de bens e serviços não transacionáveis.
Neste sentido, Portugal deve
usar a crise e o programa de ajustamento como uma oportunidade para romper de
vez com o seu passado económico. É urgente definir uma nova visão a médio prazo
para o crescimento e o emprego, que defina um caminho para o país trilhar até
2020 e anos subsequentes. Essa visão deve ser credível e contar com uma ampla
base de apoio político e social. Em particular, são precisos esforços
adicionais para criar um ambiente favorável ao investimento privado e à
transição para uma economia de bens e serviços transacionáveis através do
investimento doméstico e estrangeiro. Além disso, Portugal deve usar melhor o
Mercado Único, o euro, os fundos de coesão e outros instrumentos europeus
disponíveis para apoiar essa estratégia.
Portugal foi profundamente
atingido pela crise, mas a sua economia está a recuperar gradualmente com base
num modelo mais benéfico e sustentável. Os portugueses têm feito esforços
notáveis para inverter o rumo da economia. Se Portugal conseguir manter a
solidez das finanças públicas e prosseguir com as reformas estruturais para
alcançar um crescimento sustentado e melhores níveis de emprego, não tenho
dúvidas de que os sacrifícios do povo português feitos até agora não terão sido
em vão. Pelo contrário, garantiram um futuro melhor para si e para as gerações
futuras.
Título e Texto: Olli Rehn - Vice-presidente da Comissão Europeia, Responsável
pelos assuntos económicos e monetários da Comissão Europeia, nasceu na
Finlândia e foi o elemento mais jovem da equipa liderada por Durão Barroso, Jornal de Negócios, 30-12-2013
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