Na reedição de
uma pesquisa realizada por VEJA em 2011, percepções sobre a organização do
Mundial no Brasil ficam ainda piores. E isso é ruim para todos...
Giancarlo
Lepiani
Desde que entrou no Comitê
Organizador Local (COL) da Copa do Mundo, há pouco mais de dois anos, o
ex-craque Ronaldo foi um pregador incansável do otimismo em relação ao evento —
gravou campanha do governo federal, promoveu o torneio no exterior e até apareceu
numa célebre propaganda da Brahma, vestido como um Tio Sam verde e
amarelo, num cartaz que provocava quem duvida do sucesso do Mundial. Na última
terça, porém, Ronaldo mudou de tom e lamentou publicamente o aperto para concluir os
estádios a tempo. "Acho uma pena. É o nome do nosso país lá
fora. Não é bom passar essa imagem para o mundo", disse, num evento da
própria Brahma no Maracanã, o palco da final da Copa.
Escalado pela presidente Dilma
Rousseff para ser o homem forte do governo no Mundial, o ministro Aldo Rebelo é
outro que se abateu com os problemas desta reta final. Se antes zombava das
preocupações com os prazos (chegou a dizer, no Senado, que os atrasos eram só "impressão" da população), o ministro
agora se mostra alarmado com enroscos como o de Curitiba, que escapou de ser cortada pela Fifa na última terça. "Devemos confiar
desconfiando. É preciso trabalhar duro", alertou. Até Jérôme Valcke, o
irritadiço francês que serviu de xerifão da Fifa nos preparativos para o
evento, tentou levantar a bola do Brasil num passado recente. "É
muito difícil entender por que, em um país que vive e respira futebol, algumas
poucas pessoas continuam a enxergar apenas aspectos negativos, mesmo que não
haja nada de negativo", escreveu, há um ano, num texto divulgado no
site da Fifa.
Ao anunciar a manutenção de
Curitiba entre as doze sedes, na semana passada, num seminário em Florianópolis,
Valcke era a personificação do mau humor, destilando azedume a cada declaração
sobre os compromissos assumidos — e descumpridos — pelos brasileiros.
A percepção negativa do brasileiro em relação à Copa é ruim para todo mundo: para as sedes, que podem ficar sem o retorno financeiro sonhado quando conquistaram um lugar no evento; para a organização, que enfrentará um contexto desfavorável na hora de realizar o torneio; para a Fifa, que se arrisca a comprometer o sucesso de seu produto mais rentável; e para os patrocinadores, que gastaram fortunas para atrelar suas marcas a um Mundial cercado de dúvidas e críticas. Mas ninguém tem mais motivos para se preocupar do que os governos, Estados e municípios, que bancaram nada menos de 93,7% dos 8,9 bilhões de reais gastos até agora nos estádios (a previsão inicial era de 2,6 bilhões).
Curiosamente, é quase o mesmo
porcentual de pessoas que se dizem contra o uso de dinheiro público na
construção e reforma das arenas (94%, contra 85% em 2011). Outro dado é
especialmente preocupante para quem apostou tão alto — e torrou tanto dinheiro
— nas obras da Copa. Questionados sobre quem será o culpado caso o Mundial seja
uma decepção, 94% dos entrevistados apontaram o governo federal, contra apenas
12% que citam a Fifa. Há três anos, o governo era visto como principal
responsável pelo evento por 79% das pessoas. A ligação cada vez maior entre a
imagem da Copa e o governo, diga-se, é mais do que compreensível. Na tentativa
de propagandear a Copa como catalisador do desenvolvimento, principalmente na
área de infraestrutura, o Planalto ampliou sua interferência na condução dos preparativos para
o evento. Em ano eleitoral, a expectativa era de que a festa serviria de
vitrine para projetos de mobilidade urbana e modernização dos aeroportos. O
ritmo capenga desses projetos e o cancelamento de alguns deles
esvaziaram o argumento oficial em defesa dos gastos com o evento.
(…)
Outros 22% participantes da
pesquisa acham que os manifestantes não serão capazes de atrapalhar o
torneio, enquanto 22% temem uma situação extrema, em que os protestos ganhariam
tamanho impulso que a Fifa teria de recorrer a medidas drásticas, como adiar
partidas por falta de segurança. Só 13% acham que a onda de manifestações vai
perder força no Mundial. Na virada do ano, a imagem da Copa do Mundo e o
risco de uma repetição das cenas de junho foram discutidos em diversas reuniões
estratégicas do Planalto.
Dilma ordenou uma ofensiva de
marketing e comunicação para tentar promover aspectos positivos do evento – afinal, a
presidente sabe que uma Copa realizada sob um contexto negativo poderá ter
impacto sobre sua tentativa de reeleição. No início do mês, o governo decidiu
ajustar o discurso. Com base em uma pesquisa de opinião encomendada para
avaliar as manifestações do ano passado, Dilma colocou em segundo plano a
defesa dos investimentos em obras da Copa e passou a apelar para o ufanismo do
país do futebol. Saiu o "legado", entrou a "Copa das
Copas", slogan adotado por Dilma nas inaugurações de estádios (e
emprestado até por Joseph Blatter e Jérôme Valcke em
alguns pronunciamentos). De acordo com reportagem do jornal Folha
de S. Paulo, trata-se de uma criação do marqueteiro Nizan Guanaes,
surgida numa reunião sigilosa com a presidente. Nizan, aliás, é um dos responsáveis pela campanha "Imagina a festa",
da Brahma, a mesma que retratava Ronaldo como um Tio Sam tupiniquim, num
cartaz que estampa uma mensagem com tom de
intimidação: "Pessimistas, pensem bem". Mas eles são a maioria.
E a propaganda lançada em 2012, que mostrava uma população eufórica
celebrando nas ruas a glória nacional, hoje parece mais fantasiosa do que
nunca.
(…)
Título e Texto: Giancarlo Lepiani, Veja
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