Aloísio de Toledo César
Está bastante claro que a insistência do presidente Michel Temer em levar avante projetos econômicos e administrativos nem sempre bem compreendidos pela população resultou em desgaste de sua imagem pessoal e de seu governo. É possível que parte da população entenda serem necessárias essas medidas ou que já deveriam ter sido aprovadas muitos anos atrás. As mudanças propostas, no entanto, afetarão a estabilidade de pessoas e grupos sociais e esse é o motivo por que não houve coragem suficiente dos antigos governantes para propô-las ao Congresso Nacional.
Obrigar o governo a gastar
menos do que ganha, limitar as aposentadorias a uma idade mínima mais alta,
alterar a relação entre empregadores e empregados e a legislação em vigor desde
1940 como forma de afastar o medo de patrões na contratação de empregados, tudo
isso parece óbvio e elementar. Mas ninguém teve antes a coragem de enfrentar o
risco de tais mudanças.
É forçoso reconhecer que
Michel Temer não cede à pressão das oposições nesse programa de interesse do
País, ainda que desgaste a sua imagem. Necessário reconhecer, portanto, o
mérito de não se deixar afetar pela baixa popularidade.
Entre os que odeiam esses
avanços sociais e econômicos estão aqueles mais radicais que pregam
repetidamente o “fora Temer”. Esses grupos minoritários são estridentes e vivem
o sonho de que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao julgar as contas de
Dilma Rousseff e Michel Temer, determine o afastamento deste da Presidência da
República.
Há uma tola presunção, quase ingenuidade, nessa torcida, porque o processo que apura denúncia de fraude eleitoral (é o caso) deve transcorrer segundo o devido processo legal, assegurados o contraditório e ampla defesa, como exige a Constituição federal em seu artigo 5.º, LV. No momento, o processo está em fase de instrução, passando por perícias, que nem sempre são rápidas, e pela produção de provas.
O TSE é composto por sete
membros, sendo três escolhidos em votação secreta entre ministros do Supremo
Tribunal Federal (STF), dois entre ministros do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) e dois juízes entre advogados de notável saber jurídico, escolhidos e
nomeados pelo presidente da República.
Em face dessa composição não
homogênea, são comuns as divergências entre seus integrantes, com a demora no
desfecho de muitas causas em julgamento. No caso das contas Dilma-Temer, é
muito ousada a previsão de que todos os sete juízes votarão igualmente ou a
favor ou contra os interesses de Temer ou Dilma. Nos casos eleitorais de maior
repercussão, tem sido corriqueira a divergência entre os ministros, com pedidos
de vista e adiamentos. Quando a decisão é conhecida, abre-se caminho para
recursos.
Somente após o trânsito em
julgado, quando não mais houver recursos previstos em lei, a decisão final terá
eficácia. Não se espere que uma eventual votação contrária a Temer, por
unanimidade ou por maioria simples, venha a ser por ele docilmente acatada ou
que tenha eficácia imediata. É mais seguro prever que os seus advogados
manejarão todos os recursos imagináveis como forma de mantê-lo no cargo até o
fim do mandato.
A própria Constituição
federal, em seu artigo 121, parágrafo 3.º, dispõe: “São irrecorríveis as
decisões do Tribunal Superior Eleitoral, salvo as que contrariem esta
Constituição e as denegatórias de habeas corpus ou mandado de segurança”. Isso
significa que a decisão daquele tribunal, se decretar a inelegibilidade de
Michel Temer, ainda comportará recurso cabível ao Supremo Tribunal,
conhecidíssimo por não ter pressa alguma.
Fora esse recurso previsto na
própria Constituição da República, a jurisdição exercida pela Justiça Eleitoral
tem natureza civil e penal, ou seja, recursos previstos no Código de Processo
Civil e também no Penal são admissíveis, como embargos de declaração, agravo de
instrumento, embargos infringentes, exceções envolvendo a conduta de ministros,
além de outros que os incidentes processuais comportarão.
Michel Temer não é nenhum
ingênuo. Além de professor de Direito Constitucional, advogou por muitos anos,
por isso está seguro de que o desfecho do referido processo eleitoral, se for
contrário a ele, somente ganhará expressão após o término de seu mandato. Esse
é o motivo por que demonstra não estar nem um pouco preocupado, quando
jornalistas lhe dirigem perguntas sobre o desfecho do julgamento.
Mas ainda que aconteça algo
inesperado e imprevisível, e que da decisão final resulte o afastamento do
presidente da República, os “fora Temer” não conseguirão vantagem alguma,
porque se trata de um vice que assumiu o cargo no curso de mandato.
Quando ocorre
concomitantemente o impedimento do presidente e do vice-presidente da
República, ou seja, havendo a vacância dos dois cargos antes de se iniciarem os
dois últimos anos de mandato, a Constituição federal determina a convocação de
eleição direta para 90 dias a contar da última vaga.
Entretanto, quando a última
vaga se abre nos dois últimos anos do mandato, como agora pode ser, a eleição
terá de ser realizada, 30 dias após a vacância, pelo Congresso Nacional. Enfim,
haveria uma eleição indireta, com pouca chance para os grupos radicais e
minoritários “fora Temer”.
Realmente, o Congresso
Nacional já deu mostras claras de apoio ao atual presidente da República, a
ponto de aprovar emendas constitucionais de dificílima tramitação. Ações
estridentes do PT, do PSOL, da Rede e de outras legendas menores provavelmente
não seriam suficientes para a escolha de alguém de sua preferência.
Pelo jeito, vão ter de engolir
Michel Temer até o fim do mandato.
Título e Texto: Aloísio de Toledo César, Desembargador
aposentado do TJSP, foi secretário da Justiça do Estado. E-mail: aloisio.parana@gmail.com
O Estado de S. Paulo, 9-1-2017
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