Vitor Cunha
Era sabido, por muito que
fosse coisa que não se mencionasse, que o regime tinha trejeitos efeminados.
Sempre foi demasiado dado a conversas cuscas e comparações que só donas-de-casa
sexualmente negligenciadas fazem, como “o meu rabo é mais firme que o da
Alemanha” ou “depois de amamentar um ditador por tantos anos, as minhas mamas
ainda são mais firmes que as das inglesas”. Algumas pessoas – grupo em que me
incluo – suspeitavam que o país pudesse ser homossexual, o que não teria
qualquer mal, e até justificava a relutância de refugiados muçulmanos em serem
co-adoptados. Porém, não se trata de mera homossexualidade: o país é
completamente maricas, tão larilas como D. Sebastião a dançar YMCA em frente a um
poster gigante da Judy Garland.
Sem entrar em polémicas
desnecessárias, morreu um político. É verdade que tinha 92 anos, que estava
gagá há algum tempo – o que o levava a associar terramotos à austeridade que
mata –, mas, ei, durante os loucos anos de Passos Coelho, quando toda a gente
enaltecia a unha encravada como se de intratável cancro se tratasse, tudo
aparentava a mais perfeita normalidade. Era o nãoseaguentismo. E
até se percebia: depois de Sócrates seria impossível aceitar um governo sem
lenhadores portadores de grosso machado que nos preenchesse o vazio emocional.
Contudo, agora que Soares faleceu, toda a imprensa decidiu assumir que a vida é
um cabaret, old chum. Portugal saiu do armário vestido de
lantejoulas.
O que nos dói se choramos?
Que parte do nosso corpo descarnou subitamente?
O que nos falta se ele nos deu tudo o que era?
Se não há tragédia nem surpresa?
É o adeus.
O adeus dói.
Que parte do nosso corpo descarnou subitamente?
O que nos falta se ele nos deu tudo o que era?
Se não há tragédia nem surpresa?
É o adeus.
O adeus dói.
Pá… Se isto fosse sobre um
pai, uma pessoa calava-se, teria pudor em gozar com a dor de um filho que prova
a amargura fulminante da nova condição de órfão. Se João Soares publicar algo,
uma pessoa cala-se. Agora, não se tratando de um filho sobre a perda do pai, o
que leva esta gente a escrever baboseiras sentimentalistas ao som de Richard
Clayderman? Mariquice. É um país decorado com grande arco-íris, hippies nus
dançando Age of Aquarius e espirros na imprensa por alergia ao excesso de
maquilhagem. Já nem há alertas de pólen no ar, agora saímos de casa e
regressamos carregados de pó-de-arroz.
Cambada de mariquinhas. Adianta muito dizer que se quer acabar com estereótipos – acabar com estereótipos é acabar com os portugueses. E se dúvidas havia sobre a visita do doutor Costa à Índia, já se dissiparam: isto é só Bollywood e pipocas – sem manteiga, se faz favor, que comi um queque para aliviar o choro de ver o cão a ser vacinado.
Título e Texto: Vitor Cunha, Blasfémias, 9-1-2017
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