Vitor Cunha
Portugal vive num estado de
permanente Big Brother, não o líder do estado omnipresente e omnisciente de “1984”,
e sim o do programa televisivo da TVI, o que foi sofrendo iterações com títulos
diferentes mantendo todo o princípio inalterável. O programa consiste em enfiar
um conjunto de pessoas que não representam vivalma do país exceto os próprios
em casa decorada como cenário televisivo e transmitir a coisa, esperando que,
mais cedo que tarde, um vá às trombas a outro e alguém se meta da cama do
tatuado às escuras por um cego. Refiro-me, naturalmente, à comunicação social.
Uma pessoa que se dê ao
trabalho de ler jornais repara inevitavelmente em duas coisas: colunistas
querem ilustrar realidades que não existem, jornalistas desejam ardentemente
ser colunistas. E é só isto que se vê nos jornais, salvo raríssimas exceções
que só podem considerar ridículos os simpósios de desgraçadinho-sou-eu,
como o que se realizou recentemente para “pensar o jornalismo”.
Há o Pacheco Pereira, uma
espécie de Marco Borges que distribuí pontapés por toda a gente – o último dos
quais ao diretor do jornal onde escreve – em fúteis tentativas de ser expulso
do programa, do jornal, do partido e sei lá mais o quê que permita a publicação
do já-há-muito-escrito texto a queixar-se de que o querem calar. Tem grandes
probabilidades de, como as baratas, sobreviver a tudo, sagrando-se vencedor do
concurso, precisamente por isso, por toda a gente lhe negar a demissão/expulsão
que tanto ambiciona.
Há o Rui Tavares, uma espécie
de Zé Maria, tipo que vive a Europa com um amor como só o original vivia as
touradas de Barrancos, com a intensidade agravada de conseguir desempenhar o
papel de cavaleiro e de touro ao mesmo tempo. Inventor da Geringonça, toda a
gente se riu quando a propôs. Quando esta se formou, gerou nova risota pela sua
inevitável exclusão da agremiação. É o eternamente jovem, apesar de careca. De
vez em quando ainda aparece fora dos jornais a queixar-se de que não lhe dão
ouvidos (nem votos), que com ele é que ia ser. Grande defensor do papel das
mulheres na vida pública, por motivos inexplicáveis, continua a não abdicar da
liderança do partido unipessoal em prol de uma mulher.
Há o Francisco Louçã, a Célia
do Big Brother. Com argumentação típica de gaja das antigas, as que comentam em
vãos de escada sobre quem anda metido com quem no bairro, vai para as
televisões e jornais inventar alucinações sobre um país e a Europa com o afinco
que a Dona Emília diz que o filho já é doutor no difícil curso de ciências
sociais que nem sabe como se chama. Não se cansa de expôr os bibelôs sobre
renda, tem uma coleção de chávenas douradas que nunca foram usadas e já chegou
a alapar os vastos glúteos no Renault 5 “quase novo” do filho-doutor. Só não
leva pontapé do Pacheco Pereira porque é vastamente irrelevante para todos, exceto
malucos, que as pessoas tendem a ignorar figuras de ação tipo Batman revolucionário
bem-instalado.
Há o Bagão Félix, a Manuela
Ferreira Leite e os restantes Ruis Rios, ou, obviamente, a Susana, o amor
rame-rame do Zé Maria. Ora amam perdidamente o discurso vazio do Zé Maria/Rui
Tavares, ora é preciso rigor para a sustentabilidade da segurança social, ora é
preciso que não lhe mexam na reforma, ora é preciso mais Europa, menos Europa,
menos dívida, mais dinheiro. Sobretudo, é preciso mais respeito pelo senado
balofo que nos trouxe até aqui e que, por mero acaso, é composto por eles.
Pois. Tal como a Susana “cabeça-de-ovo”, demonstram grandes dúvidas acerca do
querem para a vida dos outros, limitam-se a esperar que o macho-alfa os oriente
para o que não devem pensar em seguida.
Há o Raul Vaz, que passou de
razoavelmente ponderado para defensor acérrimo da tropa do Costa. Como na
tropa. Na tropa. Quando estava na tropa é que era. O Raul Vaz é o Telmo. E lá
continua, com a sua pequena empresa de alumínio, a lembrar os dias da tropa. Um
tipo capaz de atribuir a palavra “ponderado” a António Costa não pode trabalhar
com metais mais pesados. Com uma circulação rondando os 11.000, o Jornal de
Negócios lá vai existindo, sendo ligeiramente mais popular que o Jornal do
Fundão, com circulação a rondar os 9.000, mas muito abaixo da revista Maria,
com 138.000 no pior bimestre de 2016.
Todos os dias, estas figuras e
outras que tais lá aparecem no confessionário, para se queixarem do Passos
Coelho à Teresa Guilherme que os quiser ouvir e aos leitores. Quando se queixam
de outra coisa, como do Trump, queixam-se do Passos Coelho. Não há mais nada. O
mundo é o Passos Coelho, até a Le Pen é o Passos Coelho. Surpreendem-se das
tiragens e circulação destes embrulhos de castanhas? Eu não.
O Diário de Notícias, no 5º bimestre de 2016, teve circulação de 16.022. O Público teve 30.997. A revista mensal Continente Magazine teve 106.939 e a bimensal do Pingo Doce teve 105.282. Estamos conversados? Quando saírem para o
mundo real vão ter uma surpresa, é só a Endemol acabar com o programa.
Então, começou no Brasil, até a cor tradicional mudou para "laranja", e o apresentador com voz de taquara fina rachada, tá mal. Não sei o que a Globo viu neste cara! Mas...
ResponderExcluirHeitor Volkart