Rui Verde
Uma gargalhada é sempre
bem-vinda quando lemos um livro, assistimos a uma comédia ou contamos anedotas
entre amigos. Mas quando surgem em resultado das decisões ou indecisões dos
tribunais superiores de Angola, já não são tão bem-vindas as gargalhadas. Se
determinados comportamentos das mais altas instâncias judiciais apenas nos
merecem um ataque de riso, então é sinal de que estas perderam toda a
credibilidade.
Vêm estas considerações a
propósito das (in)decisões que se têm verificado na sequência da providência
cautelar que vários advogados angolanos colocaram para impugnar a nomeação de
Isabel dos Santos como presidente do Conselho de Administração da Sonangol.
O Tribunal Supremo demorou
perto de seis meses a decidir e indeferir a providência cautelar. Este é um
processo qualificado por lei como urgente. Assim, não pode parar e espera-se que
seja decidido em uma ou duas semanas. Tratava-se de um ato contra a decisão do
pai-presidente, José Eduardo dos Santos, em nomear a sua filha Isabel para
dirigir a Sonangol e visava prevenir a sua tomada de posse.
Agora o Tribunal
Constitucional está há três semanas sem acusar a recepção do recurso
constitucional.
É evidente que, quando se
tomar qualquer decisão sobre o tema, o efeito útil imediato inexistirá.
A questão aqui em causa não é
se a providência colocada pelos advogados está certa ou errada em termos de
direito. A questão é que os autores, como todo o povo angolano, têm direito a
uma resposta em tempo útil.
O artigo 72.º da CRA é
cristalino: “A todo o cidadão é reconhecido o direito a julgamento justo,
célere e conforme a lei.”
Ora, quando os principais
tribunais do país dão o mau exemplo e arrastam processos, não estão a cumprir a
sua função. Pelo contrário, estão a denegar justiça, o que é proibido por lei,
sendo mesmo um crime previsto e punido pelo artigo 286.º do Código Penal.
A não ser que, agora, os
juízes angolanos sejam juízes chineses.
Na China, os juízes não se veem
como órgãos de soberania independentes que administram a justiça, mas como
partes integrantes da máquina executiva do Partido Comunista Chinês, em que a
lei é apenas um instrumento do poder como outro qualquer. Ainda recentemente,
Zhou Qiang, presidente do Supremo Tribunal Popular Chinês, exortou os seus
juízes a não caírem nas “armadilhas ocidentais” e acreditarem em falsos mitos
como a “independência do poder judicial”, a “democracia constitucional” e a
“separação de poderes”. Mais, o bélico juiz incentivava os seus confrades a
tomarem posição e “mostrarem a espada”, para defenderem as suas posições.
Obviamente, a adopção da
filosofia jurídica chinesa pouparia muitos embaraços ao regime angolano,
permitindo que os juízes justificassem às claras aquilo que a maioria já faz às
escondidas: servirem de instrumento da ditadura e da opressão.
Portanto, em vez de fazer
estágios em Portugal ou noutros países ocidentais, talvez comece a ser melhor
enviar os juízes para a China, para aprenderem a recitar a lição de obediência
ao poder supremo do presidente e não se enredarem nas contradições em que a lei
angolana parece dizer uma coisa e o presidente outra; por causa destas
contradições entre a lei e os desejos do presidente, os juízes ficam sem saber
o que fazer, e por isso não fazem nada… Adiam, hesitam.
Não há democracia real sem juízes
independentes. O facto é que, para existir democracia e liberdade, é sempre
necessário que existam tribunais sérios, honestos, imparciais, independentes e
que decidam de acordo com a lei.
Enquanto tal não acontecer,
não haverá liberdade e democracia em Angola.
O arrastar nos tribunais do
caso da impugnação da nomeação de Isabel dos Santos é um símbolo de um poder
judicial amordaçado e que não garante a liberdade.
Título, Imagem e Texto: Rui Verde, Maka Angola, 27-1-2017
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