Rodrigo Constantino
Quem faz ligação direta entre
pobreza e criminalidade normalmente vive bem longe da pobreza, no conforto da
civilização, observando os pobres como seres abstratos, idealizados ou, ainda
pior, seus mascotes. São os “intelectuais” que costumam viver da miséria
alheia, e falam o tempo todo daquilo que não conhecem de fato: do pobre. Por
isso tendem, de forma extremamente ofensiva para com os mais pobres, a fazer
essa ligação direta entre “desigualdade” e marginalidade.
Cheguei a levantar, para
provocar essa turma, a seguinte questão como dúvida do dia: se a violência é
causada pela desigualdade, como afirmam os “especialistas” da BoboNews, então
quer dizer que uma ala dos criminosos que mata outra ala dentro do presídio o
faz porque possui menos bens e riquezas?
Será que essa gente que culpa
a pobreza pela criminalidade sabe que Marcola, chefão de uma poderosa facção
criminosa, estudou filósofos e tudo? Que Playboy, já morto pela polícia
enquanto fugia, vinha de classe média com escolaridade? Vários bandidos são de
classe média ou mesmo alta, a começar pelos que ocupam cargos no poder
político. Enquanto isso, inúmeros pobres levam a vida com dignidade e respeito
às leis.
Pois bem: um texto um tanto
pessoal de autoria de Michele Prado tem circulado bastante pelas redes sociais, e merecidamente. Ela
coloca o dedo na ferida, defende os pobres com dignidade, ou seja, a maioria, e
ataca justamente esses “intelectuais” canalhas que exploram a miséria como seu
ganha-pão ou sua massagem no ego. Simplesmente imperdível, e deveria ser
leitura obrigatória em toda aula de “humanas” nas nossas universidades. Vejam:
Tenho 38 anos.
Aos 4 anos meu pai se separou
de minha mãe, foi se amanziguar com a melhor amiga dela, e enquanto passávamos
férias na Bahia, colocou nossas coisas num morro no Rio de Janeiro, em Brás de
Pina, na rua Oricá. Mais de 200 degraus de escada para chegar até lá.
Mainha, então com duas filhas
pequenas, voltou ao seu ofício de artesã. Vendeu a aliança pra nos comprar
comida, colocou duas barracas de ferro (que eram desmontadas e remontadas
diariamente) nas respectivas praças: Bonsucesso e Praça XV, e passou a nos
sustentar com o fruto de seu ofício.
Minha irmã estudava em escola
pública e eu, por conta de uma vizinha, ganhei uma bolsa de estudos, que
garanti passando sempre direto até o final de meus estudos do ensino
fundamental. Depois ganhei outra num colégio católico, ainda no RJ, e quando
voltamos para a Bahia ganhei mais uma num colégio também católico, Colégio
Paulo VI, que mantive sem perder de ano até o final do ensino secundário. Ainda
me lembro do Frei que sempre me incentivava a estudar cada vez mais, Frei
Serafim (já morto).
Quando criança não me lembro
as vezes em que vi minha mãe sair de casa cedo pra pegar uma imensa fila em
algum mercado e estocar alimentar básicos, antes que fossem reajustados de novo
por uma inflação galopante e horrenda.
Aprendi a comer todas as
vísceras e partes consideradas menos nobres: pé de galinha, tripa frita,
pescoço, moela, bofe etc.
Cansei de ver minha mãe
contando o pouco dinheiro e não dormir durante a noite preocupada com as
contas. Uma dia contava as cédulas e no dia seguinte nenhuma delas valia mais
nada, fora as vezes em que a moeda era substituída e brincávamos de ricos com
as que já não eram mais tostão algum.
Na vizinhança, a realidade não
era diferente.
Todos, em suas vidas,
enfrentavam a pobreza e quase todos conseguiam passar por ela mantendo um
mínimo de dignidade.
Tenho 38 anos e nunca roubei ninguém.
Nunca assassinei.
Nunca nem furei fila.
Digo isto, que é particular e
íntimo, porque NÃO ADMITO que um bando de vagabundos chamados de intelectuais,
que fazem a imprensa e ocupam as cátedras hoje, digam que EU ou minha irmã, ou
outros como nós, somos culpados pela barbárie que os SEUS DISCURSOS ajudaram a
criar. E também pra deixar claro que POBREZA não é, nem nunca será, a CULPADA
pela criminilidade.
Eu nunca irei aceitar a
esquizofrenia desses pensadores, até porque TENHO CERTEZA de que quem ama a
MISÉRIA são justamente eles, pois só assim conseguem capitalizar em cima da
desgraça alheia.
E, enquanto eu puder, vou
desmascarar cada um desses cretinos e seus discursos delirantes e
irresponsáveis.
P.S.: NENHUM DOS MEUS
VIZINHOS, NEM AMIGOS DA ESCOLA, VIRARAM MARGINAIS.
Título e Imagem: Rodrigo Constantino
Texto: Rodrigo Constantino e Michele
Prado
Marcação: JP
8-1-2017
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