domingo, 10 de abril de 2011

Notas para o debate sobre Realengo (e sobre o desarmamento)

Ilustração: Cadu Tavares

Um estudo feito nos Estados Unidos, depois do episódio de Columbine, dentro de um projeto intitulado Iniciativa por Escolas Seguras, indicou que os assassinos do tipo de Welington Meneses costumam dar alguns avisos antes de realizar o crime. O estudo acentua também que, na maioria, são pessoas que viveram uma grande perda e não conseguem suportá-la.
O estudo adverte que não adiantam processos estatísticos para prevenir um crime dessa natureza. Nada mais importante entretanto do que a iniciativa do governo norte-americano constitutindo um grupo para estudar o Colombine e outros casos do gênero.
Reforça um pouco o que disse: é necessário conhecer para apresentar propostas. No caso brasileiro, ao que me consta, não foi constituído um grupo para examinar o massacre em Realengo. Uma iniciativa desse tipo poderia ser mais eficaz do que as lamentações que se fazem na tribuna.
Não se trata, como no caso americano, onde havia material para estudos comparativos, de fazer mais um estudo sobre o perfil dos assassinos. Seria um exame específico do caso, com o objetivo de responder a esta pergunta: apesar de inevitável, é possível fazer alguma coisa para reduzir seu impacto sangrento?
Minha resposta é positiva num ponto: reduzir o tempo de chegada do socorro policial. Outro aspecto que pode ajudar, a exemplo do que acontece na Alemanha, é treinar as escolas para circunstâncias difíceis como essa.
As possibilidades de redução do tempo de chegada da polícia existem e os meios tecnológicos para isso também estão disponíveis. Uma boa pergunta para a comissão examinar seria esta: se não houvesse casualmente uma patrulha perto da escola, realizando inspeções de trânsito, quanto tempo levaria para chegar o socorro?

Um grupo de deputados foi ao local, soube depois que sai de lá. A pior alternativa é encerrar o trabalho apenas com a presença protocolar e a solidariedade às famílias. Um estudo detalhado do caso de Realengo pode contribuir para reduzir o impacto. Por que não tentá-lo? A expressão inevitável é correta mas não pode inibir a iniciativa de quem quer enfrentar o inevitável. As manifestações pedindo paz ajudam a processar o trauma da perda dos adolescentes, mas não bastam. Será preciso fazer alguma coisa, na direção certa.
A resposta do governo é reviver o projeto de proibição de venda de armas. Acontece que isto já foi vivido e a maioria da população optou pelo direito de comprar armas, num plebiscito nacional. Há vários caminhos para se interpretar o assassinato em Realengo. Um é seguir o caminho da Escócia e usar o choque emocional para se buscar a proibição das armas. Outro é aumentar o controle das armas clandestinas, reduzir a criminalidade, com o objetivo de convencer aos indivíduos que a atmosfera está ficando menos ameaçadora. Só quando isso acontecer, vai se entender a verdadeira causa da vitória do não naquele plebiscito: as pessoas têm medo de se desarmar, cercadas de assaltantes armados.
As condições iriam melhorar se os governos trabalhassem a lei existente. Numa reportagem em Cali, observei várias batidas policiais em busca de armas clandestinas. Não só recolhiam muitos exemplares, como enviavam um sinal de que era mais perigoso andar nas ruas com armas não registradas.
O sucesso dessa operação, um controle maior de fronteiras e uma articulação internacional com alguns centros de venda de armas ilegais poderiam, progressivamente, convencer as pessoas de que não é necessário se armar, mesmo com a existência de um comércio legal de armas.
Não existe solução mágica e sem políticas convincentes a pura reprodução do debate feito no plebiscito pode desembocar num impasse desgastante.
A responsabilidade nacional de controlar as armas ilegais deveria ser a trilha para completar aquelas observações que fiz acima sobre a preparação da polícia e das escolas, para encurtar o tempo de socorro.
Lembro-me que, durante o plebiscito, era usado um argumento estatístico demonstrando que as pessoas que portam armas estão sujeitas ao perigo maior que as desarmadas. No entanto, a maioria preferiu manter o direito de comprar armas. Sinal de que não acreditou nas estatísticas.
O caminho para se chegar a uma sociedade sem armas à venda é muito longo. Ou nasce de uma evolução de resultados concretos na política de segurança, ou depende apenas de fatos emocionais. Mas fatos emocionais são um boomerang. Podem se voltar contra os que se orientam apenas por eles.
Fernando Gabeira, ex-deputado federal, candidato a Governador do Estado do RJ, 10-04-2011
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