sexta-feira, 1 de abril de 2011

A próxima campanha eleitoral não augura nada de novo

Esta legislatura foi certamente uma das mais frustrantes da vida parlamentar portuguesa, improdutiva e destrutiva, marcada desde o início por um governo sob condição suspensiva, vivida sempre a prazo em iminências várias de irrupções anunciadas, recheada de erros e contradições, com a oposição incapaz de derrubar o Executivo e a transferência das iniciativas nesta matéria para a esfera do Presidente da República através dos mais mirabolantes cenários. Até a avaliação dos professores, questão resolvida a nível dos princípios, e politicamente é isso que interessa, se esboroou já na finalíssima numa encenação em que todos pareciam ter perdido os papéis e já ninguém conseguia ouvir o "ponto". 
Sem questionar o facto de a sequência dos acontecimentos, de que todos os lados são mais ou menos responsáveis, não poder conduzir com grande probabilidade a outro final, são muitas as perguntas sem resposta, demasiadas se pensarmos na dimensão da crise que se abriu e de quão pouco as suas possíveis soluções estão nas nossas mãos ou dependem de nós. A primeira tem a ver com o tempo. Se há sentimento que nos tem que dominar hoje mais do que nunca é o da urgência, de um tempo que nos foge ou de uma moratória que já nem sequer nos é dada. Quanto tempo alienámos com esta crise, do tempo que já não temos, no pior momento, nas piores condições de fragilização negocial e da nossa credibilidade quanto a sermos parte da solução e não só do problema? Que pensar de um país que se faz representar por um primeiro-ministro que em nome dele se compromete com o PEC IV, que dias depois se apresenta de novo demissionário junto com o seu putativo sucessor, para o mesmo compromisso que apesar de ter sido o motivo da crise continua em cima da mesa da mesmíssima maneira? Como bem disse Luís Amado, "estamos há demasiado tempo a jogar aos dados com o destino da economia portuguesa e dos portugueses". Sendo assim, como é, este foi um lance de altíssimo risco sobretudo pela sua difícil gestão externa e interna: desde a colocação da dívida a 15 de Abril e a 15 de Junho até à cimeira de final de Julho em que se tomarão decisões sobre a constituição do fundo europeu de estabilização, passando pelo desconhecimento sobre a nossa real situação financeira e as dificuldades acrescidas para uma execução orçamental rigorosa num clima interno de desânimo e frustração que pode mesmo tornar-se perigoso, pelo descrédito das instituições políticas e dos seus protagonistas, do crescente cepticismo dos cidadãos em relação ao valor da política ou à eficácia da democracia para resolver os reais problemas dos seus duros quotidianos. 

De facto, a próxima campanha eleitoral não augura nada de novo, tornando-se assim de duvidosa utilidade como solução que justifique o risco de uma ruptura com estas alargadas consequências, pois não só não mudam os protagonistas como provavelmente não mudarão os resultados quantitativa ou qualitativamente. Todos sabemos que não basta- rá uma maioria absoluta, nem uma coligação só de um lado, já que as alterações que se impõem para realizar em tempo útil tudo o que já devia estar feito e o que falta fazer requerem uma substancial alteração qualitativa dessa maioria que já não pode prescindir da esquerda socialista. Ora não mudando os protagonistas não se vê como tal vai ser possível. Resta saber o quanto do esforço que lhe compete reservará o Presidente da República agora, ou se o fará após o acto eleitoral, a fim de se obter uma frente nacional suficientemente ampla, diversa e coesa. 
Por fim confesso a minha humilhação quando vejo como os outros nos vêem, uma imagem cada fez mais próxima daquilo em que de facto nos tornámos: um país pobre, atrasado, irresponsável. Para Bruxelas e para o mundo em geral pouco interessa quem é poder ou oposição em Portugal. Estamos como estamos e onde estamos e isso retira-nos toda a margem de manobra para autodeterminações desta natureza, as regras estão estabelecidas e temos de acatá-las. Desta vez vai ser mesmo preciso falar verdade. Como vai ser?
Maria José Nogueira Pinto, Diário de Notícias, 31-03-2011
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