Cerca de 8 mil pessoas correm
risco de ficar sem o benefício
Futuro dos participantes
depende do STF
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O ex-comandante Zoroastro Filho gasta R$ 400 por mês com remédios, metade do que recebe do Aerus. Foto: Fábio Rossi/Agência O GLOBO |
Em meio a um imbróglio
jurídico que se arrasta desde 2004, parte dos aposentados do Aerus (fundo de
pensão de ex-funcionários da Varig e da Transbrasil) estão na iminência de ver
suas já minguadas aposentadorias secarem de vez. Os recursos de que o fundo
dispõe para pagar os benefícios do chamado plano 1 são suficientes para honrar
o compromisso por apenas mais quatro meses. Estão nessa situação 8.170 pessoas,
entre aposentados e pensionistas. Muitos enfrentam dificuldades para comprar
remédios e não têm como pagar plano de saúde.
A esperança para esses antigos
profissionais de Varig e Transbrasil e seus herdeiros é que a União assuma o
pagamento dos benefícios, como já determinado pela Justiça. Os sindicatos do
setor ajuizaram ação pleiteando que o governo federal assumisse os pagamentos
em 2004. A ação teve o seu pedido de tutela antecipada reconhecido dois anos
depois. Após longa discussão jurídica, o Supremo Tribunal Federal condicionou,
em 2010, a aplicação da tutela à decisão de primeira instância. Isso aconteceu
em julho deste ano, quando o juiz Jamil Oliveira, da 14ª Vara Federal de
Brasília, proferiu sentença favorável aos aposentados.
No entanto, a Advocacia Geral
da União (AGU) derrubou a decisão em outubro, o que fez o caso voltar ao STF.
Agora, o futuro deles está nas mãos do presidente do Supremo, Joaquim Barbosa.
Como o tribunal entra em recesso no próximo 20, os aposentados correm o risco
de passar mais um Natal tenso, na expectativa de que o vaivém jurídico tenha
finalmente um desfecho.
— Vamos passar mais um Natal a
pão e água. Vivo hoje em prisão domiciliar. Não lembro a última vez que fui ao
cinema e desde 2010 não tenho plano de saúde. Minha mulher anda de bengala porque
não tenho como pagar o tratamento do joelho — lamenta José Carlos Bolognese, 65
anos, ex-comissário da Varig.
Ele contribuiu com o Aerus por
20 anos, até 2002, quando se aposentou. Deveria receber cerca de R$ 4.800
mensais, mas apenas R$ 980 são depositados em sua conta a cada mês. Do INSS,
recebe ainda R$ 1.600 por mês, insuficientes para pagar as contas. Recorre ao
cheque especial com frequência e, constrangido, aceita a ajuda de seu único
filho de vez em quando.
Sindicatos acusam União de omissão
O Aerus foi criado em 1982
como opção de aposentadoria complementar a empregados do setor de aviação.
Tinha, na época, três fontes de recursos: os trabalhadores, as empresas
patrocinadoras (das quais a Varig era a maior) e uma taxa de 3% que incidia
sobre a venda das passagens domésticas.
Nos anos 90, o fundo deixou de
receber o dinheiro arrecadado com a taxa. As contribuições da Varig também
escassearam. Até que, em 2005, a companhia entrou em recuperação judicial e foi
dividida em duas. A parte boa foi vendida em 2006 à sua ex-subsidiária VarigLog
— então controlada pelo fundo americano Matlin Patterson — e, no ano seguinte,
à Gol.
A parte podre, rebatizada de
Flex, teve a falência decretada em 2010, deixando dívida com o Aerus de R$ 3
bilhões. Nesse meio tempo, a Varig fez 21 renegociações de sua dívida com o
fundo e a Transbrasil, oito. Todas aprovadas pela antiga Secretaria de
Previdência Complementar, hoje Previc, ligada ao governo federal. Por isso, o
juiz Jamil Oliveira entendeu que a União deve assumir os benefícios.
— A principal falha do governo
foi permitir essas repactuações. Além disso, o governo permitiu a venda da
Varig sem obter o compromisso de pagamento da dívida com o Aerus — disse Élnio
Borges, vice-presidente da Associação dos Pilotos da Varig.
Para dar sobrevida ao fundo,
seus interventores reduziram o pagamento devido aos participantes. Quem está no
plano 1 recebe, em média, 10% do valor que deveria receber. Os aposentados do
plano 2 recebem cerca de 60%, segundo José Pereira, interventor do Aerus. A
folha de pagamento mensal do plano 1 é de R$ 1,8 milhão, e a do plano 2, de R$
5,6 milhões. Se todos os participantes recebessem o que lhes é devido, a folha
atingiria R$ 23 milhões mensais.
O desdobramento em dois planos
foi feito em meados dos anos 90. A diferença é que, no plano 1, o contribuinte
sabia quanto ia receber no futuro. No plano 2, o benefício poderia variar de
acordo com o rendimento das aplicações. Apesar de mais arriscado, as 9.190
pessoas do plano 2 estão em melhor situação. Há garantia de pagamento até 2015.
— Para quem ficou no plano 1 a
situação é bem crítica. Só temos recursos para garantir o pagamento até abril —
admite Pereira.
O ex-comandante da Varig
Zoroastro Ferreira Lima Filho, de 82 anos, é um dos que optaram por permanecer
no plano 1. Com 38 anos de voo na Varig e Cruzeiro do Sul, ele recebe R$ 800
por mês do Aerus. Metade disso é consumido em remédios para hipertensão,
diabetes e doenças cardiovasculares. Não fosse a mulher, Vera, funcionária de
carreira do BNDES, não teria dinheiro nem para para o aluguel de R$ 2.500, já
que ganha R$ 2.400 mensais do INSS. Nas suas contas, sua aposentadoria
complementar deveria ser em torno de R$ 8 mil.
— Com a minha idade você acha
que eu arrumo emprego onde? Se o benefício acabar, vou fazer o quê? Pedir
esmola? — indaga o ex-comandante.
De acordo com Pereira, há
ainda dois imóveis da antiga Varig que podem ser leiloados, um no Rio e um em
Brasília. Um novo leilão deve ser feito no início de 2013. Se bem-sucedido,
poderá dar fôlego de mais alguns meses aos aposentados.
Reportagem de Danielle Oliveira, O Globo, 14-12-2012
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