terça-feira, 10 de junho de 2014

Eu Não Sou Pobre – Só Não Tenho Dinheiro

José Carlos Bolognese
A frase contraditória vai contra a crença comum de nossos dias em que o dinheiro parece ser a medida de todas as coisas. É claro que não se vive sem dinheiro para as necessidades básicas (e algumas nem tão básicas, mas igualmente importantes) mas... não se pode tomar como riqueza apenas o que se pode pagar com dinheiro. Ser rico em bens materiais está mais para “estar” do que para ”ser” ou “ter”, pois nossa satisfação com esses bens é volátil, seja por achar que ainda é pouco o que temos seja pelo medo de perdê-los.
Assim, se estar rico é uma circunstância mutável, a ideia de riqueza perene passa a ser a posse de outros bens, não alienáveis nem perecíveis.

Podendo satisfazer suas necessidades com o salário que ganha, um trabalhador é tanto mais feliz – e rico em certo sentido – quanto esteja contente onde trabalha e com o que faz. Sua riqueza inalienável vem do sentimento de pertencer a um sistema com o qual colabora e que o respeita. E ele não precisa abrir mão da ambição por voos mais altos até porque foi a ambição de outros antes dele que gerou o seu emprego.

A Inveja, conforme Sebastián de Covarrubias, gravura do século 16

Gosto de pensar em nós, trabalhadores da Varig, como um grupo de pessoas não pobres. Estar passando coletivamente por uma das piores fases de nossas vidas só nos faz carentes dos bens materiais – o que é doloroso, sem dúvida – mas somos ricos de tantas outras coisas que nos parece que os irresponsáveis que nos levaram a esse estado de coisas o fizeram movidos pela inveja do que eram a Varig e seus funcionários. Ou talvez pela sua incapacidade de nos dominar. Ou, pior ainda, a Varig estava em suas cogitações apenas como instrumento de sua chegada e permanência no poder.

Hoje, quando vemos manifestações, greves, reivindicações – algumas justas, outras apenas a fachada de interesses políticos – passar por cima do direito de ir e vir dos outros cidadãos, os variguianos ao não irem por esse caminho, estão revelando parte da sua riqueza sem cifrões. Nosso respeito pelo público vem de muito antes.

Mas, infelizmente sem escolha, nascemos no Brasil, um rico país pobre. Aqui as grandes fortunas das últimas décadas não foram “criadas” por inovação, empreendedorismo ou mérito, mas pela pobreza moral que chafurda nos contratos de grandes obras e seus inevitáveis aditivos. Outras fortunas são criadas até mesmo dentro das funções de Estado deixando claro que, se da boca pra fora todos somos iguais, das portas de gabinetes para dentro se encontram os muito mais iguais.

Nós, trabalhadores da Varig, criamos vários tipos de riqueza nesse ingrato país. Uma delas foi a qualidade e segurança de um produto que repercute ainda hoje quando se recorda a empresa da Rosa dos Ventos.

À parte da riqueza intangível produzida por nós, trabalhadores da Varig, em oito décadas e da qual sempre poderemos nos orgulhar, também fomos capazes de acumular uma fortuna em ativos reais e palpáveis - no momento fora do nosso alcance - sequestrada pelas abonadas mentes pobres aboletadas no poder em seus vários níveis.

A política no Brasil é um gritante exemplo de pobreza nadando num oceano de bilhões de reais e um título eleitoral de um pobre cidadão é um instrumento que cria fortunas para serem desfrutas bem longe dele.
Título e Texto: José Carlos Bolognese, 10-06-2014

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