Rui Ramos
O que devemos reter do ano que
passou para perceber o ano que começa? O fracasso de Obama, a queda dos BRIC, o
populismo no Ocidente, a esquerda que não governa, a persistência de Passos, e
Marcelo
O fracasso da estratégia de
Obama de olhar para o lado.
Após o ataque de 11 de
Setembro de 2001, o presidente Bush tentou democratizar o Médio Oriente. Não
conseguiu. Barack Obama, a partir de 2009, seguiu por outra via: retirar, não
intervir, ceder às potências hostis (Irão, Rússia…), mesmo quando estas pisavam
as suas “linhas vermelhas”. O resultado foram mais guerras, mais atentados e a
maior vaga de refugiados a atingir a Europa ocidental. Finalmente, Obama mandou
os aviões. O próximo presidente enviará a infantaria. E veremos o que fará
perante a desordem entre a Arábia Saudita e o Irão. Como disse Marco Rubio, não é possível transformar os EUA numa Suíça
em ponto grande. Os EUA e o mundo são como Maomé e a montanha.
O futuro nem sempre é
tropical.
Durante alguns anos, enquanto
os EUA e a Europa ocidental patinavam na crise da dívida, o futuro pareceu
residir entre bambus e coqueiros. A China exportava produtos industriais e
expandia cidades e infraestruturas, e os outros países exportavam energia e matérias-primas
para a China. Alguma coisa podia correr mal? Podia. Bastou a China abrandar, ao
mesmo tempo que os juros aumentavam nos EUA. O Brasil, Angola, e a Venezuela –
a trilogia das nossas esperanças pós-europeias de há uns anos atrás — tremeram.
A nova classe média brasileira começou a ser comprimida pela
inflação e pelos impostos. A notícia do fim da predominância ocidental talvez
tenha sido tão prematura como a da morte de Mark Twain.
Os populismos ocidentais.
Na América Latina, a queda do
preço do petróleo feriu os populismos socialistas da Argentina, Venezuela e
Brasil. Na Europa e nos EUA, porém, os populismos xenófobos estão em ascensão.
Já governam na Hungria e na Polónia, afectam a governação no norte da Europa, e
progridem nas eleições em França e Inglaterra. Donald Trump representa a
tendência nos EUA. Em comum, têm o repúdio da globalização (migrações,
quaisquer formas de cooperação ou de integração económica), e o culto de Vladimir Putin. No Reino Unido, os populistas terão em
breve o referendo sobre a UE. Depois do teste da recessão, as democracias
ocidentais vão ter o teste do populismo.
A esquerda não deixa
governar, mas também não governa.
António Costa, o PCP e o BE
conseguiram impedir o PSD e o CDS de governar. Mas não conseguem governar eles
próprios, a não ser para aumentar a despesa. O governo chefiado pelo grande
derrotado das eleições de 4 de Outubro terá de negociar com toda a gente, a
todo o momento. Temos o governo mais fraco deste regime. Não pensemos em
reformas para propiciar o investimento e viabilizar o Estado social. Tal como a
Grécia, Portugal só mudará sob pressão. A crise é o novo modo de governo em
países incapazes de se reformarem.
Passos Coelho veio para
ficar.
Desde 2011, muitos oligarcas
contestaram o programa de ajustamento apenas para contestarem Passos Coelho:
era preciso afastá-lo, mesmo à custa de um segundo resgate. Atribuíram-lhe
fanatismos que nunca teve, negaram-lhe qualidades pessoais que obviamente
tinha. Passos esteve assim destinado a surpreender. Surpreendeu em 2013, quando
não desistiu; surpreendeu em Junho de 2014, quando conseguiu a saída limpa em
que mais ninguém acreditara; surpreendeu em Outubro de 2015, quando ganhou as
eleições que nunca deveria ter ganho; e surpreendeu outra vez em Dezembro,
quando toda a gente o esperava isolado e vingativo, e ele percebeu que lhe convinha
estar acima de golpes fáceis.
Marcelo Rebelo de Sousa.
Vai ser preciso que Cristo
desça à terra para ele não ser Presidente da República, e muito provavelmente
até Cristo acabaria por votar em Marcelo.
Título e Texto: Rui Ramos, Observador,
5-1-2016
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