Aparecido Raimundo de Souza
DUAS AMIGAS CONVERSAM AO TELEFONE.
Amiga 1:
— Chegou ai, amiga, a encomenda que
mandei pra você?
Amiga 2:
— Encomenda? Que encomenda?
Amiga 1:
— Uma lembrancinha que enviei pelos
correios. Faz uma semana...
Amiga 2:
— Até agora, por aqui, não chegou
nada. Tem certeza que não mandou entregar por uma dessas tartarugas ifood?
Amiga 1:
— Engraçadinha. Falo sério.
Estranho! Postei com AR. Já era para estar em suas mãos... Verei depois pela
Internet, no site da agência, por onde anda o bagulho...
Amiga 2:
— Bagulho? Tudo bem, querida. Não
precisava se dar ao trabalho. O que vale é a intenção. O que comprou?
Amiga 1:
— Sabia que perguntaria. Como você
é previsível! Não direi. É surpresa!
Amiga 2:
— Fala, sua idiota. Entre nós não
deveria existir estes protocolos.
Amiga 1:
— Eu sei. Compreendo. Mas veja só.
Não teria graça. Quando chegar às suas mãos, você poderá matar a curiosidade e
se deleitar.
Amiga 2:
— Ao menos dê uma pista. É de usar
ou de comer?
Amiga 1:
— As duas coisas. Como lhe conheço
de velhos carnavais, você amará tanto que, tenho certeza, engolirá até o
caroço, digo até a caixa e palitará os dentes com o barbante...
— Na mosca. Matei a charada. Claro!
Que mais poderia ser? Você me mandou bombons. Sabe como sou tarada por chocolates.
Realmente, amiga, neste caso, nem a embalagem escapará ilesa. Sem contar no
papel do embrulho...
Amiga 1:
— Espero que não faça como da
última vez em que lhe fiz uma afabilidade (coisa de mãe pra filha) e você usou
o papel do presente no banheiro. Não direi nem uma palavra. Contudo, lhe
asseguro: não é uma simples caixa de bombons.
Amiga 2:
— Que sacanagem! Resolveu me tirar?
O que ganha tentando acabar comigo? Quer me matar? Ninguém melhor que você sabe
do meu problema. Não posso ficar nervosa ou desassossegar o coração com a
curiosidade. Dá uma coceira dos diabos. Lembra da derradeira crise? Cocei
tanto, tanto me cocei, que você mesma teve que me levar carregada para o
hospital. Ainda tem mentalizada na mente os ferimentos que provoquei por todo o
corpo em decorrência de meter as unhas na pele até sangrar?
Amiga 1:
— Como poderia esquecer amiga! Foi
horrível. Recordo perfeitamente de tudo. Pela nossa amizade, lhe peço: tenha
calma. Respire. Conte até dez. Dissolva os problemas, afrouxe os músculos,
adoce a alma.
Amiga 2:
— Como, ter calma, como relaxar, ou
como adoçar a alma? A propósito: acredita que só de você falar, eu estou me
coçando todinha? Dos chifres da cabeça aos sapatos enfiados nos pés. Daqui a
pouco arranco os cabelos da bo... Desculpa, da perereca. A bichinha aqui
embaixo parece em carne viva. Literalmente me pego ardendo em chamas...
Desembucha... O que foi que me mandou? Um bombeiro com a mangueira pronta para
espirrar água morna nos traseiros redondinhos da minha ofurô que adquiri da
Jacuzzi?
Amiga 1
— Relaxe... Nada de bombeiro. Uau,
sua sem vergonha. Você comprou uma Jacuzzi e não me disse nada? Vai ser amiga
assim lá nos quintos... E depois tem coragem de me dizer que sou a única
companheira para todas as horas... Sei...!
Amiga 2
— Pera ai amiga. Dá um segundo.
Ai!... Comprei. E te falei. Você é que não prestou atenção. Ai, ui... Que isso!
Estava no outro telefone com seu "namorido". Lembra?
Amiga 1
— O que aconteceu, o que houve? Se
você falou, entrou por um ouvido e saiu pelos cotovelos. Meu
"namorido" me deu um pé nos fundilhos.
Amiga 2
— A coceira... O inferno da coceira
está me atacando. Estou toda empolada... Ui!!! O Gerson terminou com você?
Amiga 1
— Relaxe. Respire fundo. Vá até a
cozinha e tome um copo de água com limão. É tiro e queda. Depois pule na sua
banheira. O Gerson me trocou por uma de quinze.
Amiga 2
— Vai catar coquinho. Estou calma.
"Calmérrima". Eita nós! Que merda! Por uma de quinze? Então ele pegou
a sirigaita pra acabar de criar? Meu Deus, que droga...
Amiga 1
— O que desta vez?
Amiga 2
— A portaria resolveu me atazanar
as idéias. Alguém interfonando... Aguenta ai. Vou ver quem é. Não saia da
linha, não desligue... Credo, amiga. Por uma de quinze? Quem manda você não se
cuidar... A ninfeta é linda?
Amiga 1
— Vai logo, vai logo... Igual a
você, estou aqui me mordendo toda por dentro pra saber quem está lá embaixo lhe
procurando. Será que é o meu presente que chegou? Me cuidar? Mais do que me
cuido? Academia, corrida, boa alimentação, tenho até um personal trainner. Um
gato, menina, um gato. Quanto a nova musa, cá entre nós, um docinho de coco. O
Gersom pra mulher sempre teve gosto apurado.
CINCO MINUTOS DEPOIS:
Amiga 2
— Ai!!! Não consigo me conter... A
coceira. Que diabo! Deixarei seu presente para desembrulhar mais tarde. A
coceira, amiga, a droga da coceira aumentou demais... Foi a ansiedade... Você
me deixou agoniada. Acho que vou... Acho que vou!!! Me fale do seu gato, digo
do personal...
Amiga 1
— Vai o quê? Fala, infeliz!
Esquece.
Amiga 2
— Estou a procura do álcool. Fala
do gato...
Amiga 1
— Álcool para quê? Vai botar fogo
nos pecados? Que gato?
Amiga 2
— Ai... Ui... Minha nossa... UF...
Seu personal. Você disse que a criatura é um gato.
Amiga 1
— Fala, desembucha, o que houve?
Ele é um gato. E que gato! Para que o álcool?
Amiga 2
— CLIC...
Amiga 1
— Alô... Alô... Alôaaaaaa...!!!
Filha de uma égua mal agradecida: não é que desligou na minha cara!
Título e Texto: Aparecido
Raimundo de Souza, de Vila Velha, Espírito Santo. 14-8-2020
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