terça-feira, 10 de dezembro de 2024

[Aparecido rasga o verbo] Rastros dos pés descalços

Aparecido Raimundo de Souza 

Para Amanda e Santiago 

TODAS ÀS VEZES, quando o sol se põe e a brisa marinha começa a sussurrar segredos, as areias quentes da praia guardam histórias de passos descalços. Esses rastros, embora efêmeros, carregam uma profundidade quase poética. Cada pegada conta uma narrativa única, escrita nas línguas universais de esperança, saudade e liberdade. 

Há, todavia, quem vá mais longe e floreie, dizendo que caminhar descalço é sentir a terra respirando sob os pés, como uma troca silenciosa entre o humano e a natureza. Naquelas marcas, acreditem, os sonhos se entrelaçam, se embaraçam, se amoldam com a realidade, como se cada grão de areia pudesse revelar um capítulo oculto da jornada pessoal de quem passou por ali. 

Os rastros dos pés descalços vão ainda mais longe. São como fios de uma tapeçaria invisível, tecida com memórias de verões passados, amores de infância e noites estreladas. Eles representam um momento de conexão pura e simples, um retorno às origens onde não há barreiras entre o corpo e a terra. Caminhar descalço é um ato de coragem e vulnerabilidade, sobretudo um convite para sentir e viver plenamente o presente. 

E enquanto as ondas do mar lentamente apagam essas marcas, o que fica no rosto tímido da praia imensa, é a lembrança sempiterna do toque suave da areia e a sensação de liberdade absoluta. Os rastros dos pés descalços são, portanto, mais do que simples impressões na areia; são testemunhos e penhores, argumentos e provas das pequenas e grandes histórias que compõem a nossa existência. 

Esses rastros, embora efêmeros, carregam uma profundidade quase poética. Cada pegada, cada pista e indício, por menor que seja, conta uma narrativa única, escrita nas línguas universais de esperança, saudade e liberdade. Amanda, por exemplo, se lembrava de sua infância, das tardes em que corria pela mesma praia, competindo com o mar, sem medo de cair. Agora, adulta, cada passo se transformava numa meditação, ou uma tentativa de encontrar o equilíbrio perdido ao longo dos anos. 

Para Amanda, a caminhada noturna se fazia numa espécie de ritual. Era neles, entre a vastidão esplendorosa do mar e a abundancia magnânima e imensa do céu estrelado, que ela se sentia mais próxima de tudo, notadamente de si mesma. Eles representam um momento único e inimitável, pomposo e abençoado de conexão pura e simples, um retorno às origens onde não há barreiras entre o corpo e a terra. Caminhar descalço é um ato de coragem e vulnerabilidade, um convite ímpar para sentir e viver plenamente o presente. 

A cada passo, Amanda sentia a coragem renascer, avigorar, repulular e rejuvenescer. A areia fria da noite se moldava tal como um lembrete de que estava viva, respirando, e o mais importante, de que podia sentir e se permitir ser indefesa e vulnerável. E enquanto as ondas do mar lentamente apagam essas marcas, o que fica sedimentado é a lembrança do toque suave da areia e a sensação de liberdade absoluta. 

Ao final da caminhada, Amanda sabia que seus rastros desapareceriam com a maré, mas o que importava, o que importava e fazia toda a diferença, não outra coisa senão a jornada, os momentos imorredouros em que se permitiu ser verdadeira consigo mesma. Foi durante uma dessas andanças, semanas depois, que Amanda encontrou Santiago. Ele percorria em direção adversante, com um sorriso tranquilo e olhos que refletiam a luz clara da lua. 

Compartilharam, num primeiro momento, um sorriso tímido e, em seguida, começaram a marchar juntos. Santiago, um simples moçoilo, mas talentoso piloto de aviões, compreendia a beleza deslumbrante dos rastros na areia. Com o passar dos dias, suas conversas se tornaram mais profundas e arraigadas, vastas e frequentes, e cada encontro à beira-mar uma nova dança de emoções indescritíveis entrava em cena. 

Santiago ensinou Amanda a ver a vida sob uma nova perspectiva, e juntos, compartilharam risos, sonhos, fantasias e até as tristezas mais sombrias. No tranquilo desdobramento de suas histórias juntos, Amanda e Santiago se depararam com um amor bucolicamente profundo. Agora com mais familiaridade, passaram a se encontrar, sempre como da primeira vez, ao pôr do sol, e neles, comungavam quimeras adormecidas e revelações à beira-mar. Sempre à beira-mar. 

Em uma dessas noites, coisa de três meses depois, deitados na areia sob o céu estrelado, ele lentamente pulou sobre ela e a despiu. Primeiro levantou-lhe o vestido, em seguida, desceu a calcinha, deixando à flor oculta completamente aos reveses da nudez. Ele também, em contínuo, se fez devasso e sem nada. Num dado momento, como veio ao mundo, se aninhou sobre ela e mostrou a sua intenção. Sem titubear, sem pedir permissão. A arma engatilhada, o sangue fervendo, o peito arfando, partiu com tudo. 

O amor endoidecido floresceu. Criou asas. Se agigantou, virou sangue misturado na areia.  De maneira plena e natural, entre gritos e beijos, beijos e carícias, ele a desvirginou. Sob a vasta cúpula do céu noturno, com as estrelas como testemunhas silenciosas, Amanda e Santiago selaram seu amor. A areia fria a partir de então, se transformou num contraste com o calor de seus corações, criando uma lembrança eterna do momento em que se uniram em um só anseio abrasante, e, por conta dele, se entregaram à profundidade de seus sentimentos mais efusivos. 

Quando o sol se põe e a brisa marinha começa a sussurrar segredos, as areias quentes da praia guardam histórias de passos descalços. Estava uma noite tranquila de verão quando Amanda decidiu caminhar pela praia. Sentia que cada centímetro à frente, conectava mais e mais com a sua essência, como se a areia estivesse absorvendo todas as suas preocupações. Depois dessa noite, e de outras mais que se seguiram, Amanda e Santiago continuaram as suas caminhadas pela praia. 

Fizeram voos rasantes, voaram em céus de brigadeiro e perderam a perna do vento. Mesmo com os desafios que a vida apresentava, eles se encontraram sempre na areia, compartilhando risos e lágrimas, alegrias e tristezas frustrações e momentos inesquecíveis. Entretanto, aos goles poucos, seguiram edificando uma vida juntos passo a passo. Os rastros dos pés descalços são, portanto, é bom que se repita, mais do que simples impressões deixadas na areia; são testemunhos das pequenas e grandes histórias que compõem a nossa existência. 

Os rastros dos pés descalços vão ainda mais adiante. Transcendem as barreiras. São como fios de uma tapeçaria invisível, tramada, conluiada, tecida com memórias de verões passados, amores de infância e noites estreladas. Eles representam um momento único de conexão pura e simples, um retorno às origens onde não há barreiras entre o corpo e a Terra. Caminhar descalço é um ato de coragem e vulnerabilidade, sobretudo um convite para sentir e viver plenamente o presente. 

Título e Texto: Aparecido Raimundo de Souza, da Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, 10-12-2024  

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2 comentários:

  1. O AUTOR Aparecido Raimundo de Souza em seu texto Rastros dos pés descalços, cria, sem dúvida alguma, uma bela narrativa de atmosférica poética e profunda sobre o ato de caminhar descalço, usando a metáfora dos rastros na areia para explorar temas de conexão, memória e liberdade. Através dos personagens Amanda e Santiago, o texto nos guia para uma reflexão profunda sobre a simplicidade e a beleza dos momentos que vivenciamos, e como esses momentos, mesmo efêmeros, podem deixar marcas duradouras em nossas vidas. Através das pegadas na areia, o Aparecido deixa claro a sua ideia de que cada passo, cada rastro, carrega consigo uma história única, todavia, cheia de emoções e significados. Na verdade, logicamente, visto pela ótica da simplicidade, indiretamente o texto é um convite certeiro, para todos nós, no sentido de nos reconectarmos com a terra e com nós mesmos buscando no simples ato de caminhar sem sapatos, uma forma de meditação e de encontro com a nossa própria essência. A relação entre Amanda e Santiago, que o tempo todo se desenrola no cenário à beira-mar, representa auspiciosamente essa busca por conexões verdadeiras e significativas, mostrando como os encontros e experiências compartilhadas podem nos transformar e enriquecer a nossa jornada. A descrição do encontro entre, Amanda e Santiago, lado idêntico, também é tocante e significativo, detalhando como as experiências compartilhadas (repetindo o já dito acima) podem transformar nossas vidas e nos ensinar a ver o mundo de uma nova maneira. A metáfora dos rastros na areia como testemunhos das pequenas e grandes histórias da nossa existência é poderosa e nos faz refletir com mais seriedade sobre a importância de cada momento vivido. A areia e a sensação de liberdade absoluta que Amanda sentia ao caminhar descalça se faziam mais do que simples impressões deixadas na praia.
    Tatiana Gomes Neves, do sítio Shangri-Lá, divisa de ES e MG.

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  2. Ainda sobre os Rastros dos pés descalços final.
    Sem dúvida alguma, testemunhos de uma jornada pessoal onde se permitia acima de qualquer coisa, ser verdadeira consigo mesma. Ao final de cada caminhada, Amanda sabia que seus rastros desapareceriam com a maré, mas o que realmente importava para ela, em particular, não outra coisa senão a jornada em si, ou seja, os momentos imorredouros em que se permitia sentir e viver plenamente. As palavras do Aparecido se mostram bem definidas. Ao final da caminhada, Amanda sabia que seus rastros desapareceriam com a maré, mas o que importava, o que realmente fazia toda a diferença, era a jornada e os momentos em que se permitiu ser verdadeira consigo mesma. Ao lado de Santiago, ela encontrou uma nova forma de ver e viver a vida, e juntos, continuaram a deixar seus rastros na areia, criando memórias inesquecíveis e se permitindo viver plenamente o presente. E a história não para. Segue adiante. Em uma dessas noites, coisa de três meses depois, deitados na areia sob o céu estrelado, ele lentamente pulou sobre ela e a despiu. Primeiro levantou-lhe o vestido, em seguida, desceu a calcinha, deixando à flor oculta completamente aos reveses da nudez. Sob a vasta cúpula do céu noturno, com as estrelas como testemunhas silenciosas, Amanda e Santiago selaram seu amor. Nessa altura, a areia fria, a partir de então, se transformou num contraste com o calor de seus corações, criando uma lembrança eterna do momento em que se uniram em um só anseio abrasante, e, por conta dele, se entregaram à profundidade de seus sentimentos mais efusivos. Após aquela noite prodigiosamente mágica sob as estrelas, Amanda e Santiago continuaram a compartilhar seus passos descalços pela praia, cada vez mais unidos. Suas caminhadas noturnas se tornaram um ritual sagrado, onde cada conversa e cada riso sintetizavam uma dança harmoniosa com as ondas do mar. Com o tempo, suas vidas foram entrelaçadas como os rastros na areia, criando um tecido rico de memórias e experiências compartilhadas. Eles enfrentaram desafios, superaram obstáculos e celebraram vitórias juntos, sempre encontrando forças na conexão profunda que haviam estabelecido. Nessa altura, seus rastros descalços na areia continuaram a contar histórias de esperança, liberdade e amor eterno, marcando para sempre a praia onde encontraram um ao outro e a si mesmos.
    Tatiana Gomes Neves, do sítio Shangri-Lá, divisa de ES e MG.

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