Dois cidadãos angolanos
relataram esta sexta-feira, (07) no Gabinete do Parlamento Europeu em Lisboa, casos
de violentos abusos de direitos humanos que viveram e testemunharam na região
diamantífera das Lundas, em Angola.
Linda Moisés da Rosa contou que perdeu dois filhos na Lunda Norte, o primeiro soterrado num acidente em que foram vítimas 45 garimpeiros, no dia 5 de Dezembro de 2009, e dois meses depois o segundo “assassinado pelos seguranças nas instalações da empresa diamantífera Sociedade Mineira do Cuango da qual os generais são sócios”.
O relato dos detalhes sobre o
resgate do cadáver do primeiro filho e o assassínio “à catanada” do segundo não
chegou ao fim porque Linda Moisés da Rosa, visivelmente emocionada, acabou por
desmaiar, tendo sido assistida pelo INEM no local.
Os relatos constam do livro
“Diamantes de Sangue”, do jornalista e activista angolano Rafael Marques que
acompanha Linda Moisés Rosa e o regedor (chefe tradicional) Mwana Capenda, da
Lunda Norte, numa deslocação a Portugal, e foram repetidos na sessão “Diamantes, Milionários,
Violência e Pobreza nas Lundas”, promovida pela eurodeputada socialista Ana
Gomes.
Linda Moisés da Rosa e Mwana
Capenda contaram também que nos últimos dias as autoridades angolanas os
tentaram subornar em troca do silêncio e para desistirem da viagem a Portugal.
“Eu sou Mwana Capenda (…) e
fico muito envergonhado quando ouço falar das Lundas. Já estamos cansados, já
multiplicámos as nossas forças, mas o Governo não faz nada”, disse o chefe
tradicional.
“Temos esta riqueza toda, mas
ficamos só com os buracos. Eu, pessoalmente há dias fui perseguido pela polícia
só porque quero falar verdade. Fui ameaçado pela polícia e com pistolas. Se na
verdade temos governos devíamos ter organização e ordem e respeito pelo ser
humano. Mas não temos democracia. Falam da democracia mas nunca cheiramos o
cheiro da democracia”, lamenta Mwana Capenda.
Para o chefe tradicional da
Lunda Norte, a exploração dos diamantes em nada beneficia as populações locais,
que também são vítimas de agressões arbitrárias da polícia e dos militares.
“Não temos casas, não temos
escolas, não temos água, não temos energia. Quem goza da riqueza da minha
terra? Os outros. Isto é matar”, acusou o regedor, acrescentando que se
multiplicam os casos de violações e agressões a mulheres camponesas em “actos
de intimidação” para obrigar as populações a abandonar os terrenos agrícolas
que podem vir a ser no futuro zonas de garimpo.
Segundo Rafael Marques, a
situação de pobreza e de falta de infraestruturas na província é tal que não há
morgues, o que está a fazer com que as populações usem gasolina para “tratar
dos cadáveres”.
“O Governo vai provocar uma
guerra civil. Vamos começar a matar-nos com catanas e paus? Não há deputados,
nem ministros que estão a sofrer como nós. Isto é matar: os nossos filhos não
têm escolas”, acrescentou Mwana Capenda, que diz que Portugal tem obrigação de
intervir, explicando que é preciso vir a Lisboa para “multiplicar forças” em
Angola.
O activista Rafael Marques
explicou também que há um processo neste momento na Bélgica em que uma das
empresas que tinha a “responsabilidade de comprar diamantes nas Lundas” – a
Omega – tinha como parceira uma empresa que foi criada pelo Estado angolano
para compra exclusiva dos diamantes produzidos, “neste caso, por mineiros
ilegais”.
Segundo Rafael Marques, a
Omega está a ser processada porque quando operava em Angola vendia os diamantes
a um preço muito baixo para evitar o pagamento de impostos na Europa, “vendia,
por isso, os diamantes a si própria para não pagar impostos” e quando os
diamantes chegavam à Bélgica eram vendidos pelo mesmo valor para não serem
devidamente taxados.
“Calcula-se que nesta operação
estejam em causa mais de quatro mil milhões de dólares [2,9 mil milhões de
euros, ao câmbio actual] e, como multa, as autoridades belgas aplicaram à Omega
– e neste consórcio a Isabel dos Santos, filha do Presidente José Eduardo dos
Santos, detém 24 por cento – foram obrigados apenas a pagar uma multa de 160
milhões de euros, pela fraude fiscal cometida na Europa”, disse Rafael Marques.
Título, Imagem e Texto: Maka Angola, 09-02-2014
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