Bruno Garschagen
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Foto: U.S. Air Force
photo/Tech Sgt. Cohen A. Young
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Hillary Clinton sabia ou não
sabia que um membro de sua campanha à presidência em 2016 ajudou a financiar um
dossiê com acusações contra o presidente Donald Trump?
O jornal democrata The
Washington Post revelou a história no dia 24 de outubro. Representante
da campanha e do comitê do Partido Democrata, o advogado Marc E. Elias
contratou a empresa Fusion GPS, que por sua vez contratou o investigador inglês
Christopher Steele, um ex-funcionário do departamento de inteligência britânico
que tinha conexões com o FBI e com a comunidade de inteligência americana. Para
pagar pelo serviço, Elias teria usado parte dos quase US$ 10 milhões que recebeu da campanha e do comitê
entre junho de 2015 e dezembro de 2016.
O jornal também revelou que
parte das informações levantadas por Steele foi utilizada no dossiê que
foi publicado pelo site Buzfeed em janeiro deste ano. O
documento tentava estabelecer vínculos espúrios entre o governo russo e Trump
ao sugerir que Moscou teria informações pessoais comprometedoras sobre o
presidente americano e que teria colaborado secretamente na sua vitoriosa
campanha presidencial. Nada foi provado até agora, mas o FBI, uma comissão
independente e o Senado americano estão investigando o assunto.
A dúvida permanece: Hillary
Clinton estava, afinal, a par da situação? Sem uma confissão ou prova concreta,
neste momento só é possível especular com base nos fatos, nos seus atos como
política e na sua ideologia. Para isso, precisamos saber quem é Hillary
Clinton.
Sob o ponto de vista
ideológico, Hillary foi profundamente influenciada por Saul Alinsky, ideólogo
socialista e ativista político radical que trabalhou durante anos para o
Partido Comunista de Chicago e que também exerceu grande influência sobre Barack Obama. Alinsky
defendia a tese marxista da propriedade estatal dos meios de produção, mas,
como intelectual pragmático da extrema-esquerda, não achava que tal finalidade
poderia ser atingida por meio de uma revolução violenta. Ele propugnava um
trabalho lento, feito em partes, baseado numa organização paciente de esforços
no âmbito local para se atingir os objetivos, mesmo que estes demorassem
gerações para serem realizados.
Na década de 1960, Hillary
fazia parte de um grupo de estudantes de esquerda que não apenas seguiu, mas
atualizou (e de certa forma aprimorou) os ensinamentos de Alinsky. Ela,
inclusive, estudou o primeiro livro de Alinsky, Reveille for Radicals,
em seu trabalho final de graduação. Sua conclusão sintetizava a sua própria
expectativa: se as ideias de Alinsky fossem atualizadas, o resultado seria uma revolução social.
No livro Rules for
Radicals, que dedicou a Lúcifer, “o primeiro radical que se rebelou contra
o estamento e (…) conquistou o seu próprio reino”, Alinsky ensinava a
importância de trabalhar dentro do sistema. E que, para realizar qualquer
mudança revolucionária, era preciso, antes de tudo, adotar “uma atitude
passiva, afirmativa e não confrontadora” para produzir uma mudança na sociedade
(p. 15). Isso porque “as pessoas não gostam de sair bruscamente da segurança da
experiência familiar. Elas precisam de uma ponte para fazer a travessia de sua
própria experiência para uma nova. Um militante revolucionário deve sacudir os
padrões vigentes de suas vidas – agitar, provocar desencanto e descontentamento
em relação aos valores atuais, e produzir, se não uma paixão pela mudança, pelo
menos um clima passivo, afirmativo e que não seja confrontador” (p. 18).
Hillary agregou as lições de
Alinsky para realizá-las desde dentro do sistema político. Num artigo para
a National Review, Stanley Kurtz afirmou que a proposta da Nova
Esquerda da qual Hillary fazia parte representava uma mudança de meios, não de fins em relação à estratégia de Alinsky. “A crença de
Hillary nos objetivos de Alinsky, e sua vontade de adaptá-los e adotá-los num
contexto político, mantiveram-se fortes”.
Os instrumentos à disposição
do governo são os meios para, inclusive, modificar a cultura de cima para
baixo. A declaração de Hillary numa conferência sobre feminismo revela
a estratégia: “Os códigos culturais profundamente enraizados, as crenças
religiosas e as fobias estruturais precisam mudar. Os governos devem empregar
seus recursos coercitivos para redefinir os dogmas religiosos tradicionais”.
São esses dogmas que, por exemplo, servem como um obstáculo contra o aborto,
que a candidata do Partido Democrata apoia e usa seu prestígio de forma a
conseguir recursos para a Planned Parenthood, “a maior multinacional do aborto”.
Essa dimensão ideológica já
seria suficiente para afirmar que, se Hillary tivesse conquistado a
presidência, o grande vencedor teria sido, mais uma vez, Saul Alinsky, ambos
inimigos da imaginação moral.
Pode-se questionar se o
compromisso ideológico da juventude não teria já sido rompido por Hillary na
fase adulta ou até mesmo agora, na maturidade. Mas suas posições políticas,
algumas das quais flutuantes a depender do seu objetivo, parecem ser mais uma
prova de que a natureza de suas ações continua fundamentada nos ensinamentos de
Alinsky. Um exemplo simbólico são os vínculos estreitos dela com George Soros,
sobre quem escrevi recentemente aqui na Gazeta do Povo. Soros é
um dos maiores doadores de toda a carreira política de Hillary. Os
documentos vazados pelos sites Wikileaks e DC Leaks no
ano passado mostraram a dimensão do poder e o grau de influência do bilionário
sobre a então candidata e sobre o Partido Democrata. Para ambos, ele destinou
cerca de US$ 25 milhões só para a eleição presidencial de 2017. Um dos emails
vazados revelou que Soros, mediante um representante, enviou instruções a
Hillary, então secretária de Estado do governo Obama, para intervir na política da Albânia, país onde ele tem negócios.
Três dias depois da mensagem, o nome sugerido pelo bilionário, Miroslav Lajcak,
foi enviado pela União Europeia para mediar o conflito entre os rivais
políticos albaneses.
No âmbito da ética, Hillary
não decepciona. Apesar de ter passado a campanha criticando o mercado
financeiro representado por Wall Street, ela recebeu somente em 2013 US$ 3,15
milhões por palestras contratadas por bancos como UBS, Goldman
Sachs, Deutsche Bank e Morgan Stanley. Um levantamento feito pelo Center for
Responsive Politics mostrou que os bancos JPMorgan, Goldman Sachs, Citigroup e
Morgan Stanley estavam entre os maiores doadores de sua campanha para
presidente em 2008. Esses mesmos bancos, representantes legítimos de Wall
Street, foram quatro dos cinco principais doadores durante todo o período em
que Hillary ficou no Senado. Entre 2013 e 2014 Hillary recebeu cerca de US$ 10
milhões por ano por palestras proferidas (incluindo aquelas para outros
segmentos).
Talvez isso explique por que a
elite financeira americana, incluindo investidores como Michael Bloomberg,
Warren Buffet e George Soros, apoia há décadas o Partido Democrata e a própria
Hillary, que, em 2015, apresentou no Senado o tão aguardado plano de reforma do sistema financeiro. O plano foi,
curiosamente, elogiado pelos banqueiros e criticado por Bernie Sanders, seu
ex-adversário na disputa interna do Partido Democrata no ano passado. A forma
como Hillary venceu a nomeação contra Sanders já estava sob suspeita, mas agora
não há mais dúvidas sobre o que, de fato, aconteceu.
Na sexta-feira passada, o
site POLITICO publicou excertos do livro Hacks: The inside story of the
break-ins and breakdowns that put Donald Trump in the White House, de
autoria de Donna Brazile, ex-presidente interina do Comitê Nacional do Partido
Democrata. Nos trechos divulgados, Donna fornece detalhes de uma história que
era conhecida pela metade. Ela afirma que um ano antes da realização das
primárias que a indicaram como candidata, a campanha de Hillary teria fechado
um acordo com a então presidente do Comitê Nacional do Partido Democrata,
Debbie Wasserman, para assumir o controle dos fundos da entidade. Até então, o
padrão era a campanha do candidato assumir o “controle das operações
partidárias e do levantamento de recursos” só depois de ser indicado pelo
partido após votação – não antes – para evitar qualquer tipo de favorecimento.
O objetivo do acordo seria manipular o Comitê para beneficiar a campanha de
Hillary nas primárias. Depois de tê-lo firmado, a campanha da candidata
depositou US$ 10 milhões na conta do partido, que tinha uma dívida de US$ 2
milhões. Donna assumiu a presidência interina logo depois de a então presidente
Debbie Wasserman deixar o Comitê assim que parte da história veio à tona com os
e-mails vazados pelo Wikileaks.
Nos trechos publicados pelo site POLITICO, Donna
afirma que “o acordo de financiamento com Hillary For America [a campanha] e
Hillary Victory Fund [instrumento de recolha de fundos em conjunto com o Comitê
Nacional Democrata] não era ilegal, mas com certeza não foi ético”. Ela ainda
disse que “se a luta tivesse sido justa, uma campanha não teria controle do
partido antes que os eleitores decidissem qual dos candidatos queria para
liderar”. Embora tenha dito não se tratar de “um ato criminoso”, não tinha
dúvida de que “a integridade do partido foi atacada”.
Donna Brazile, porém, não era
uma santa cercada de pecadores. Em outubro do ano passado, ela foi obrigada a
pedir demissão da função de comentarista da CNN, a emissora que apoia a
ideologia, a agenda e os candidatos do Partido Democrata. O motivo foi
ter vazado para a campanha de Hillary, em duas ocasiões,
perguntas que seriam feitas em debates com os candidatos democratas promovidos
pela própria CNN.
No mesmo dia em que os
excertos do livro foram publicados, a senadora Elizabeth Warren “afirmou que as
eleições primárias para a escolha do candidato presidencial democrata de 2016
foram fraudulentas”. Segundo Elizabeth, “o processo eleitoral foi manipulado e
agora cabe aos democratas construir um que realmente funcione e para todos”.
Há vários casos escandalosos e
criminosos envolvendo o nome de Bill e Hillary Clinton (alguns dos mais
importantes, lembrados neste post de Filipe G. Martins), cujo enriquecimento é
algo impressionante até mesmo para os padrões dos Estados Unidos em se tratando
de políticos e não de empreendedores. De casal endividado no ano
2000, quando Bill deixou a presidência, os Clinton amealharam em
15 anos a expressiva fortuna de US$ 200 milhões.
Retomando a pergunta com que
iniciei este artigo, sendo ela quem é e o que ela já fez, difícil acreditar na
inocência ou na ignorância de Hillary Clinton sobre uma questão que lhe dizia
respeito tão diretamente e que definiria o seu futuro político. Mas, porque
Donald Trump está na presidência, ela deve continuar a contar com o apoio e com
a complacência de milionários, investidores, especuladores, intelectuais e
jornalistas dos Estados Unidos, da Europa e do Brasil mesmo diante de todas as
provas existentes contra ela até agora.
Ao contrário do que afirmou
Ruy Barbosa, do mal em política muitas vezes nasce um mal maior.
SAIBA MAIS:
Clinton Cash – A
História Não Contada da Fortuna dos Clinton:
A Wolf in Sheep’s Clothing (“Lobo
em pele de cordeiro”):
Trecho do filme America,
Imagine the world without her (“América, imagine o mundo sem ela”), de
Dinesh D’Souza, sobre Alinsky:
Palestra “Regras para
Radicais: O que conservadores constitucionalistas deveriam saber sobre Saul
Alinsky”, de David Horowitz:
Entrevista concedida por David
Horowitz para Glenn Beck:
Trecho de uma palestra de
Andrew Breitbart sobre Obama e Alinsky:
Saul Alinsky e a Anatomia do Mal, de André Assi Barreto e
Márcio Scansani, livro em fase de financiamento coletivo.
Título e Texto: Bruno Garschagen, Gazeta do Povo, 6-11-2017
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