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Ilustração: Diego Novaes/jornal A Nova Democracia |
Adriano Benayon
Cada vez mais, o nosso País
vai sendo enredado na trama da oligarquia financeira e belicista imperial, cujo
programa, no tocante ao Brasil, é evitar seu desenvolvimento, mantendo-o fraco,
alienado e desarmado para sofrer, sem reação, o saqueio de seus recursos.
Apontei, em artigo recente, algumas das razões pelas quais é muitíssimo
enganosa a comemoração de o Brasil ter, agora, o sexto maior PIB do mundo.
2. Afora o que escondem as
estatísticas, mormente consideradas isoladamente, o PIB quantifica somente a
produção realizada em um país, sem oferecer ideia alguma a respeito de quem
ganha com essa produção, nem quanto às necessidades de quem esta serve.
3. Por exemplo, os minérios
extraídos de nosso subsolo são, em sua esmagadora maioria, destinados ao
exterior, onde entram na produção de bens cujo valor agregado, em termos monetários,
é maior que o dessas matérias-primas, dezenas e até centenas de vezes.
4. Na agropecuária e na
agroindústria, a fabulosa dotação de terras aproveitáveis, de água e de sol
pouco serve à qualidade de vida da grande maioria dos brasileiros, pois, no
mínimo, três quartos das terras são usadas na pecuária extensiva para
proporcionar carne barata aos importadores, e em mais de 70% dos 25% das terras
restantes estendem-se culturas orientadas para a exportação de alimentos e de
matérias-primas. Só a soja ocupa 40% da área cultivada, para fornecer farelo
destinado, quase todo, à alimentação de animais no estrangeiro.
5. Nem mesmo a minoria dos
brasileiros em condições econômicas e culturais para desfrutar de alimentação
saudável, o consegue, porquanto a produção agrícola utiliza, em nível de
recorde mundial, defensivos altamente tóxicos, produzidos por transnacionais estrangeiras.
Estas fornecem, ademais, as sementes transgênicas, que causam a degradação da
agricultura, a dependência e a insegurança nessa área estratégica, e ameaçam a
sobrevivência das abelhas e das espécies vegetais.
6. Entre outros efeitos do
modelo, o saldo das transações correntes do balanço de pagamentos partiu de
resultado positivo, no quadriênio 2004-2007, de US$ 40,2 bilhões, para déficit
US$ 149,2 bilhões de 2008 a 2011, ou seja, houve queda de US$ 189,4 bilhões
(cifras apontadas pelo economista Flávio Tavares de Lyra).
7. Mais: o balanço das
mercadorias ainda teve saldos positivos, em função da colossal quantidade
exportada de bens primários, mas esses saldos são decrescentes. Como são
crescentes os déficits dos balanços de rendas e de serviços (lucros, dividendos
e juros remetidos oficialmente pelas transnacionais), os saldos negativos na
conta corrente aumentam rapidamente.
8. Isso ilustra a
preponderância das empresas com matrizes no exterior nas relações econômicas do
Brasil. De 2008 a 2011, o déficit nos serviços acumulou US$ 99,4 bilhões, e o
das rendas, US$ 256 bilhões.
9. Até há pouco, o balanço de
pagamentos vinha sendo “equilibrado” pelo ingresso líquido de capitais
estrangeiros, um pretenso remédio, que, na realidade, aumenta a doença
estrutural da economia, algo como drogados sentindo alívio ao ingerir mais
tóxicos, incrementando sua dependência.
10. Se, para compensar os
déficits na conta corrente, não for suficiente a soma das entradas líquidas de
investimentos diretos estrangeiros, mais a compra líquida de ações de empresas
locais, o balanço de pagamentos só fecha através de empréstimos e
financiamentos: elevando o endividamento externo. Ou a dívida interna, com os
dólares convertidos em reais pelos aplicadores do exterior para auferir os
juros mais altos do mundo.
11. Tais aplicações podem
tomar o rumo de volta a curto prazo, junto com seus rendimentos mais apreciação
cambial, devido: 1) à iminente nova recaída do colapso financeiro dos bancos no
exterior, a despeito de terem sido socorridos com dezenas de trilhões de
dólares e de euros por seus governos, satélites dos banqueiros; 2) ao efeito
combinado disso com a previsível crise das contas externas, acarretando intensa
fuga de capitais.
12. Isso fará acabar
(temporariamente, pois a maioria das pessoas não gosta de encarar verdades
desagradáveis) com muita ilusão acerca dos “êxitos” da economia brasileira.
Esses, no que têm de real, deveram-se à exuberância dos recursos naturais e à
capacidade de trabalho de muitos brasileiros e estrangeiros aqui radicados.
Entretanto, o modelo dependente e entreguista impede o Brasil de colher os
frutos dessas vantagens.
13. Na realidade, as crises, a
estagnação, se não a decadência, no longo prazo, são consequências necessárias
da estrutura econômica caracterizada pela desnacionalização, pela concentração
e pela desindustrialização.
14. As três foram sendo
implantadas segundo o modelo inculcado pelo império financeiro mundial nas
mentes crédulas e/ou corrompidas de pseudo-elites e de classes médias
subordinadas, resultando na deterioração estrutural, que se agrava
continuadamente.
15. Neste momento, em que o
“governo” petista leva adiante mais privatizações, é perda de tempo dar atenção
às críticas do PSDB, que, quando esteve no “comando” da União Federal, de 1995
a 2002, fez que esta desse enorme salto qualitativo para o abismo, com
privatizações em massa, grandemente danosas para o Brasil.
16. Ocioso também gastar tempo
com as “justificações” dos petistas, cujos “governos” de 2003 até hoje (mais de
nove anos), além de jamais terem tratado de corrigir o desastre estrutural
intensificado pelos tucanos, vem-lhe adicionando mais medidas prejudiciais ao
interesse nacional.
17. Conforme listagem
formulada por Maria Lucia Fattorelli, coordenadora da Auditoria Cidadã da
Dívida, o governo do PT acumula as seguintes privatizações:
a) previdência dos
servidores públicos (projeto do Executivo, por ser transformado em Lei no
Congresso);
b) jazidas de petróleo, incluso o pré-sal (cujo marco regulatório
foi alterado a gosto do cartel anglo-americano);
c) aeroportos mais rentáveis
do País;
d) rodovias;
e) hospitais universitários;
f) florestas;
g) saúde,
educação e segurança.
18. Claro que - à exceção do
1º e do 3º item supra -, essas áreas já vinham sendo privatizadas em “governos”
anteriores. Entretanto, não há como ignorar que o Executivo Federal e sua base
parlamentar têm dado prosseguimento à radicalização do modelo entreguista, cuja
primeira oficialização remonta ao golpe de 1954, resultado de conspiração que
resultou na derrubada do Presidente Getúlio Vargas, urdida e executada por
serviços secretos estrangeiros com apoio da 5ª coluna local.
19. É verdade que, mesmo
enquanto Vargas foi presidente, já eram muito fortes as pressões e a influência
das potências anglo-americanas sobre o Brasil, e ele, mais cauteloso que ousado
e revolucionário, fraquejou em momentos decisivos, quando a única saída, já em
1952, seria o contra-ataque, inclusive alijando do Exército os principais
oficiais simpáticos àquelas potências ou por elas cooptados.
20. Naquele ano, o ministro
das Relações Exteriores e o chefe do Estado-Maior das FFAA negociaram acordo
militar com os EUA, sem o conhecimento do ministro da Guerra, que se demitiu,
quando Vargas consentiu com esse acordo. O presidente começou, então, a perder
sua base militar e ser posto na defensiva pelos artífices da conspiração.
21. Por que fazer referência
ao golpe de 24 de agosto de 1954 como marco do modelo que gradualmente
espatifou o que restava de independência nacional? Porque, 20 dias depois,
foram baixados regulamentos, como a Instrução 113 da SUMOC (nas funções de
Banco Central), os quais permitiram que as subsidiárias das transnacionais importassem
máquinas e equipamentos amortizados no exterior, mais que sucatados após mais
de dez anos de uso, e o registrassem como investimento em moeda estrangeira,
com altos valores.
22. Inaugurava-se assim a
política de subsidiar as empresas estrangeiras e de tornar praticamente
impossível a permanência no mercado de empresas brasileiras por muito tempo. Os
subsídios foram sendo, por vezes substituídos e, em geral, acumulados.
23. JK não fez revogar
quaisquer medidas do governo udeno-militar instalado com o golpe de 1954 e,
ainda por cima, criou vantagens especiais para “incentivar os investimentos
estrangeiros”. Em 1964/66 o czar da economia do presidente militar eleito pelo
Congresso, com a colaboração de JK, após o novo golpe, Roberto Campos, deu
grande impulso ao desbaratamento da indústria de capital nacional.
24. Apavorada pelo espantalho
do comunismo, grande parte da classe média e dos militares deixou-se manipular
pelo falso maniqueísmo da Guerra Fria, caindo nos braços do império
anglo-americano. Em consequência, a desnacionalização e a concentração
cresceram vertiginosamente até os dias de hoje.
25. De fato, nem sequer os
dirigentes militares menos alinhados com os EUA, e menos ainda, os do regime
instalado - sob a supervisão dos serviços secretos estrangeiro, durante e após
a transição para a pseudo-democracia - trabalharam por conter a concentração
econômica, nas mãos, cada vez mais, das transnacionais.
26. Assim, a estrutura
econômica dos anos 90 em diante já era outra bem diferente da dos anos 50,
quando ainda o voto popular não era totalmente teleguiado pelo dinheiro e pela
grande mídia, a serviço dos concentradores, nem existiam redes de TV. Atualmente,
os partidos políticos, quase todos, estão a serviço das transnacionais ou de
bancos estrangeiros e locais.
27. Até 1964, o voto popular,
que favorecia Vargas e seus seguidores, foi frustrado pelas intervenções a
mando do estrangeiro, com a desestabilização de governos eleitos, apoiada pela
grande mídia e fomentada pelas transnacionais e pelos governos dos países
hegemônicos. Ou seja pelas “democracias ocidentais”, as quais, como hoje está
claríssimo, nada tinham de democráticas e, agora, descambam para o estado
policial internamente e para ostensivas e brutais agressões imperiais no
exterior. JK foi o único que, eleito pelo voto popular, terminou seu mandato.
Mas por quê? O dito no parágrafo 23 explica.
28. Ao longo dos governos
militares, embora tenham sido cassados e afastados muitos nacionalistas das
FFAA, não se cuidara de privatizações, e foram criadas novas estatais. Entretanto,
nem mesmo após o primeiro daqueles governos, claramente pró-EUA, houve reversão
das políticas favorecedoras das transnacionais e cerceadoras das empresas
privadas de capital nacional.
29. Por isso, os “milagres” de
JK e de alguns governos militares (altas taxas de crescimento do PIB),
mostraram-se falsos e redundaram na explosão da dívida externa, no final dos anos
70, seguida da inadimplência em 1982, ficando o País à mercê dos fraudulentos
credores externos.
30. Sem lideranças
revolucionárias capazes de entender o desastre estrutural da economia e de
lutar por revertê-lo, o Brasil submeteu-se aos famigerados planos Baker e Brady
e ao Consenso de Washington. A Constituição de 1988 foi fraudada para
privilegiar o serviço da dívida, o que levou a pagamentos astronômicos e,
apesar deles, ao crescimento exponencial da dívida interna.
31. Seguiram-se privatizações
sob o ridículo pretexto de obter recursos para o pagamento das dívidas, num
processo em que o País gastou centenas de bilhões de reais para alienar
patrimônios fantásticos. É isso que está sendo reativado agora, e não nos
admira, pois, se FHC teve por meta destruir o que ficou da Era Vargas, o PT foi
criado para dividir os trabalhadores, com mais um partido, este pretensamente
de resultados, simpático às transnacionais e desprovido de consciência
nacional.
Título e Texto: Adriano
Benayon, doutor em economia e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento, editora Escrituras/SP.
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