segunda-feira, 4 de junho de 2012

A boa austeridade

André Abrantes Amaral
A par da austeridade má que prejudica as pessoas, existe uma boa que recai sobre o Estado e o reduz à sua essência. Esta última é a que devemos exigir.
Nos últimos tempos não temos distinguido entre dois tipos possíveis de austeridade: uma primeira imposta pelo governo à economia privada, aquela que paga os serviços públicos, e uma segunda que recai sobre o próprio Estado e o governo. Foi por não termos feito esta distinção que têm surgido políticos que se auto-titulam contra a austeridade que implica impostos altos e cortes nos salários, ao mesmo tempo que defendem uma política de crescimento económico, baseada num crescimento da actividade do Estado. Apostando precisamente naquela entidade que está a gastar mais do que devia e que, por se ter endividado acima das suas capacidades, tem levado a que nos emprestem dinheiro a juros que só conseguimos pagar com os elevados impostos que o governo nos está a cobrar.
De acordo com o artigo de um ex-assessor do presidente Reagan, David Malpass, publicado no “Wall Street Journal” em 25 de Maio último, apesar da austeridade que está a ser aplicada na Itália, a despesa do Estado crescerá de 50% do PIB em 2011, para 50,7% em 2012. Na Grécia, onde agora se afirma ser preciso menos austeridade e mais investimento público para incentivar a economia, a despesa do Estado passou de 49,6% do PIB em 2010, para 49,7% em 2011. Ou seja, apesar da dita austeridade, o Estado cresceu, gastou mais e tem pedido mais dinheiro emprestado. Dinheiro que, para ser pago, obriga a que se exija mais impostos aos cidadãos. Ou seja, mais austeridade. Estes dados mostram- -nos como é indispensável distinguir entre a austeridade que é imposta pelo governo às pessoas e a que governo impõe ao Estado. Só se fizermos esta distinção, escaparemos ao truque dos que pretendem aumentar o poder do Estado para fazer crescer a economia. Só dessa forma evitaremos o círculo vicioso de carregar na austeridade, pagando mais impostos de forma a que o Estado tenha mais dinheiro para nos dar e, assim, reduzir a dita austeridade. Algo tão incongruente que me espanta que ainda haja quem acredite neste tipo de milagres.
De acordo com o mesmo artigo, os governos estão a impor demasiada austeridade aos cidadãos ao mesmo tempo que fogem dela. Um exemplo muito simples é este: quando há menos dinheiro, qualquer pessoa no seu perfeito juízo, reduz as despesas. Gasta menos, compra menos. Corta nas férias e, sempre que necessário, nas viagens. No entanto, e ao contrário de qualquer cidadão, o que fez o presidente da República? Viajou à Indonésia, Timor e à Austrália. Será que uma viagem com estas características justifica o gasto envolvido? O mesmo se diga sobre as reformas estruturais do Estado que ainda não foram feitas. Quantos serviços públicos já foram extintos? Quantos institutos, organismos públicos, cuja actividade não justifica o custo e prejudica os privados na prossecução dos seus negócios, se mantêm em actividade? Todos sabemos que o país não tem capacidade de pagar tantos funcionários públicos que, por muito bons que sejam, não são necessários em tão grande número. A pergunta é: quantos já foram despedidos? Nenhum. Porquê? Porque o governo não tem coragem de se incompatibilizar com quem raramente falha uma eleição, votando.
É esta falta de coragem aliada a uma vontade de ter um Estado gastador que permita o exercício de um poder forte a que o detém, que nos quer convencer que só há uma austeridade possível: aquela que é imposta às pessoas. Que nos quer fazer crer existirem apenas duas alternativas: ou mais impostos ou mais Estado. Nunca, entre mais Estado e menos impostos. É este dogma ideológico que faz os nossos políticos defenderem o crescimento, não baseado na redução da despesa pública e, naturalmente, dos impostos, mas no incremento da actividade do Estado. Simplificando: os governantes não querem emagrecer o Estado porque não querem perder poder. Os tempos de crise exigem que questionemos o que nos dizem e o que pretendem de nós. Compreender é melhor que aceitar. Porque no meio da incerteza há muita gente a querer levar a água ao seu moinho.
Título e Texto: André Abrantes Amaral, jornal “i

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