André Abrantes Amaral

Nos últimos tempos não temos
distinguido entre dois tipos possíveis de austeridade: uma primeira imposta
pelo governo à economia privada, aquela que paga os serviços públicos, e uma
segunda que recai sobre o próprio Estado e o governo. Foi por não termos feito
esta distinção que têm surgido políticos que se auto-titulam contra a
austeridade que implica impostos altos e cortes nos salários, ao mesmo tempo
que defendem uma política de crescimento económico, baseada num crescimento da
actividade do Estado. Apostando precisamente naquela entidade que está a gastar
mais do que devia e que, por se ter endividado acima das suas capacidades, tem
levado a que nos emprestem dinheiro a juros que só conseguimos pagar com os
elevados impostos que o governo nos está a cobrar.
De acordo com o artigo de um
ex-assessor do presidente Reagan, David Malpass, publicado no “Wall Street
Journal” em 25 de Maio último, apesar da austeridade que está a ser aplicada na
Itália, a despesa do Estado crescerá de 50% do PIB em 2011, para 50,7% em 2012.
Na Grécia, onde agora se afirma ser preciso menos austeridade e mais
investimento público para incentivar a economia, a despesa do Estado passou de
49,6% do PIB em 2010, para 49,7% em 2011. Ou seja, apesar da dita austeridade,
o Estado cresceu, gastou mais e tem pedido mais dinheiro emprestado. Dinheiro
que, para ser pago, obriga a que se exija mais impostos aos cidadãos. Ou seja,
mais austeridade. Estes dados mostram- -nos como é indispensável distinguir
entre a austeridade que é imposta pelo governo às pessoas e a que governo impõe
ao Estado. Só se fizermos esta distinção, escaparemos ao truque dos que
pretendem aumentar o poder do Estado para fazer crescer a economia. Só dessa
forma evitaremos o círculo vicioso de carregar na austeridade, pagando mais
impostos de forma a que o Estado tenha mais dinheiro para nos dar e, assim,
reduzir a dita austeridade. Algo tão incongruente que me espanta que ainda haja
quem acredite neste tipo de milagres.
De acordo com o mesmo artigo,
os governos estão a impor demasiada austeridade aos cidadãos ao mesmo tempo que
fogem dela. Um exemplo muito simples é este: quando há menos dinheiro, qualquer
pessoa no seu perfeito juízo, reduz as despesas. Gasta menos, compra menos.
Corta nas férias e, sempre que necessário, nas viagens. No entanto, e ao
contrário de qualquer cidadão, o que fez o presidente da República? Viajou à
Indonésia, Timor e à Austrália. Será que uma viagem com estas características
justifica o gasto envolvido? O mesmo se diga sobre as reformas estruturais do
Estado que ainda não foram feitas. Quantos serviços públicos já foram extintos?
Quantos institutos, organismos públicos, cuja actividade não justifica o custo
e prejudica os privados na prossecução dos seus negócios, se mantêm em
actividade? Todos sabemos que o país não tem capacidade de pagar tantos
funcionários públicos que, por muito bons que sejam, não são necessários em tão
grande número. A pergunta é: quantos já foram despedidos? Nenhum. Porquê?
Porque o governo não tem coragem de se incompatibilizar com quem raramente
falha uma eleição, votando.
É esta falta de coragem aliada
a uma vontade de ter um Estado gastador que permita o exercício de um poder
forte a que o detém, que nos quer convencer que só há uma austeridade possível:
aquela que é imposta às pessoas. Que nos quer fazer crer existirem apenas duas
alternativas: ou mais impostos ou mais Estado. Nunca, entre mais Estado e menos
impostos. É este dogma ideológico que faz os nossos políticos defenderem o
crescimento, não baseado na redução da despesa pública e, naturalmente, dos
impostos, mas no incremento da actividade do Estado. Simplificando: os
governantes não querem emagrecer o Estado porque não querem perder poder. Os
tempos de crise exigem que questionemos o que nos dizem e o que pretendem de
nós. Compreender é melhor que aceitar. Porque no meio da incerteza há muita
gente a querer levar a água ao seu moinho.
Título e Texto: André Abrantes Amaral, jornal “i”
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