Reinaldo Azevedo
Já recomendei o livro algumas
vezes e volto a fazê-lo. Leiam “Fascismo de Esquerda” (Editora Record), do
jornalista americano Jonah Goldberg. Ele evidencia como as esquerdas, nos EUA
(lá, chamam-se “liberais” — não confundir com o “liberalismo” como doutrina do
livre mercado), tentam cercear o debate, promovendo uma verdadeira guerra
cultural — prática herdada de totalitarismos d’antanho — para silenciar o
“inimigo”. Nos EUA, demonstra-o a campanha eleitoral em curso, essas forças são
menos bem-sucedidas do que por aqui.
Li há pouco nos sites
noticiosos que o presidente do PT, Rui Falcão, acusa o tucano José Serra de
disseminar o “ódio” — nada menos! — na campanha eleitoral. O espantoso não é
que diga isso, já que espero de Falcão rapinagens teóricas ainda mais
grosseiras. O espantoso é que lhe deem trela e julguem que isso é notícia.
Referindo-se ao julgamento do mensalão no Supremo, este senhor afirmou que tudo
não passava de uma reação da “elite suja e reacionária”. Ele se referia apenas
ao Poder Judiciário. Às vésperas da instalação da CPI do Cachoeira — da qual o
PT e PMDB saíram correndo para não investigar a Delta e os “cachoeiras” de mais
elevada estirpe que estão fora de Goiás —, o presidente do PT gravou um vídeo
em que afirmou: “As bancadas do PT na Câmara e no Senado defendem uma CPI para
apurar esse escândalo dos autores da farsa do mensalão”. Estrelas do seu
partido estão por aí a pregar uma “reação” — QUAL SERÁ? — ao Supremo. Eis
Falcão! Um homem sem ódio no coração!
Guerra de valores
Vamos pensar um pouquinho. Quem é que se dedica já há anos — e cada vez com mais ênfase — a promover uma guerra de valores na sociedade entre “conservadores” e “progressistas”? Quem é que se empenha com dedicação a dividir a sociedade em vez de uni-la? Na ofensiva, o esquerdismo significa cotas raciais, integrar a cultura gay à cultura predominante, apagar da praça pública os símbolos do cristianismo e um sem-número de ambições explicitamente culturais. Isso que escrevi em negrito, caros leitores, é trecho do livro de Goldberg. Ele se refere aos EUA. Parece falar sobre o Brasil. Só troquei a palavra “liberalismo” (empregada pelo autor) por “esquerdismo” para não confundir os registros. Entre nós, “liberalismo” quer dizer necessariamente outra coisa.
Vejam o caso do tal kit gay.
Não se trata, é evidente, de demonizar este ou aquele grupo ou de negar que
possa haver manifestações de preconceito. Ocorre que, quando se escolhe fazer
um kit como aquele, faz-se a opção por uma abordagem também política. Trata-se
de uma escolha. Como tal, pode — e deve — estar submetida ao crivo crítico, às
contraditas, aos argumentos contrários. Não para os “fascistas de esquerda”.
Marcelo Coelho, articulista de Folha — de quem discordo quase sempre, mas em
quem não tinha vislumbrado até agora o viés intolerante —, escreveu em seu blog
o seguinte: “Se alguém acha errado isso, e julga poder tirar votos de
Haddad falando do ‘kit gay’ sem ter visto os vídeos, está cometendo um ato de
desumanidade e sordidez”. Logo, só é possível dar provas de humanidade
e decência concordando com Coelho e com os defensores do kit gay.
Alguém poderia, julgando
apressadamente que me pegou, observar: “Calma lá, Reinaldo! Ele está se
referindo às pessoas que condenaram os filmes sem ver…”. Pois é. E se eu lhes
disser que a coisa fica ainda pior? Coelho está tão certo de que não se pode
pensar o contrário do que ele pensa e, ainda assim, ser humano e decente que
não conta com a possibilidade de que alguém possa ver os filmes e reprová-los.
Para ele, assistir aos vídeos implica necessariamente aprová-los, sob pena de a
pessoa ser excomungada do mundo dos humanos e decentes.
Chamam a isso tolerância e
democracia.
Quem é que está sempre no
ataque quando o assunto é a guerra cultural? São os ditos “conservadores”? Acho
que não… Quando, depois de aprovar cotas raciais obrigatórias nas universidades
federais, a presidente Dilma demonstra a disposição de fazer o mesmo com o
funcionalismo público, cumpre perguntar: é para unir a sociedade brasileira que
ela o faz? Não é preciso ser muito esperto (bastam algumas sinapses do nível
Massinha I de Lógica Elementar) para vislumbrar que o próprio conceito da
representação democrática — um homem, um voto — passou a correr risco. Afinal,
nada mais justo, então, do que exigir que a maior de todas as representações
democráticas, o Congresso, passe a espelhar a dita composição racial da
sociedade brasileira — como se raça existisse… O mesmo espírito de porco que
seria tentado a me pegar acima poderia se manifestar de novo: “Ora, Reinaldo,
se cada um votasse em alguém da sua cor, teríamos a relação um homem/um voto do
mesmo modo”. Ainda que isso não implicasse questões bem mais complexas num
sistema proporcional como o nosso, notem que a vontade do eleitor teria sido
suprimida, uma vez que ele estaria obrigado a votar em alguém pertencente a seu
grupo. Imaginem filas de negros para votar em urnas de candidatos negros; de
brancos, em candidatos brancos e assim por diante…
Não ocorre aos fascistas de
esquerda que aqueles a que chamam “conservadores”, “reacionários” ou
“direitistas” têm um outro conteúdo e uma outra pauta, legitimados pela
pluralidade democrática, para a luta por justiça, por exemplo. Em que cânone,
ditado pelos céus, está escrito que o combate ao preconceito contra
homossexuais, mulheres ou negros passa necessariamente pela agenda dos grupos
militantes? Que determinação da natureza nos informa que a afirmação de
identidade é o melhor caminho da integração, especialmente quando a concessão
de um direito a uma dita minoria pode implicar a supressão de direitos que são
universais — como a efetiva igualdade perante a lei, por exemplo?
Isso tem teoria
A cultura liberal brasileira é frágil — refiro-me ao liberalismo propriamente, aquele do livre mercado e dos direitos individuais. As vozes hegemônicas hoje da política são herdeiras, bem ou mal, do marxismo, ainda que possam estar distantes da teoria; em muitos casos, há mesmo ignorância de causa, repetindo conteúdos cuja origem ignoram. Os marxistas há muito desistiram do socialismo, como se sabe, mas não da perspectiva autoritária da engenharia social.
Se vocês recorrerem ao
arquivo, encontrarão dezenas de textos em que trato de Gramsci, o mais
importante teórico, na modernidade, da guerra cultural. Os espaços de debate,
inclusive os da imprensa, foram sendo paulatinamente ocupados pelos militantes
da tal “agenda progressista”. Chamam de diversidade e de progresso social a
imposição de sua agenda.
De volta à religião
O que mais mobiliza a reação de alguns boçais nas redações é o fato de a crítica ao kit gay — como era a crítica à descriminação do aborto — ter, sim, um fundamento religioso. E por que não poderia? “Porque o estado é laico”, poderia responder alguém. É verdade! Por laico, então está obrigado a tolerar as críticas dos religiosos — ou estaríamos falando de um estado fundamentalista ateu, que consideraria ilegítima qualquer restrição de natureza religiosa.
Note-se que a grita havida em
2010 contra as críticas que católicos dirigiam a Dilma por causa de sua opinião
favorável ao aborto estava menos relacionada ao suposto direito de escolha da
mulher do que ao fato de que a raiz da restrição era religiosa. Entenderam o
ponto? Os esquerdistas pró-aborto estavam menos preocupados em garantir o que
chamavam de “um direito da mulher” do que em calar a boca dos crentes. Fenômeno
semelhante de vê agora com o kit gay. Querem saber? Esses fascistas de esquerda
não estão nem aí para os direitos dos homossexuais. Eles querem mesmo é calar
os cristãos — é isso que não toleram.
Mas chamam a isso democracia e
tolerância.
E, nesse caso, é preciso, sim,
recuperar um pouco da história. Reproduzo um trecho de “O Fascismo de
Esquerda”. Goldberg lembra que Hitler era furiosamente anticristão. Leiam.
Volto para encerrar.
(…)
Sob o poder progressista, o Deus cristão havia sido transformado num oficial ariano da SS tendo Hitler como seu braço direito. Os chamados pastores cristãos alemães pregavam que “assim como Jesus havia liberado a humanidade do pecado e do inferno, Hitler salva o Volk alemão da decadência”. Em abril de 1933, o Congresso Nazista de Cristãos Alemães deliberou que todas as igrejas deveriam catequizar que “Deus me criou como um alemão; o germanismo é uma dádiva de Deus. Deus quer que eu lute pela Alemanha. O serviço militar de forma alguma ofende a consciência cristã, mas é obediência a Deus”
Sob o poder progressista, o Deus cristão havia sido transformado num oficial ariano da SS tendo Hitler como seu braço direito. Os chamados pastores cristãos alemães pregavam que “assim como Jesus havia liberado a humanidade do pecado e do inferno, Hitler salva o Volk alemão da decadência”. Em abril de 1933, o Congresso Nazista de Cristãos Alemães deliberou que todas as igrejas deveriam catequizar que “Deus me criou como um alemão; o germanismo é uma dádiva de Deus. Deus quer que eu lute pela Alemanha. O serviço militar de forma alguma ofende a consciência cristã, mas é obediência a Deus”
Quando alguns bispos
protestantes visitaram o Führe rpara registrar queixas, a fúria de Hitler chegou
ao extremo. “O cristianismo desaparecerá da Alemanha assim como aconteceu na
Rússia… A raça alemã existiu sem cristianismo durante milhares de anos… e
continuará depois que o cristianismo tiver desaparecido… Precisamos nos
acostumar com os ensinamentos de sangue e raça.” Quando os bispos fizeram
objeções a apoiar os propósitos seculares do nazismo, e não apenas suas
inovações religiosas, Hitler explodiu: “Vocês são traidores do Volk. Inimigos
da Vaterland e destruidores da Alemanha”
Em 1935, foi abolida a prece
obrigatória nas escolas e, em 1938, cânticos e peças de Natal foram totalmente
proibidos. Em 1941, a instrução religiosa para crianças acima de 14 anos havia
sido completamente abolida, e o jacobinismo reinava supremo. Uma canção da
Juventude Hitlerista ecoava nos acampamentos:
Somos a alegre Juventude
Hitlerista.
Não precisamos de virtudes cristãs,
Pois Adolf Hitler é nosso intercessor
E nosso redentor.
Nenhum padre, ninguém maléfico
Pode nos impedir de nos sentirmos
Como filhos de Hitler.
A nenhum cristo seguimos,
Mas a Horst Wessel!
Fora com incensos e pias de água benta!
Não precisamos de virtudes cristãs,
Pois Adolf Hitler é nosso intercessor
E nosso redentor.
Nenhum padre, ninguém maléfico
Pode nos impedir de nos sentirmos
Como filhos de Hitler.
A nenhum cristo seguimos,
Mas a Horst Wessel!
Fora com incensos e pias de água benta!
Encerro
O que vai acima faria muitos de nossos supostos militantes do laicismo babar de satisfação, não é mesmo? Afinal, estamos no país em que uma ministra de Estado (Marta Suplicy), que ganhou o cargo na boca da urna como paga por sua adesão a uma campanha eleitoral, decretou que Lula, que não tem vocação para Cristo, é o próprio Deus.
Os fascistas de esquerda estão
assanhados. Ou você está com eles, ou eles decretam que você é desumano e
sórdido. E nós sabemos o que eles fazem com desumanos e sórdidos, não é? O
ataque organizado a cristãos, católicos e evangélicos, sob a pele de suposto
progressismo e de amor à tolerância, é só obscurantismo e fascismo. De
esquerda, sim! Como é, em essência, qualquer fascismo.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, 16-10-2012
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