quinta-feira, 23 de novembro de 2023

O PSD (e os outros) que se ponham a pau

Henrique Pereira dos Santos

O título deste post sou eu a parafrasear um amigo que conhece bem a política dos Países Baixos e com quem troquei umas mensagens sobre o resultado das eleições por lá (na verdade, o que me disse foi que o Chega! lá do sítio tinha ganho as eleições, o PSD que se ponha a pau).

Há anos que a esquerda toda, e a direita bem-comportada, agita o papão da extrema-direita, globalmente, tratando as vitórias de Trump, Bolsonaro etc., incluindo agora Milei, na Argentina, como excentricidades de eleitores deploráveis.

Um editorial do Público, a propósito das eleições argentinas, dizia que o país estava à beira do abismo e os eleitores tinham resolvido saltar para o vazio, numa demonstração, que me parece clara, de incompreensão da realidade: é mais provável que os eleitores argentinos se sintam no abismo e votem em qualquer coisa que lhe permita sonhar com a hipótese de sair de lá.

À medida que os tais "fascistas" vão chegando ao poder, mas não o fascismo – estes fascistas até já vão saindo democraticamente do poder, quando perdem eleições, como na Polónia –-, a ameaça infantil do "está uma velha num canto, ó Zé, que te leva se te apanha" vai perdendo eficácia e a tal extrema-direita vai ganhando peso nos eleitorados (em especial nos grupos sociais de deserdados que o jornalismo atual resolveu esquecer).

E vai ganhando peso porque fala de assuntos de que o mainstream tem medo de falar, como no caso dos dois exemplos que vou dar.

Uma das propostas dos ganhadores nos Países Baixos é a construção de duas centrais nucleares.

A energia nuclear, há uns anos, era um tema eleitoral sério e foi uma das alavancas para o crescimento dos Verdes, na Alemanha, mas com as ameaças das alterações climáticas a ultrapassarem, em larga escala, os piores cenários de desastre nuclear, é natural que cada vez mais gente se pergunte se faz sentido uma travagem forçada, paga pelos mais pobres, como sempre, ou investir em energia nuclear.

É bem possível que a questão nuclear volte a ganhar peso eleitoral, mas agora no sentido inverso.

"Because the Netherlands is no longer the Netherlands. We see it all around us. Our country is overcrowded. Our neighbourhoods and cities often unrecognisable with much nuisance and crime. We have to conquer back. Closing our borders to even more fortune seekers from other cultures is necessary to do so. And real refugees should no longer received here, but in their own region. Discrimination against Dutch nationals must also end. It is our country, after all. Why do status holders get priority on our scarce housing? That has to stop. And our money must also go to our own people."

Isto é parte do que defende o partido mais votado nos Países Baixos e não vale a pena argumentar com adjetivos, como xenófobos e racistas, como se a questão nacional não estivesse de volta em todo o lado e se as pessoas comuns não sentissem o que de facto sentem.

Pode-se acusar quem quiser de não ter coração, de ser racista, de ser xenófobo, mas é bem mais difícil fazer desaparecer o incômodo quotidiano das pequenas diferenças que fazem com que as pessoas não se reconheçam na comunidade.

E na altura de votar, esse incômodo estará presente, mas os nossos adjetivos não.

Os partidos de centro fogem como o diabo da cruz destas questões fraturantes, a energia nuclear e as migrações são questões fraturantes a que os partidos políticos do meio têm medo de dar respostas políticas, para evitar a perda de alguns votos.

Com a extrema esquerda (em Portugal inclui o BE, o PC e Pedro Nuno Santos) às contas com os fantasmas da sua história, falando de problemas de minorias ultraminoritárias e evitando encarar as pessoas tal como elas são, o que sobra para dar esperança, qualquer esperança, é o que vai crescer eleitoralmente.

O papel dos partidos é dar esperança de forma convincente.

Se uns falharem nisso, outros ocuparão o espaço eleitoral disponível.

Se não for nessas eleições, será noutras mais à frente.

Título e Texto: Henrique Pereira dos Santos, Corta-fitas, 23-11-2023 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-