sábado, 5 de outubro de 2024

Política e Comunicação Social

Henrique Neto

Em Portugal a política e a comunicação social vivem de tal forma dependentes que não podem viver uma sem a outra. O que deixa de fora todo o pensamento sobre as grandes questões que influenciam o futuro dos portugueses e do resto do globo.

Como sempre, prefiro a pedagogia dos exemplos como a melhor via de demonstrar aquilo que penso e deixo aqui mais alguns desses exemplos, pouco ou nada tratados na comunicação social. 

Democracia

Portugal está longe de ser uma democracia, basta o exemplo dos deputados serem escolhidos pelas direções partidárias e não pelos eleitores, para que a democracia portuguesa seja uma miragem.

Esta tem sido a base do poder discricionário dos partidos, porque os deputados escolhidos têm como objetivo principal a fidelidade a quem os escolheu e pode mandá-los para casa no final do mandato.

Como é óbvio, trata-se de uma limitação fundacional do funcionamento democrático da atividade política portuguesa. 

Ideologia

Domina toda a política e toda a comunicação social através de padrões pré-estabelecidos, o que conduz a que grande parte do debate existente na sociedade portuguesa e potenciado pela comunicação social seja de base ideológica, e que a generalidade das notícias e dos comentadores sejam escolhidas e escolhidos por corresponderem às ideologias das direções políticas e editoriais.

(Noutras palavras, como tantas vezes por mim escrito: são militantes político-partidários, não jornalistas).

Economia

Em Portugal, o crescimento econômico está estagnado há mais de vinte anos em relação a todos os países da União Europeia, mas o debate, fortemente influenciado pelas diferentes ideologias, passa ao lado de quaisquer análises sérias das causas.

Por exemplo, as pequenas e médias empresas são muito elogiadas e preferidas pelos governos e pela imprensa, quando, de fato, o seu número excessivo de mais de 90% de todas as empresas portuguesas é ignorado, ainda que a falta de maior número de empresas de alguma dimensão e de maior crescimento, nomeadamente na indústria, esteja na base do fraco crescimento da economia.

Ética

A ausência de conceitos éticos na política e em muitos meios de comunicação é por demais evidente, e a mentira circula livremente.

Um exemplo entre muitos: apesar do governo espanhol ter anunciado recentemente mais investimentos na ferrovia de bitola europeia no valor de 17 mil milhões de euros, nomeadamente no corredor Mediterrânico, onde reside a maioria da economia espanhola, o administrador da empresa pública IP, Carlos Fernandes, afirmou com a maior naturalidade a seguinte pérola: “que a Espanha começou a fazer a migração para bitola europeia, mas já não está a fazer e não tem planos para a mudança nas próximas décadas, pelo que, se Portugal adotasse a bitola europeia, os comboios chegariam à fronteira e paravam”.

Igual ausência de valores éticos reside no fato do ministro Pinto Luz aceitar as mentiras da IP, e a mídia silenciar esta óbvia mentira.

Sabedoria

Os melhores especialistas e mais reputados acadêmicos portugueses em áreas como a economia, a energia, a saúde, a justiça e a administração pública, raramente surgem na generalidade dos meios de comunicação. Em seu lugar abundam os especialistas de sofá que falam de tudo e de mais um par de botas com a naturalidade dos grandes conhecedores.

Muitos deles em programas risíveis que sobrevivem há muitos anos e que atravessam os diversos poderes políticos através da mudança da cor política de um ou de mais participantes.

Futurologia

Portugal não tem, ou sequer debate, uma qualquer estratégia orientadora do nosso futuro como Nação, mas nos jornais e nas televisões não faltam diariamente opiniões sobre os mais diversos futuros de Portugal, cada um deles alinhado com as ideologias dominantes nas redações.

Trata-se, por vezes, de um jogo de sombras, onde a análise do futuro como disciplina modernamente determinante está ausente.

Uma experiência: em 2003 participei com o professor Veiga Simão na elaboração de uma síntese estratégica sobre o futuro de Portugal, que foi publicada com a Carta Magna da AIP (Associação Industrial Portuguesa) e olimpicamente desconhecida pela maioria dos meios de comunicação ao longo de vinte e um anos.

Apatia

A ausência de participação democrática da grande maioria dos portugueses, em que uma das bases reside nas leis eleitorais, bem visível no escasso número de votantes em cada eleição, serve bem os diferentes partidos e ideologias, à custa do progresso e do desenvolvimento do país.

Um exemplo: segundo as últimas notícias, o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, está atento à possibilidade de o Almirante Gouveia de Melo pretender se candidatar ao Palácio de Belém e intenta usar a sua condição militar para dificultar essa possibilidade. (Não entendi quem intenta, se Marcelo ou Gouveia de Melo).

Vários meios de comunicação deram a notícia, mas, que eu tenha tido conhecimento, nenhum falou ou escreveu dobre a imoralidade política de tal possibilidade, para mais de um presidente dito de todos os portugueses. Igualmente, a comoção pública inexistiu.

Demografia

As famílias portuguesas tardam em ter filhos e as dificuldades da vida em Portugal não ajudam. Muitos jovens saídos das universidades, ditos os mais qualificados de sempre, abandonam o país, mas não há problema, abrem-se as fronteiras sem limite e sem critério como solução. A preocupação de que as baixas qualificações reduzam ainda mais a produtividade nacional não existe.

Assim vai a política portuguesa sem destino certo que não seja a cauda da União Europeia. Mais de vinte anos de estagnação econômica e uma i9nvariável fuga à realidade e à verdade, com partidos políticos e governos incapazes de olhar e de compreender os grandes desafios nacionais e internacionais.

Além de um presidente da República entretido em malandrices e em fotografar o país. 

Título e Texto: Henrique Neto, O Diabo, nº 2492, 4-10-2024; Digitação e Marcações: JP, 5-10-2024

Henrique Neto na Wikipédia

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