Gil Nunes
O FC Porto jogou bem melhor diante do Manchester United do que frente ao Hoffenheim mas empatou o primeiro jogo e venceu o segundo. Qual o segredo? Acima de tudo, a análise do contexto e a completa percepção de que a equipa fica mais equilibrada se for edificada de trás para a frente. Menos brilhante, mas também menos turbulenta. Três pontos e um pequeno balão de oxigénio na Liga Europa. Que era obrigatório. Força da classificação.
É certo que uma equipa grande
não pode enveredar pelo discurso miudinho que fica tudo muito bem e muito giro
se não se sofrer golos. Mas nem oito nem oitenta. O FC Porto tem toda a
legitimidade e mérito em se afirmar como putativo candidato a vencer a Liga Europa,
mas há que ir passo a passo. E, se possível, não exibir esse discurso imperial
fora de portas. Nem tão pouco alinhar pelo discurso de que jogo a jogo a coisa
se pode consolidar. Sobretudo, aos dragões convém um discurso ponderado que
evidencie uma equipa em processo reconstrutivo e que patenteia, de forma até
natural, uma série de dores de crescimento que vão fazer com que o grupo cresça
de trás para a frente em termos de resultados. Tal como acontece, agora, dentro
de campo. Em sintonia.
É que, verdade seja dita,
nesta fase da vida dos dragões, o Hoffenheim era o adversário ideal. Uma equipa
com pontos fortes assentes na mobilidade da linha ofensiva e debilidades no
processo defensivo (transição sobretudo). Ou seja, era perfeitamente previsível
que o FC Porto de há meia dúzia de jogos tivesse sofrido golos diante dos
alemães. E, na realidade, tal não esteve muito longe de acontecer na primeira
parte.
De entre as alterações na equipa, a explicação parece mais ou menos óbvia. Ora, se a principal premissa era a de não sofrer golos, nada como colocar em campo um lateral bem mais habilitado do ponto de vista defensivo, como é o caso de Martim Fernandes. Depois, para os excecionalmente bons há sempre lugar: de facto, Zé Pedro não estava a jogar mal e, ofensivamente falando, até se estava a cotar como um dos principais focos de alimentação da dinâmica ofensiva da equipa. Acontece que por ali anda Tiago Djaló: rápido, com bom poder de recuperação e muito hábil a progredir e a construir, seria um desperdício continuar a manter um elemento desta envergadura no banco dos suplentes.
E Tiago Djaló traz um aporte
significativo. Não foi coincidência. Os dois golos apontados nas duas últimas
partidas reforçam um atributo que pode ser fundamental e que, nos dragões, era
exponenciado por Marcano. O golo. E por uma questão de lógica: ora, se um
central tem a capacidade para inibir os atacantes, também conhece os segredos
para, de uma forma pragmática, se assumir como referência de concretização. E
existe ainda o montante: são estas questões que, sobretudo numa equipa grande,
fazem efetivamente a diferença nos mais determinantes momentos.
É claro que uma defesa mais
contida pressupõe, ou deverá pressupor, um meio-campo mais atrevido e dado à
posse e, para tal, a entrada de Iván Jaime para zonas de definição (muitas
vezes a sair e a alimentar o flanco direito) fez todo o sentido. Todavia, os
alemães tinham a lição bem estudada e bloquearam vários pontos fulcrais, como a
capacidade dos médios portistas em se colocarem de frente para o jogo e fazerem
a diferença ao nível da construção. Mais concretamente, com a defesa enxameada
em torno de Samu e a dupla Pepê-Galeno a ser obrigada a recuar para recuperar
jogo (sobre Pepê era mesmo cair em cima sem dó), aos dragões ficou sempre a
consciência de não perderem os alicerces defensivos, mesmo que para tal a
dinâmica de ataque tivesse de ficar mais perra e contida.
O desempenho de Samu pode ser
analisado de duas maneiras: sim, foi notório que esteve menos exuberante do que
em partidas anteriores, sobretudo na primeira parte em que as fontes de
alimentação foram mais turvas e a bola pouco lhe chegou; mas, por outro lado,
por que razão Samu deve estar tanto em jogo e sujeito a um desgaste permanente?
Não será melhor a lógico do “pouco, Futebol 365, 25-10-2024, 13h45mas bem”?
O segundo golo dos dragões,
que selou um desfecho de partida, trouxe a Samu o papel que Gyokeres desempenha
no Sporting: recuo estratégico da equipa e criação de uma situação de confronto
individual + possibilidade de exploração da profundidade. Com uma eficácia tal
que até foi possível a Samu hesitar e voltar a ponderar na melhor decisão a
tomar. Porque há algo que sobretudo interessa reter: só Samu é que conseguiria
marcar aquele golo. Ponto. E apareceu no momento oportuno.
Não que o FC Porto esteja em
xeque nem que a dúvida paire. Os dragões sabem aquilo que querem. Porém, nesta
altura, o que mais interessa é mesmo celebrar o primado do resultado. Não há
chuvas nem intempéries, mas sofrer seis golos em dois jogos – realce dois numa
situação de superioridade numérica – representam uma espécie de constipação
prestes a tornar-se gripe. Que se curam com recolhimentos. Males necessários
para bens posteriores. Caminho certo.
Confira aqui tudo
sobre a competição.
Título e Texto: Gil Nunes,
Futebol
365, 25-10-2024, 13h45
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