terça-feira, 29 de outubro de 2024

Pouco a comemorar

Rodrigo Constantino

Comecemos pelo mais relevante: o comunista invasor de propriedades, adorado pelos artistas, "intelectuais" e "jornalistas", não é o futuro prefeito da cidade mais rica do país. Alívio imediato! Guilherme Boulos moderou a estética e o discurso, teve ajuda da Globo e dos artistas, gastou uma fortuna na campanha, e perdeu. 

Foto: Luís Blanco

O PT transferiu uma montanha do nosso dinheiro de impostos ao seu candidato, Lula foi seu garoto-propaganda, mas mesmo com 16 vezes mais recursos, o líder do MTST amargou o mesmo resultado, em torno de 40% dos votos. O PSOL não tem nenhuma prefeitura, e mesmo o PT levou só Fortaleza nesse segundo turno. 

A cegueira dos iludidos me preocupa bastante. Querem enxergar uma onda avassaladora da direita, um toque de Midas de Bolsonaro, mas a realidade é mais amarga 

O sentimento antipetista segue bem forte no Brasil, e isso é boa notícia. Também é algo positivo o fato de que a direita conseguiu crescer em eleição municipal, tradicionalmente dominada pelo centrão fisiológico. As pautas são menos nacionais e ideológicas, e vale o peso da máquina. Mas bolsonaristas como Nikolas Ferreira e o próprio Jair Bolsonaro foram cabos eleitorais importantes, ainda que não milagrosos. 

Após esse começo promissor, a ducha de água fria: o centrão fisiológico continua sendo a força mais poderosa na política local. O PSD do Kassab levou quase 900 prefeituras, e mostrou suas garras. Mesmo em SP, o vencedor, Ricardo Nunes, é mais kassabista do que bolsonarista. O discurso de Nunes é anticlímax para os bolsonaristas mais animados: 

E agradeço ao líder maior, sem o qual essa vitória não seria possível, o meu amigo, que me deu a mão, o governador Tarcísio de Freitas. [...] o equilíbrio venceu todos os extremismos. O nosso povo enviou o recado ao país inteiro. Política sim, mas com resultado. 

É possível frisar que Tarcísio é leal a Bolsonaro e que o vice de Nunes é o coronel Melo Araújo, respeitado pela direita. Mas ao ignorar Bolsonaro e focar em Tarcísio apenas, Nunes mostra que quem venceu mesmo foi Kassab. Tarcísio é um bom governador, um gestor eficiente, mas que ignora por completo a guerra cultural e a pauta prioritária no país hoje, o resgate da democracia e das liberdades básicas, sequestradas pelo STF. 

Como alguém que é alvo direto do sistema, há dois anos sem passaporte, contas bancárias e sob censura nas redes sociais, acho que tenho o direito de não me animar muito com Tarcísio sendo alçado ao patamar de "novo líder" da direita. Alguém que vai para a Gilmarpalooza para elogiar o papel supremo, que diz que o importante é ter "diálogo" com o ministro Alexandre de Moraes, não inspira muita confiança. 

Sim, a direita ainda está engatinhando em estratégia eleitoral, especialmente municipal. Sim, tivemos importantes vitórias, ainda que algumas derrotas também, como em Belo Horizonte, Fortaleza, Goiás e mesmo em Curitiba, em que pese Cristina Graeml ter feito história ao quase furar a bolha praticamente sozinha. 

A questão é: temos tempo para apostar na virada pelo Senado em 2026? Não está claro que o STF vai seguir perseguindo conservadores? Por que alguns acreditam que Bolsonaro ficará elegível novamente? Quais são os sinais para um suposto recuo alexandrino? Se eles existem eu os desconheço. 

Que bom que Boulos não venceu! E Marçal se mostrou um oportunista mesmo, nada confiável, apesar de ter tido a mesma ordem de grandeza de votos dos outros dois sem partido, tempo de TV, Bolsonaro como cabo eleitoral e ainda ter dado um tiro no pé aos 45 do segundo tempo. Ou seja, em SP levou o "menos pior". 

Mas isso é realmente bom ou representa a volta do teatro das tesouras? Nunes é tucanão, o Kassab e o Alexandre estão felizes da vida, mas calma! É xadrez 4D, é tic-tac, em mais 72 horas tudo será diferente, em 2026 tem o Senado, e quem estiver tenso com o PSD levando quase 900 prefeituras e Davi Alcolumbre no comando do Senado é "direita intergaláctica". Está tudo sob controle! Sério? 

A cegueira dos iludidos me preocupa bastante. Querem enxergar uma onda avassaladora da direita, um toque de Midas de Bolsonaro, mas a realidade é mais amarga. O maior vitorioso das eleições municipais segue sendo o PSD do Kassab. Tarcísio parece um tanto "domesticado" pelo sistema. O Brasil pode não vai virar a Venezuela; mas vai virar o México! Se já não virou...

Título e Texto: Rodrigo Constantino, Gazeta do Povo, 28-10-2024, 10h24 

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