sábado, 7 de dezembro de 2024

Desfasamento

Henrique Pereira dos Santos

Tinha visto umas referências a uma entrevista a Sónia Sanfona, na SIC Notícias, na quinta-feira, perto das dez da noite.

Vi o desfasamento entre alguém que quer falar de realidades concretas no uso de dinheiros públicos, prevenindo abusos sensatamente, e um jornalista que vive num mundo de regras formais no qual o dinheiro dos contribuintes é um pormenor sem grande relevância.

Foi já há bastantes anos que ouvi (ou li, não me lembro) João César das Neves dizer que o dinheiro do Estado era o dinheiro cuja utilização era mais exigente eticamente por nele estar incluído dinheiro dos mais pobres de todos.

Ao longo dos anos vou-me lembrando disto, às vezes uso esta ideia (escusam de me incomodar com o facto de ser muito baixinha a percentagem de dinheiro dos mais pobres, porque pagam poucos impostos ou porque o saldo da sua relação com o Estado até lhe é muitas vezes financeiramente favorável, estou farto de ouvir essa argumentação e acho-a intelectualmente pobre e moralmente indigente), insistindo frequentemente que esquecer este facto basilar é socialmente prejudicial.

Quando alguém extremamente pobre compra um quilo de batatas, mesmo que seja com dinheiro proveniente de uma prestação social paga pelos contribuintes, entrega 6% dessa compra ao Estado.

O Estado tem obrigação de saber que esses 6% foram retirados a um dos mais pobres de todos e, portanto, quando os usa, tem a obrigação moral de se esforçar por os usar de maneira a que o benefício social desse uso seja superior ao benefício social de deixar esse dinheiro no bolso de um dos mais pobres.

Que o jornalista se encarnice em saber se o dinheiro da prevenção de abusos no uso de prestações sociais é muito ou pouco é, para mim, deprimente: qualquer euro gasto indevidamente em gente que manipula as regras para aceder a recursos dos contribuintes que não lhe são devidos, é um euro gasto a mais.

A esquerda (e os outros) que pretende crucificar Sónia Sanfona por defender coisas banais e justas, como a prevenção de abusos no acesso a prestações sociais, com o apoio de uma comunicação social moralmente desorientada, é uma esquerda em vias de extinção.

Ainda bem.

Título e Texto: Henrique Pereira dos Santos, Corta-fitas, 7-12-2024 


César, 7-12-2024 às 11h44:
Há sempre uma coisa que tenho em mente e que se confirma de cada vez que um esquerdista abre a boca: a esquerda multiplica os pobres porque precisa deles para a sua retórica.
Sem eles, desapareciam.

Antonio Maria Lamas, 7-12-2024 às 14h35: 
Eu vi a entrevista em direto e fiquei muito incomodado com a ignorância e a infantilidade do que se chama jornalista, a todo e qualquer papagaio que pague a carteira profissional.
Toda a gente que vive fora do eixo Carnaxide/Lisboa/Cascais, conhece situações iguais à que a Presidente da Câmara de Alpiarça mencionou.
O rapaz insistiu em perguntar o que já estava respondido.
Até parece que a tese Socrática do amigo que paga tudo é a regra para o país.
Simplesmente abjeto.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.

Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.

Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-