Marcos Guterman
O Kikiriki, apesar do nome engraçado, é um
dos mais antigos jornais de esquerda da Venezuela – ou seja, não é um mero
acidente marrom. Esse semanário chavista publicou a manchete acima, que, numa
tradução elegante, pode ser lida como “Capriles Radonski é o candidato deles.
Se os judeus chegarem ao poder, estamos ferrados”. Era uma referência ao
candidato de oposição à Presidência venezuelana, Henrique Capriles – que se diz
católico e cujos avós por parte de mãe eram judeus, mortos no campo de
concentração nazista de Treblinka.
Não é a primeira vez que as hostes chavistas
apelam ao antissemitismo explícito para atacar o adversário de Hugo Chávez. Em outra oportunidade, um desses intelectuais acusou os
“sionistas” de dominarem a mídia, os bancos e os governos ao redor do mundo. No
caso do Kikiriki, o jornal nem se deu ao trabalho de disfarçar o ódio
aos judeus a título de crítica aos “sionistas”. O máximo de “sutileza” foi ter
colocado uma foto com a legenda “Menino palestino após um bombardeio
israelense”. Ou seja: era uma advertência aos venezuelanos sobre do que os
judeus são capazes.
Mas isso é só a Primeira Página do periódico. As
páginas internas reservam material ainda mais didático sobre a imaginação dos
antissemitas venezuelanos que militam no chavismo. Um dos textos diz que Capriles é vinculado à TFP, que por
sua vez é “associada” do “lobby judaico” – ao qual o Kikiriki atribui a
propriedade dos principais bancos, meios de comunicação e indústrias
tecnológicas e bélicas do mundo, com poder para nomear os principais ministros
dos governos mais poderosos do mundo.
O melhor, no entanto, é o editorial. O texto questiona “por que a palavra Israel
aparece milhares de vezes (na Bíblia), de ponta a ponta, e por que Deus
prometeu umas terras e os nomeou (aos judeus) os membros eleitos sobre este
planeta”. A resposta, afirma o editorial, é que “quem escreve a história se
coloca como protagonista e como vencedor”, e a Bíblia é obra de judeus. E então
o Kikiriki arremata:
“É preciso falar disso porque os judeus sionistas
se apoderaram do dinheiro do mundo e de suas grandes corporações, bancos e
empresas, assim como dos meios de rádio, TV e jornais e agora puseram os olhos
na Venezuela. Capriles Radonski, bilionário, é filho de pai judeu e de mãe
judia, razão pela qual é preciso estudar suas conexões internacionais e
aprofundar sua história. Estaremos fodidos se os judeus chegarem ao poder – e
quem tiver dúvida disso, que pergunte aos palestinos e aos árabes”.
Caso encerrado.
Título,
Imagem e Texto: Marcos Guterman, Estado de S. Paulo, 16-03-2012
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