sexta-feira, 9 de março de 2012

Religião – a fronteira final do feminismo?

Lisa Miller/Francisco Vianna
A guerra dos sexos, que proveu à atual época eleitoral americana de uma fúria total no espaço público, está sendo travada, também, numa esfera muito mais dolorosa. Nas igrejas (além de sinagogas e mesquitas) pelo país afora, as mulheres são ainda tratadas como cidadãos de segunda classe. E, pelo fato das fiéis estarem cada vez mais se tornando arrimos de família, mães solteiras, e chefas de família, tal diminuição de status social está começando a irritá-las.
Há igrejas na América nas quais as mulheres não são permitidas falar em voz alta, a menos que recebam permissão prévia de um homem. Há igrejas (muitas delas) nas quais as mulheres não são permitidas a usar o púlpito para fazer pregação. Há igrejas na América onde um adolescente de 13 anos tem mais autoridade do que sua mãe.

“Nas igrejas e templos (sinagogas e mesquitas) pelo país afora, as mulheres ainda são tratadas como cidadãs de segunda classe”, descreve a autora. Foto: Ishara S. Kodikara/AFP/Getty Images
“Na igreja, tenho que ocultar meus pensamentos e opiniões, questões de escolhas de vida”, diz Susan, uma mulher que trabalha como terapeuta em Seattle e, após ter seguido Jesus a vida toda, deixou a cristandade. “Acho que jamais pude fazer algo por mim mesma, porque como mulher cristã eu aprendi que precisava de um homem para ter um lugar na comunidade religiosa”.
A estória de Susan foi publicada em janeiro por uma pequena editora cristã no livro “A Resignação de Eva”.  Em suas páginas, o autor, um ministro evangélico chamado Jim Henderson, questiona que a menos que os líderes masculinos das igrejas conservadoras cristãs façam um sério exame de consciência — e já — as mulheres que já têm sustentado tais igrejas com seu tempo, suor e dinheiro, irão embora. Em massa. E elas não voltarão. Suas crianças, tradicionalmente trazidas para a igreja por suas mães, irão, pois, se juntar ao crescente número de americanas que se auto-intitulam “sem-igrejas”. 
”Não importa que a Bíblia diga que as mulheres devam se submeter aos homens e sentar-se nas igrejas guardando silêncio”, declama Henderson. “Isto é história antiga que não tem cabimento nos dias de hoje e, até que os poderosos (homens) decidam dividir esse poder igualmente com os que não têm (mulheres), acredito que nós continuaremos a representar erroneamente o coração de Jesus e a estragar a beleza de Seu reino”, escreveu Henderson.

Henderson apoia seu argumento com dados do Grupo de Pesquisa Barna. Entre 1991 e 2011, o número de mulheres adultas que frequentam igrejas semanalmente na América diminuiu cerca de 20 por cento. O número de mulheres a frequentar a escola dominical caiu quase um terço, assim como o número de mulheres que se apresentam como voluntárias para servir à igreja. E, embora os dados do Barma sejam questionados por outros pesquisadores, Henderson vai mais adiante. Mesmo as mulheres que vão regularmente às suas igrejas – diz ele – na verdade correspondem à metade das que iam antes desse período. Ele culpa, por este mal que grassa entre as mulheres, aquilo que chama de “lavagem cerebral espiritual”.
Acho que tais senhoras conservadoras, nesta época eleitoral, lutando para conseguir o que querem e manter seus olhos em Deus e nos homens justos e de bem, sabem também que “o patriarcado” as desrespeitam e as insultam.
Não é apenas Rush Limbaugh quem deprecia todas as mulheres, ao chamar uma de “vagabunda” e outra de “prostituta”. É, também, o candidato Rick Santorum — que homem de fé! — que por pouco não chamou as mães que trabalham fora de egoístas e juntou as ‘piranhas’ e as mães solteiras num mesmo saco e considerá-las com sua oposição, como disse numa entrevista a Tony Perkins do Conselho de Pesquisa Familiar no ano passado.
“Elas buscam a ajuda do governo e, portanto, elas vão votar”, disse Santorum. “Assim, se quiserem reduzir a vantagem dos Democratas, o que vocês têm que fazer é construir “famílias de dois membros”“. É cada simples política que impulsiona o chamado “governo pequeno” no sentido da saúde, do bem-estar e da educação das crianças.
Acho que os blogueiros do Movimento Feminista Mórmon das Donas de Casa, que insistem em sua devoção à Igreja de Jesus Cristo dos Santos do Último Dia enquanto sensivelmente se rebelam contra o s ensinamentos que tornam as mulheres inferiores aos homens. Acho que as mulheres da Aliança Ortodoxa Feminista Judaica, que, barradas de exercerem qualquer liderança nas sinagogas, estão iniciando pequenos grupos de oração, por si próprias, onde podem levar a cabo juntas os rituais judeus do ciclo de vida.
Penso na Kelly, uma personagem do livro de Henderson que, após empunhar a bandeira das mulheres junto a um ministro de sua igreja, recebeu o tratamento do silêncio de seu pastor por meses. Kelly deixou aquela igreja e começou um grupo que se reunia com pessoas em suas salas de estar. Lá ela era uma líder. “Esta é a minha igreja e eu a amo”, diz ela. “É uma comunidade que eu cultivei e sou sua pastora”.
As analogias políticas são claras. Segundo uma nova enquete da NBC/Wall Street Journal, Obama vence em qualquer disputa contra Romney, Santorum ou Gingrich. Entre as mulheres, no entanto, esta vitória é enorme: 18, 24, e 27 pontos percentuais, respectivamente, acima de cada um deles. A menos que os conservadores estridentes e autoritários afrouxem sua mão de ferro com que cerceiam as mulheres americanas, elas irão abandonar o Partido Republicano (na medida em que abandonarão também suas igrejas) e buscarão seus candidatos em outras bandas.
Título e Texto: Lisa Miller, The Washington Post, 08-03-2012. Tradução: Francisco Vianna

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