Carlos Alberto Sardenberg
Jeito sempre tem, inclusive
para o Euro, a Espanha e mesmo para a Grécia.

A negociação da dívida dos
Estados brasileiros é um exemplo citado na imprensa internacional. Resumindo:
os governos estaduais brasileiros estavam tão quebrados quanto a Grécia,
Irlanda e Portugal. Emitiam seus próprios títulos de dívida (as carioquinhas,
as paulistinhas) que o mercado só aceitava cobrando juros altíssimos. Assim, os
governos ou se endividavam ainda mais, pelo efeito dos juros, ou empurravam
seus títulos para os bancos estaduais (Banerj, Banespa etc). Resultado,
quebraram os governos e os bancos.
Solução: o governo federal
"comprou" os títulos estaduais e refinanciou outras dívidas, pagando
com títulos do Tesouro nacional, de credibilidade maior e, pois, juros menores.
Como seria na Zona do Euro? A
criação dos tais "eurobônus", ou títulos da dívida européia,
garantidos pela União Européia e negociados no Banco Central Europeu. Assim, em
vez de vender títulos gregos, espanhóis, italianos, etc, pagando taxas
proibitivas, os respectivos governos seriam financiados com os papéis
"federais", que, sendo da UE, teriam, no fundo, a garantia alemã.
Mas a solução brasileira
incluiu poderosas contrapartidas. Os governos estaduais, desde então, são
obrigados a pagar uma prestação mensal a Brasília (se falharem, não recebem
participação nos impostos federais), não podem mais emitir títulos, têm despesas
limitadas e controladas e outros endividamentos são restritos a uma porcentagem
das receitas. E o governo federal não pode mais financiar os Estados, tudo
previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Por isso, a solução dos
eurobônus ainda não foi aceita pela Alemanha. Angela Merckel exige, antes,
regras parecidas à brasileira, que restrinjam a capacidade dos Estados na
administração de suas contas e suas dívidas. Mais difícil lá, pois não são
governos regionais e sim Estados nacionais que deveriam abrir mão de parte da
soberania. É o que François Hollande não aceita, por exemplo. Ele quer bônus
com a garantia européia/alemã, mas sem as restrições de soberania fiscal.
Não esquecer: outra parte
importante da solução brasileira foi a intervenção, fechamento e/ou privatização dos bancos estaduais. Tem banco estatal na Europa que pode ser
fechado.
Mas a dificuldade maior está
em bancos privados, atolados com créditos podres.
Sem problemas: estudem o Proer
brasileiro, do final dos anos 90, quando vários bancos locais quebraram com o
fim da inflação. Ainda na semana passada, em editorial sobre a Espanha, a
revista Economist sugeriu: o governo intervém nos bancos quebrados, separa os
ativos podres, colocando-os no "banco ruim", que é simplesmente
liquidado. O que sobra, se sobra, o banco bom, é vendido. Ora, foi exatamente o
que se fez aqui com Nacional, o Bamerindus e o Econômico - para citar apenas os
maiores.
Calcula-se que o custo disso
na Espanha chegue a 10% do Produto Interno Bruto (PIB). No Brasil, ficou mais barato.
Na época, houve muita oposição, inclusive e especialmente do PT. Hoje, todos,
inclusive Lula e Dilma são os primeiros a falar da solidez do sistema bancário
brasileiro.
Outro ponto importante: Banco
do Brasil e Caixa estavam literalmente quebrados, por causa de empréstimos
fartamente concedidos com critérios políticos e má administração. O governo
federal colocou uns R$ 15 bilhões para reaprumar esses dois bancos e
estabeleceu novas regras de gestão, mas propriamente "bancárias".
Por isso, aliás, é preciso
ficar de olho nessas manobras do governo Dilma para forçar os bancos a
reduzirem juros e ampliarem o crédito. Existe, sim, o risco de que estejam
abrindo novos buracos.
Mas, voltando à Europa, o
problema para um Proer deles está, de novo, na falta de uma verdadeira
federação européia, que submeta os Estados nacionais a uma disciplina comum.
Ou seja, jeito sempre tem, mas
nunca é fácil. Precisa combinar com muita gente, a começar pelos eleitores. No
Brasil, FHC tinha um sólido mandato nacional para tocar essas e outras
reformas. Na Zona do Euro, é obviamente mais difícil obter esse mandato.
Os eleitores franceses, por
exemplo, votaram contra a austeridade. Os irlandeses, a favor. Os gregos votam
agora de novo. Os alemães, de seu lado, não manifestam entusiasmo pelos
"eurobônus". Temem que os gastadores torrem ainda mais com a garantia
alemã.
A única coisa que ajuda,
digamos assim, é a emergência, a situação de vai ou racha. E o que pode rachar
é simplesmente a mais bela construção política e econômica do século passado.
Não nos esqueçamos: a Europa
unida gerou crescimento, ganho de renda elevado (especialmente para os que eram
mais pobres, como Espanha, Portugal e Grécia) e regimes democráticos. Eles vão
lutar para salvar isso.
Título e Texto: Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
Colaboração: Rafael Picate
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