sábado, 5 de janeiro de 2013

A guerra de 2012 contra Passos Coelho


Miguel Castelo Branco
Contrariando o ritual da passagem de ano - os bloguers têm todos um gene de Professor Karamba - não deixei quaisquer previsões sobre 2013. Contudo, não me posso furtar a um sumário balanço do ano que agora terminou, menos terrível do que muitos apocalípticos previam, bem pior do que teria sido se ao longo dos últimos 30 ou 40 anos não tivessemos sido governados por gente absolutamente falha daquela elementar faculdade que se exige dos políticos, ou seja, da racionalidade. A crise que nos bateu à porta arrasou modos de vida, destruiu sonhos, mordeu com o desemprego, a fome e a emigração forçada centenas de milhares, mas teria sido pouco mais que um sobressalto se os portugueses - manietados, condicionados e cloroformizados de demagogia - não tivessem querido sucessivamente Cavaco, Guterres, Barroso e Sócrates, não se tivessem iludido com um "Estado social" feito à medida de uma riquíssima Suécia, não levantassem a mais leve objecção a respeito de um consumo que muitas vezes duplicava o rendimento por via do crédito.
O desmancha-prazeres foi Passos Coelho. Contra ele - o único que não fugiu (vide Cavaco, vide Guterres, vide Barroso, vide Sócrates) - levantaram-se os lóbis, as corporações, as redes formais e informais do empregadorismo, as lojas e as sotainas, as fardas, os debitadores de conselhos, os ricos do aparelho do Estado, os reformados milionários, os médicos, os professores, os enfermeiros, os estivadores, os pilotos, os autarcas, os polícias e até a velha classe política que não quer ceder passo a uma nova geração.
A guerra atingiu culminâncias de paroxismo em Setembro, com a tal manifestação por muitos já mitificada (antes, a juventude fazia revoluções, hoje invoca uma passeata metendo abraços e beijos aos policias) que mostrou a que ponto a tal classe média, filha dilecta do regime, não queria abrir mão da ilusão.
A guerra de 2012 passou. Quem se opõe ao governo sabe que não há outro caminho, que Portugal só tem pela frente um desafio (regressar aos mercados para garantir crédito), que o Estado social deve servir os pobres e não os ricos, que o país tem de produzir e exportar mais sapatos, mais vinhos, mais celulose, mais madeira e cortiça. De fora ficam os reaccionários que pensam que Portugal poderá regressar a 1980, a 1990 e a 2000 - o tal dos "projectos", da subsidiação a fundo perdido, do emprego nas autarquias, do "rendimento mínimo garantido" - e que aqui estávamos, solarengos neste canto da Europa meridional, de mão estendida aguardando os fundos europeus e que a Alemanha - grande leiteira que a todos alimentava - estaria disposta a eternizar um estado de coisas no mínimo aviltante para quem recebe.
Cada um deve fazer por si. Portugal tem um bom governo (compare-se Crato, Portas, Mendes, Macedo, Gaspar, Santos Pereira com os titulares dos últimos vinte governos) e poderá passar da aflição em que se encontra. De consenso em consenso, de negociação em negociação, de cedência em cedência chegámos a isto. Passos Coelho é tão odiado precisamente por ter assestado o golpe na floresta de nós Górdio que em clima de festa nos iam estrangulando. Só lhe desejo coragem, que "se lixem as eleições" e que em 2013 possa dar seguimento à mesma política porque, se não o fizer ou se não o deixarem fazer, a única solução que se pode prever é a do derrube do regime e o regresso de uma via autoritária.
Título, Imagem e Texto: Miguel Castelo Branco, no blogue “COMBUSTÕES”, 02-01-2013
Grifos: JP

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