sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Ainda a carta de Putin

Samuel de Paiva Pires

No seguimento do meu post anterior, o Rui Carmo escreve - e bem - sobre como a acção política de Putin tem ido no sentido contrário ao que a sua carta de ontem deixa patente. No entanto, ao contrário do que o Rui aponta, não deposito qualquer esperança em Putin. Ainda ontem a Foreign Policy publicava uma excelente peça sobre uma outra carta de Putin, em 1999, em que, para justificar uma intervenção militar na Chechénia, utilizava argumentos idênticos aos que Obama utiliza para justificar a intervenção na Síria. Aliás, nem precisaríamos de ir tão longe, bastava recordar a intervenção na Geórgia e a retórica de cariz ocidental e humanista utilizada por Putin para a defender. Afinal, a política internacional, como não poderia deixar de ser, é dominada, em larga medida, por double standards. Isto, contudo, não retira importância à carta que, conforme escrevi ontem, provavelmente poderá tornar-se um dos textos mais estudados nos próximos anos em cursos de Relações Internacionais, e foi isso que pretendi transmitir com o meu post. De resto, estou completamente de acordo com este post do Rui A, que transcrevo na íntegra:

«A não ser que acreditemos que a conversão da Rússia já começou e que Putin é o novo Constantino, convém procurarmos outras razões para explicar o que está subjacente à magistral intervenção do líder russo na crise Síria, que ontem teve um momento alto com a publicação de um artigo seu no NYT. E esses motivos são relativamente inteligíveis. No essencial, Putin aproveitou uma janela de oportunidade escancarada pelo desastrado presidente americano para voltar a colocar a Rússia como actor decisivo na geopolítica mundial, com foco especial no Médio Oriente e no Islão, donde estava afastada desde, pelo menos, a invasão soviética do Afeganistão. E a mensagem foi muito clara: a pax americana terminou, e o mundo conta novamente com a Rússia para equilibrar o xadrez mundial. A carta “escrita” por Putin é, de resto, uma peça admirável de mestria e de cinismo político, porque utiliza os valores que são caros aos EUA para os chamar à ordem e envergonhar o presidente americano. O flanco dado por Obama com a sua gestão errática do problema Sírio, na sequência dos transtornos que tem vindo a causar com a «primavera árabe» e das trapalhadas de espionagem em que anda metido, vulnerabilizou fortemente os EUA e criou um vácuo de autoridade a que a política internacional tem horror. Putin, ontem, preencheu-o. A administração Obama está de parabéns.»


Título e Texto: Samuel de Paiva Pires, Estado Sentido, 13-9-2013

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