João Marques de Almeida
Para estarem no poder, as esquerdas não
vacilam em recorrer a medidas normais num governo de direita. Por isso mentem e
enganam. Quando são apanhados, arranjam vítimas que abandonam de modo
implacável
Os episódios à volta da Caixa Geral de
Depósitos estão cheios de ironias. Uma das mais saborosas diz respeito ao novo
Presidente executivo, Paulo Macedo. As esquerdas passam a vida a acusar o
governo do PSD e do CDS de ter tentado destruir a Caixa, mas pediram a um
antigo ministro desse governo que a salvasse. E logo o ministro que foi tantas
vezes atacado por estar a destruir o SNS. Agora terá que proteger a Caixa das
asneiras e das mentiras da geringonça.
Mas a minha ironia preferida é ver o
Bloco de Esquerda e o Partido Comunista abandonarem os princípios que sempre
defenderam. Para quem estava sempre a apelar à transparência, agora a
investigação sobre os créditos da Caixa tornou-se um tema incómodo, sobretudo
os empréstimos durante os governos de Sócrates. Os campeões do papel central da
Assembleia da República, olham agora para o escrutínio parlamentar sobre as
nomeações de gestores públicos como um assunto irrelevante. Quem sempre
defendeu a nacionalização da banca, aceita agora o financiamento privado da
Caixa, pelos malditos mercados.
Não nos podemos esquecer que o BE e o
PCP estão pela primeira vez no poder, e estão a mostrar ao país a sua
verdadeira natureza. Os dois partidos são compostos por verdadeiros
profissionais da política. Se for necessário, sacrificam tudo no altar do
poder. Mas o episódio Caixa está a testar o profissionalismo dos camaradas. A
linguagem corporal da gémea Mortágua e de Louçã, nas suas aparições furiosas na
televisão, mostrou tudo. O embaraço é visível, daí o tom de irritação quando
discutem a Caixa. Do lado do PCP, o normalmente ponderado João Ferreira
garantiu em direto aos portugueses que o seu partido nunca pede a demissão de
ministros. Foi embaraçoso assistir ao tamanho da sua mentira, que só poderá ser
explicada pela contradição entre o poder e o discurso. Tal como na guerra, a
verdade foi a primeira vítima da geringonça. E a mentira tornou-se o método
para esconder as contradições entre os três partidos.
Foram essas contradições que em grande
medida explicam o modo como a equipa de António Domingues foi contratada. O
governo sabia que o BE e o PCP nunca aceitariam as condições acordadas com
Domingues, como aliás se viu. Por isso tentou manter tudo em segredo. Quando
foi apanhado, fez a única coisa possível: deixou cair Domingues. Toda a gente
sabe que Centeno e António Costa aceitaram as condições de Domingues e todos
sabem que eles mentiram. A única dúvida é saber se se encontram as provas da
mentira.
Também já se percebeu, se forem
encontradas as provas da mentira, que a próxima vítima será Centeno. Um governo
que elevou a mentira a método de trabalho precisa de vítimas para proteger o
PM. Mas, a acontecer, a demissão de Centeno seria de certo modo injusta. O
problema não é o ministro das Finanças e a sua demissão não resolve nada. O
problema é mais profundo. Entre os compromissos com a União Europeia e os
acordos com o PCP e o BE, o governo precisa de esquemas, de secretismo, de
mentiras. Em suma, aquilo a que muitos chamam a “habilidade de António Costa”.
Se Centeno sair, nada muda. Pelo contrário, as coisas até podem piorar. Desde
logo, duvido que o PM consiga arranjar alguém mais competente do que Centeno.
Há outra questão igualmente relevante.
O acordo feito com Domingues mostra a enorme dificuldade da Caixa para competir
com bancos privados, o que se tornou ainda mais difícil com a União Bancária.
Chegamos assim à ironia final. O governo PSD e do CDS tratou a Caixa de acordo
com as ideias da esquerda, recapitalizando-a inteiramente com dinheiro público
e nomeando uma administração de acordo com o estatuto dos gestores públicos.
Este governo aceitou recapitalizar a Caixa cumprindo as regras e o famoso teste
dos mercados e contratando uma equipa de gestão no sector privado. Se um
governo de direita o tivesse feito, as esquerdas protestariam com violência.
Mas já todos percebemos que para estarem no poder, as esquerdas não vacilam em
recorrer a medidas normais para um governo de direita. Por isso, mentem e
enganam. Quando são apanhados, arranjam vítimas que abandonam de um modo
implacável. Têm a boca cheia de ideologia. Mas são profissionais da política.
Título e Texto: João Marques de Almeida, Observador,
12-2-2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-