O País confia no Supremo Tribunal Federal e
espera que o tribunal não se dobre aos caprichos de um cidadão que se julga
acima da lei
O Estado de S.Paulo
Derrotado fragorosamente em
três tribunais, levando uma goleada de 9 a 0 dos juízes que até agora avaliaram
seu processo, o ex-presidente Lula da Silva deposita suas últimas esperanças de
escapar da cadeia na hipótese de que o Supremo Tribunal Federal (STF) venha a
se comover com seu caso e se disponha a rever o aval que deu à possibilidade de
execução de pena após condenação em segunda instância.
Em outras palavras, Lula
aposta que, no Supremo, seu caso terá tratamento político, única forma de ter
alguma chance de sucesso, já que, na análise estritamente técnica, diante da
profusão de provas e testemunhos apresentados e diante de uma defesa que não
fez outra coisa senão enxovalhar a Justiça, a culpa do chefão petista está
suficientemente provada, sem ter mais como se falar em “presunção de
inocência”. Será uma vergonha se o Supremo se prestar a esse papel.
A presidente do Supremo,
ministra Cármen Lúcia, já disse que não convocará o plenário da Corte para
rever a jurisprudência firmada em 2016 a respeito do início do cumprimento da
pena após condenação penal em segunda instância, como é o caso do sr. Lula da
Silva. Segundo suas palavras, trazer o assunto novamente a debate neste momento
seria “apequenar muito o Supremo”, pois se prestaria apenas a livrar o
ex-presidente da cadeia. Se o fizesse, a Corte estaria abdicando de seu papel
de tribunal constitucional e se converteria em reles despachante dos interesses
do demiurgo de Garanhuns.
Mas é claro que algum dos
ministros do Supremo, imbuído de sabe-se lá qual espírito, pode considerar
pertinente provocar o debate, e então o caso terá de ser examinado. Um
desdobramento como esse não seria outra coisa senão um ato político, pois a
questão jurídica já foi resolvida há dois anos.
Espera-se que nenhum ministro
do Supremo se disponha a desempenhar tão constrangedor papel, mas não se pode
apostar cegamente nisso, pois esse mesmo tribunal é aquele que, por exemplo,
avalizou a manutenção dos direitos políticos da presidente cassada Dilma
Rousseff, numa interpretação surreal da Constituição, destinada exclusivamente a
atender a determinados interesses políticos. E essa não foi a única
extravagância do tribunal.
É nesse insólito histórico de
decisões heterodoxas do Supremo que Lula e seus advogados se escoram, esperando
fervorosamente que a Corte ignore todos os votos dados até aqui pela condenação
do ex-presidente – e ignore também sua própria jurisprudência – para garantir
ao petista não apenas a liberdade, mas a possibilidade de se candidatar à
Presidência da República.
Os petistas estão cuidando de
fazer diligentemente sua parte. Em nota oficial, a presidente do PT, Gleisi
Hoffmann, disse que o Supremo “tem a obrigação de se pronunciar urgentemente”
sobre a questão da prisão após condenação em segunda instância. A cobrança
escancarada – reveladora de quem considera que o Supremo é vulnerável a
pressões políticas – veio acompanhada de grande cinismo, manifestado no trecho
segundo o qual o STF tem a responsabilidade de decidir “à luz da Constituição e
não da agenda política”.
O próprio Lula não deixou
dúvidas sobre essa pressão, ao dizer que, se for realmente para a cadeia, vai
se considerar “preso político”. Mais uma vez, disse que é vítima de uma
conspiração “deles”, pronome que ele usa para designar todos os que não o
endeusam, mas afirmou que “confia” no Supremo.
O País também confia no
Supremo. Espera que o principal tribunal do País não se dobre aos caprichos de
um cidadão que se julga acima da lei, abalando-se a rever uma decisão apenas
para favorecer a causa de um condenado por corrupção que usou seu poder e sua
visibilidade para difamar o Judiciário brasileiro aqui e no exterior. Se a
Justiça Federal decidir rejeitar os recursos finais do sr. Lula da Silva e
determinar sua prisão, que ele seja preso, como seria qualquer outro cidadão em
seu lugar, nas mesmas circunstâncias. O que está em jogo, portanto, é a própria
noção de Estado de Direito.
Título e Texto: Editorial, O Estado de S.Paulo, 9-3-2018
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ResponderExcluirPresidente do STF afirmou que 'urgência' motivou marcação do julgamento. Decisão valerá para caso específico de Lula e não muda entendimento sobre prisão após condenação em segunda instância.
https://g1.globo.com/politica/noticia/stf-julgara-pedido-para-evitar-prisao-de-lula-nesta-quinta-anuncia-carmen-lucia.ghtml
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