Ministro da Justiça apresenta o pacote
anticrime que será enviado ao Congresso. Saiba quais são as propostas
Kelli Kadanus e Fernando
Martins
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Foto: Nelson Almeida/AFP |
"O ministro da Justiça e Segurança Pública,
Sergio Moro, apresentou nesta segunda-feira (4) o pacote anticrime que vai
enviar ao Congresso. O conjunto de projetos altera 14 leis e tem três eixos
centrais: o combate ao crime organizado, à corrupção e à criminalidade comum. O
pacote anticrime modifica os códigos penal, processual e eleitoral e as leis de
execução penal e de crimes hediondos.
As medidas preveem, por exemplo, o endurecimento
de penas; mais rigor dentro dos presídios; a criminalização do caixa 2
eleitoral; a previsão legal da prisão em segunda instância judicial como regra
geral e em primeira instância no caso de homicídios; o chamado excludente de
ilicitude para não punir policiais que matam criminosos em situações de
confronto ou risco a vítimas. Há ainda uma medida inovadora no combate à
corrupção: informantes que derem informações que ajudem a recuperar dinheiro
desviado poderão receber até 5% desse valor – veja abaixo a íntegra das
propostas.
Criminalização do caixa 2 e criação do “informante do
bem” no poder público
Na área político-partidária, haverá a
criminalização do caixa 2 eleitoral e a alteração da competência para
julgamento de crimes complexos relacionados a eleições.
Para o combate à corrupção, uma proposta é a
oficialização do uso do “informante do bem” na administração pública para
“entregar” possíveis irregularidades. Em troca o informante poderá receber até
5% do valor recuperado. Ele terá direito à preservação de sua identidade. O
projeto prevê que não haverá condenação com base apenas em depoimentos do
informante. Ou seja, será preciso comprovação das informações.
Prisão após a 2ª instância para todos os casos e em 1ª
para alguns
Moro também propõe a previsão de execução de pena
após condenação em segunda instância, bandeira da Operação Lava Jato. “Isso é
importante para corrupção, é importante para crime violento e é importante para
organização criminosa”, argumenta o ministro. Ele esclarece que essa é uma
“mudança fundamental”.
O pacote anticrime não pretende fazer isso por
meio de alterações na Constituição, e sim no Código de Processo Penal. “Por que
não uma PEC [proposta de emenda à Constituição]? Nós estamos respeitando o
entendimento atual do STF. Por quatro vezes o STF disse que é constitucional.
Na minha opinião não tem necessidade, segundo a interpretação do Supremo, de
uma alteração na Constituição”, diz o ministro.
Atualmente, o caso das prisões em segunda
instância está sendo rediscutido no Supremo Tribunal Federal (STF), com julgamento
previsto para abril. O projeto de Moro altera o Código de Processo Penal e
prevê que “ao proferir o acórdão, o tribunal determinará a execução provisória
das penas privativas de liberdade, restritiva de direitos ou pecuniárias, sem
prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos”. O projeto
prevê exceção apenas em casos em que houver questão constitucional envolvida.
O ex-juiz também prevê em seu projeto a execução
de penas a partir de condenação por um Tribunal do Júri (primeira instância) em
casos de homicídio. A exceção é apenas para situações em que a defesa apresente
recurso que não seja protelatório e que tenha potencial de alterar o resultado
do júri.
Medidas contra o crime organizado
Uma das medidas contempladas no pacote é a
tipificação de organizações criminosas, que passarão a ter um tratamento mais
duro na legislação – se o Congresso aprovar as mudanças. Moro cita como
exemplos de organizações criminosas que serão contempladas pelas mudanças
legais o PCC, o Comando Vermelho, a Família do Norte, o Terceiro Comando Puro,
os Amigo dos Amigos – e também as milícias. A infiltração de policiais nessas
organizações será autorizada expressamente. “É necessário jogar mais duro com
essas entidades”, disse Moro sobre o combate ao crime organizado.
Moro também sugere que lideranças de organizações
criminosas armadas comecem a cumprir pena em estabelecimentos penais de
segurança máxima. Além disso, o projeto proíbe a progressão de pena para líderes
de facções criminosas. “O recado é claro: se integrar organização criminosa não
progride de regime.”
Também está entre as propostas a previsão legal de
que bens de criminosos apreendidos pelas autoridades possam ser usados no
combate ao crime. Além disso, o pacote prevê o “confisco alargado” de bens
obtidos ilicitamente. No caso de crimes em que a lei prevê uma pena máxima
superior a seis anos, Moro sugere que possa ser decretada a perda de bens
correspondentes à diferença entre o valor do patrimônio do condenado e aquele
que seja compatível com seu rendimento lícito.
Penas mais duras e mais rigor nos presídios
Outra medida anticrime é o endurecimento de penas
e do cumprimento delas. “Não é um endurecimento geral”, diz Moro. O ministro
afirma não desconhecer a situação de superpopulação carcerária do país, mas
defende que algumas penas precisam ser endurecidas nesses casos. “Sermos mais
rigorosos com crimes mais graves é um dos anseios da sociedade”, defende Moro.
“Aqui basicamente o alvo é o criminoso profissional.”
Para condenados por crimes hediondos, por exemplo,
a progressão de regime passa a acontecer apenas após o cumprimento de três
quintos da pena em regime fechado. Hoje, isso ocorre apenas para quem é
reincidente (para os demais casos de crimes hediondos, a progressão de regime
começa após o cumprimento de dois quintos da pena). “Tem que aumentar o
percentual de regime fechado. Isso não é autoritarismo, isso não é fascismo.
Isso é rule of law. Temos que ser mais rigorosos com a criminalidade grave. É
inaceitável que as pessoas que cometem crimes hediondos com resultado morte
apenas cumpram uma parte infima de suas penas e logo retornem ao convívio
social como se nada tivesse acontecido”, explicou o ministro.
Um trecho do pacotão trata exclusivamente de
crimes cometidos com uso de armas de fogo, que terão penas aumentadas em 50%
além do tempo previsto no Código Penal. As medidas de Moro preveem regime
inicial fechado para crime de roubo com arma de fogo. “Pela legislação atual
isso não é imposto. Nós estamos estabelecendo isso como regra”, diz o ministro.
No projeto, Moro também sugere mudanças no regime jurídico
dos presídios. O projeto prevê que em presídios de segurança máxima, os presos
ficarão em celas individuais, receberão visitas por meio virtual ou no
parlatório, com o máximo de duas pessoas por vez, separados por vidro e
comunicação por meio de interfone, com filmagem e gravações.
Além disso, o projeto prevê o monitoramento de
todos os meios de comunicação, inclusive correspondência escrita. A ideia é
impedir que líderes de organizações criminosas possam dar ordens de dentro dos
presídios. Moro também sugere que sejam proibidas saídas temporárias de presos
condenados por crimes hediondos, de tortura ou de terrorismo.
Outra proposta é facilitar que acusados presos
possam ser interrogados por meio de videoconferência. Segundo Moro, isso vai
economizar recursos com o transporte de presos de penitenciárias para fóruns de
Justiça – além de garantir mais segurança à sociedade.
Excludente de ilicitude e culpa negociada
O projeto também tem um capítulo que trata da
“legítima defesa” – que engloba a proposta do “excludente de ilicitude”
proposto pelo presidente Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral.
Considera-se legítima defesa, pelo projeto, casos em que o agente policial ou
de segurança pública “em conflito armado ou em risco iminente de conflito armado,
previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem” e quando o
agente “previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a
prática de crimes”.
Em entrevista coletiva, Moro explicou que essas
mudanças também incluem cidadãos que, por exemplo, venham a matar um criminoso
que ameça sua vida ou a vida de outros inocentes.
Também há no pacotão o chamado “plea bargain” (barganha
de pena), sistema usado nos EUA por meio do qual o acusado negocia a redução de
pena com o Ministério Público ao assumir a culpa. A medida desafogaria a
Justiça. “Isso não se confunde com colaboração [premiada]”, diz Moro. Na
delação, o acusado entrega “companheiros” de crime em troca de redução de pena.
Dentre as medidas também há mudanças para dificultar
a prescrição de penas – proposta para evitar a impunidade. “O processo penal
tem que acabar ou com absolvição ou com condenação. Prescrição é apenas falha
do sistema”, disse.
Banco Nacional de armas de fogo e de DNA
Moro também prevê que dados relacionados à coleta
de registros balísticos serão armazenados no Banco Nacional de Perfis
Balísticos. O banco também vai cadastrar armas de fogo, armazenando
características de classe e individualizadoras de projeteis e estojos de
munição. O banco, segundo o projeto, vai ser constituído por registros de
elementos de munição deflagrados por armas de fogo relacionadas a crimes, para
subsidiar ações destinadas à apuração criminal.
Moro também propõe a criação do Banco Nacional
Multibiométrico e de Impressões Digitais. Neste banco ficarão cadastrados dados
de impressão digital e “quando possível”, de íris, face e voz, para subsidiar
investigações criminais.
O pacote de Moro ainda prevê que todos os
condenados por crimes dolosos, mesmo sem o trânsito em julgado, serão
submetidos a identificação do perfil genético, mediante extração de DNA, quando
ingressar no sistema prisional. Moro já havia falado sobre esse tema em seu
discurso de posse. O projeto prevê que os condenados que já cumprem pena também
poderão ser cadastrados no Banco Nacional de Perfil Genético. A recusa em
fornecer o DNA, segundo prevê o projeto de lei, será considerada uma falta
grave.
Combate unificado ao crime
Moro argumenta que crime organizado, corrupção e
criminalidade comum estão interligados e é preciso combatê-los de forma
unificada. O crime organizado, segundo ele, alimenta a corrupção e a
criminalidade comum. “Os três problemas estão vinculados. Não adianta tratar de
um sem tratar dos demais”, diz Moro. O ministro explica que parte dos
homicídios estão relacionados, por exemplo, à disputa do tráfico de drogas ou
dívida de drogas. Além disso, a corrupção drena recursos públicos que são
necessários para combater o crime comum nas ruas.
Antes de apresentar o pacote anticrime
publicamente, Sergio Moro mostrou as propostas nesta segunda-feira (4) para
governadores e secretários estaduais de Segurança Pública. O objetivo é
conseguir apoio deles para que as propostas sejam aprovadas no Congresso. A
proposta também foi apresentada nesta segunda-feira ao presidente da Câmara,
Rodrigo Maia (DEM-RJ). Segundo Moro, a ideia é que o pacote anticrime seja
aprovado num prazo curto – ou pelo menos médio. “Eu acho que há uma receptividade
no Congresso”, diz Moro.
O pacote deve ser enviado à Câmara após a
recuperação do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que acaba de passar por uma
cirurgia."
Título e Texto: Kelli Kadanus e Fernando
Martins, Gazeta do Povo, 4-2-2019
Sérgio Moro, ministro da
justiça e segurança pública do governo Bolsonaro, apresenta projeto de Lei
Anticrime
Janaína Paschoal: pacote anticrime de Moro é 'divisor de águas'
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