Decorridos cem dias após a posse, como é
possível avaliar o governo de Jair Bolsonaro e o que se pode esperar nos
próximos meses?"
![]() |
Foto: Evaristo Sá/AFP |
Desde o período eleitoral – e mesmo,
em alguns casos, durante sua trajetória política –, Bolsonaro adotou uma
postura firme em relação ao combate à criminalidade, declarou sua adesão aos
valores da família e da pátria e mostrou-se ferrenho opositor da forma como era
conduzida a política em Brasília – constantemente manchada com escândalos de
corrupção. O presidente sempre apresentou suas convicções com sinceridade, às
vezes até demais.
Devido a algumas declarações sobre o
período da ditadura militar, muitos duvidavam que Bolsonaro pudesse se pautar
por valores claramente democráticos e liberais, mas sua atuação como presidente
tem dado mostras do contrário.
Ninguém se sentiu traído ao comparar o
atual presidente com o candidato à Presidência. Ele, de fato, possui uma
autenticidade que tem o seu atrativo, mesmo às vezes sendo um pouco turrão. Sem
querer ser redundante, Bolsonaro é o que ele é. Com a sua personalidade,
conseguiu dar expressão a uma série de valores importantes e que não
encontravam espaço na vida pública brasileira, o que foi fundamental para o
fomento de novas ideias e práticas no campo político nacional.
Nenhum governante está imune a
limitações, porém Bolsonaro as apresenta em uma proporção que não deve ser
desprezada. Oriundo do chamado “baixo clero” da Câmara dos Deputados, o
presidente não teve nenhuma experiência pregressa como administrador, e tampouco
como articulador político presidindo alguma comissão importante do Legislativo.
Essa inabilidade de gestão ficou
patente nesses primeiros cem dias: foi incapaz de entender a diferença entre
articulação e “velha política”, soltou informações importantes antes da hora e
que tiveram consequências públicas ruins, não soube muitas vezes comunicar bem
suas prioridades e tratou de forma pouco profissional alguns membros da equipe
– como no caso da exoneração do então ministro da Secretaria-Geral, Gustavo Bebianno.
É de se notar, também, a forma pouco republicana com que os filhos do
presidente têm atuado no executivo, sem que este manifeste qualquer
desaprovação. Em outras palavras, cometeu erros que denotam uma liderança ainda
não amadurecida, para dizer o mínimo. Bolsonaro saberá superar isso nos
próximos meses? Essa questão é determinante para sabermos os rumos que o país
pode tomar.
Quando, por sua natureza, o trabalho
do presidente passa ao largo dessas limitações, o governo tem mostrado sinais
promissores. Boa parte dos nomes indicados aos ministérios tem apresentado um
bom trabalho à frente de suas pastas, confirmando a sua convicção de que a
escolha de perfis técnicos para trabalhar no governo dá resultado.
Podemos destacar ainda o sucesso dos primeiros passos das privatizações, como a concessão da ferrovia Norte-Sul e dos leilões dos aeroportos. Na mesma linha, o Ministério da Infraestrutura tem dado seguimento a muitas obras que estavam paradas e que podem dar novo fôlego à economia brasileira.
Há muitas coisas boas avançando, mas
voltemos ao tema central. O que prevalecerá: a defesa de valores caros aos
brasileiros unida a uma autenticidade que encantou parte do eleitorado, ou os
defeitos e limitações já apontados, que têm o potencial de envenenar toda a
complexa engrenagem política de Brasília?
Os grandes desafios que o país tem
pela frente vão exigir um conjunto não desprezível de condições favoráveis, a
começar por uma liderança capaz de inspirar, mobilizar e superar-se. As
deficiências no modus operandi do presidente podem, sim, deteriorar o bom
funcionamento da máquina pública e as relações entre os poderes. Pode
acontecer, no entanto, que os outros atores políticos compreendam e assimilem o
peculiar estilo de Bolsonaro, adaptando-se a ele e conseguindo, a partir daí,
encontrar um caminho para levar as reformas de que o país necessita a bom
termo. Pode ainda suceder que o próprio presidente aprenda rápido e consiga
superar parte importante de suas deficiências. Seria irreal pensar em todas,
mas talvez possa haver progressos naquelas que estejam se apresentando mais
problemáticas para o bom andamento do governo. Melhor ainda se as duas últimas
hipóteses se fundirem.
A reforma da Previdência é um
primeiro grande teste. Primeiro e talvez último. Não há alternativa senão
aprová-la. E é nesse desafio que se forjará em grande medida o futuro do atual
governo.
Jair Bolsonaro poderá ser relembrado
como o presidente de um importante período de transição para um Brasil mais
próspero, ou como mais um fracasso retumbante na história política brasileira.
A expectativa de todos é pela primeira hipótese. A resposta para todas essas
indagações está em grande medida nas mãos dele mesmo.
Título e Texto: Editorial, Gazeta do Povo, 9-4-2019
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-