Lucy Pepper
Há muitos portugueses a fazer
coisas importantes, aqui e lá fora. Nos negócios, na ciência, nas artes. Será
que têm de viver até aos 106 anos para merecerem uma menção na imprensa
internacional?
Não é frequente Portugal ser
notado no resto do mundo, a não ser como aquele país que actualmente tem um
pouco menos de problemas financeiros do que a Grécia. É verdade que aparecem
agora uns artigos nas secções de viagens dos jornais a proclamar as novas
virtudes de uma “fashionable” Lisboa, mas quase nenhuma palavra sobre qualquer
outra coisa portuguesa.
As vezes, ajudo uma amiga que
guia turistas em Lisboa, quando lhe acontece ter um grupo demasiado grande, não
vá ela perder um turista pelo caminho. Tento sempre explicar um bocadinho de
história, enquanto passamos pela Câmara Municipal, pelo Terreiro do Paço, ou
pelo Largo do Carmo. E sim, preocupo-me em acertar nas datas.
Mencionei um dia que um rei
tinha sido assassinado no Terreiro do Paço. “Uau! Isso foi recente?”. Noutro
dia, no Largo do Carmo, falei da revolução de 1974. “Vocês tiveram uma
revolução? Espantoso!”. Aponto para a Margem Sul. Pergunta: “Além já é outro
país?”.
Ontem, perguntei a umas
turistas (como disclaimer, disse-lhes que ia escrever esta crónica, e elas
concordaram em ser questionadas rigorosamente): “Sabem quem é o primeiro
ministro de Portugal?”. “Não fazemos a mínima ideia. A única coisa portuguesa
que conhecemos é o Cristiano Ronaldo, e nem gostamos de futebol”.
É estranho, no entanto, que
quase todos tenham ouvido falar do terramoto de 1755. A história deve constar
do primeiro parágrafo do guia que desfolham no avião, mas muitos saem do mesmo
avião vestidos de calções e sandálias em Janeiro, e ficam espantados quando
descobrem que não falamos espanhol.
Claro que nada disto é uma
surpresa, porque quase ninguém lá fora sabe muita coisa de Portugal, como já
aqui disse várias vezes. Para ser justa, a maior parte de nós também não sabe
quase nada sobre outros países igualmente pequenos. O que sabemos, digamos, da
Dinamarca, da Estónia, ou da República Checa? De qualquer modo, irrita-me esta
falta de conhecimento. Portugal não está escondido, não está esmagado no mapa
entre outros países maiores. É o nariz proeminente da Europa, dirigido para o
mar, e foi Portugal quem cheirou muito do resto do mundo. As pessoas bem que
podiam lembrar-se pelo menos disto.
Foi por isso uma agradável
surpresa que, na semana passada, Portugal tivesse sido referido na imprensa
estrangeira. A morte de Manoel de Oliveira foi anunciada na BBC, no Guardian, no Telegraph, no New York Times,
e o mundo lembrou-se de que Portugal, sim, tem pessoas que superam a mediania.
E foi uma surpresa ainda maior que, no mesmo dia, José Silva Lopes tivesse sido
homenageado por Paul Krugman no New York
Times.
Dois homens morreram e
Portugal foi notícia. Parece estranho. Não creio que muitas pessoas, além de
alguns adeptos extremos de cinema, conhecessem Manoel de Oliveira, e ainda
menos que soubessem da existência de Silva Lopes, mas ambos figuraram na
imprensa internacional. Acho bem. É bom Portugal ser conhecido por ter seres
humanos que fizeram coisas interessantes, e que eram amados e admirados pelas
pessoas da sua terra. É bom que isso seja notícia.
Mas onde está o reconhecimento
dos outros seres humanos portugueses e das outras coisas portuguesas (sem ser o
pastel de nata)? Há muitos portugueses a fazer muitas coisas importantes, aqui
e lá fora. Nos negócios, na ciência, nas artes. Alguém fala deles? Não. Será
que têm de viver até aos 106 anos para merecerem uma menção? Provavelmente.
E como é empobrecedor para
Portugal e para o resto do mundo que a única notícia “boa” de Portugal lá fora
seja, normalmente, Cristiano Ronaldo, aparentemente o único português vivo de
que o resto do mundo ouviu falar, mesmo se não gosta de futebol.
Bem, pelo menos sempre terei
muitas coisas para contar às pessoas sobre Portugal. As coisas que eles não
sabem, ou seja, tudo.
Duas coisas a comentar:
ResponderExcluirPrimeiro, o desconhecimento abissal sobre tudo que não lhes diz respeito, na grande maioria dos seres humanos, que desemboca em estupidez como não saber qual a língua que se fala no país que se está visitando.
Segundo a clarividência de se não souber qual o idioma para onde viaja, pesquise naquele aparelhinho que vive colado nas suas mãos ou na sua cabeça. Ele não serve só para falar mal do seu amigo ou para bater papos desconexos.
O resto, é estupidez, boçalidade ou qualquer outro adjetivo que prefiram.
José manuel