segunda-feira, 11 de abril de 2016

Campanha da Rede, de Marina, é oportunista e mentirosa

Não é verdade que Marina queira eleições diretas; ela aposta na continuidade de Dilma porque está de olho no espólio do PT
Reinaldo Azevedo
Vi ontem as inserções da Rede no horário político gratuito. O partido, que não aderiu ao impeachment, preferiu o oportunismo explícito. Diz apostar na cassação da chapa Dilma-Temer no TSE e pede novas eleições. Chega a dar nojo porque Marina Silva e seus “marineiros” (fico até meio constrangido de escrever essas coisas) sabem que isso não aconteceria, se acontecesse, antes de 2017. Eventual impedimento de presidente e vice nos dois anos finais de mandato resultariam em eleição indireta. Já chamei atenção para isso no blog muitas vezes (textos de arquivo aqui).

Em muitos aspectos, Marina me irrita mais do que os petistas. Ocorre-me apelar a Shakespeare, que punha frases definitivas até na boca de vilões, não é? No caso, adapto o perverso Iago. O PT nos rouba a bolsa — e, assim, rouba-nos o lixo. E ladrões têm, sim, de ir em cana. Marina nos rouba o bom senso. Leva o que não a faz rica e ainda nos deixa pobres de verdade.

De resto, ela não está sendo sincera quando diz querer novas eleições. Então quer o quê? Desvendei o seu segredo numa coluna publicada no dia 22 de janeiro na Folha, intitulada “Sapos, bagres, pererecas e outros bichos”. Permito-me transcrever trechos. Volto para encerrar.

“Não em razão do tamanho do seu partido, mas do número de votos que obteve nas duas últimas eleições e do espaço que ocupa na imprensa, Marina Silva, a líder da Rede, se tornou a principal força auxiliar da presidente Dilma Rousseff. Nem boniteza nem precisão, mas esperteza. Aquele jeitinho de quem só toma vitamina de chuchu com rúcula esconde um modo bem cruento de fazer política.
(…)

[Marina] Concedeu uma entrevista a esta Folha em que abusou do incompreensível a serviço do etéreo. Sua glossolalia política é capaz de produzir coisas como esta: “Impeachment não se fabrica; ele se explicita em função dos fatos que o justificam”. É mais ou menos como dizer que uma peça de mortadela se explicita em função das coisas que a justificam como peça de mortadela. Marina sempre se esforça pra me matar de tédio. Ainda bem que existe a vodca.

A líder da Rede não quer o impeachment porque prefere Dilma se esvaindo no cargo. Pouco se lhe dá se o Brasil terá dois anos consecutivos de recessão perto de 4%, depois de ter crescido 0,1% em 2014 e às vésperas de ter crescimento zero em 2017. Pouco importa a Marina que o país vá para o brejo, junto com os sapos, os bagres e as pererecas. Um PT em frangalhos e uma Dilma que mal consiga pôr o nariz fora da porta são essenciais para seu projeto pessoal em 2018. Só por isso ela não quer o impeachment e também decidiu que Temer é o inimigo.

No domingo, do nada, Marina e seu partido afirmaram que, caso o atual vice venha a ser presidente, há o risco de a Lava Jato ser paralisada. Por quê? Não há explicação. É puro terrorismo. Ela raramente se explica. Emite fatwas, com os seus xales descolados de tecido cru, seu coque severo e sua magreza que parece aspirar à santidade.

Não leu “Júlio César”, de Shakespeare. Deveria fazê-lo. O Número Um de Roma diz a Marco Antônio que mantenha Cássio, o magro, longe dele: é “seco por demais”, “pensa muito”. À sua volta, diz, só quer gordos de cabelos luzidios. Não faço juízo de valor a partir de aparências. Só estou, como se passou a dizer nestes tempos, “problematizando a narrativa” do falso ascetismo, bastante sedutora nesta era pós-leitura.

O que dizer a Marina Silva? Esperteza demais, especialmente quando vazada naquela Niágara de substantivos abstratos e sintaxe rocambolesca, acaba engolindo a dona. Como já engoliu.

Dados os crimes de responsabilidade cometidos por Dilma, e esses são óbvios (isso se chama “base jurídica”), e a incapacidade da presidente de tirar o país do buraco – ao contrário: ela o afunda ainda mais (e isso se chama “questão política”) –, a única coisa sensata a fazer é aderir ao impeachment. A menos que um valor mais alto do que o país se alevante.

Marina acha que a única coisa sensata que pode acontecer é ser ela a presidente do Brasil. Apela, como de hábito, a substantivos celestes, mas de olho em coisas bem mais terrenas. A turma que toma vitamina de clorofila se extasia e tem visões do paraíso.

Mesmo com o país no brejo dos sapos, dos bagres e das pererecas.”

Retomo
Como a gente nota, essa Marina da “Rede”, desse mundo virtual que iguala com tanta facilidade pérola e porcos, já era manjada por Shakespeare, né? Que ela engane ainda hoje muita gente, eis uma evidência de que não se perdem tempo, dinheiro ou ambos apostando na tolice alheia.

“E por que apostar na sabedoria alheia, Reinaldo?” Por uma questão de imperativo ético, de bom gosto e de vergonha na cara.
Título e Texto: Reinaldo Azevedo, VEJA, 11-4-2016

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