Vitor Cunha
O discurso de Passos Coelho
que abriu o congresso versou dois ângulos: o trabalho feito no governo e o
futuro. Estava a ouvir o discurso, que foi longo, e antecipei, mal começou, a
reacção da generalidade dos média: sobre o passado diriam algo como “o passado
já lá vai” e sobre o futuro diriam que Passos está “preso ao passado, que já lá
vai”.
De facto, o que se passou, foi
que Passos Coelho venceu as eleições. Ele sabe-o e, por muito que se dê palco
ao actual governo para propagar a extrema necessidade (“pelo bem do país”) de
renovar a liderança da oposição – coadjuvado pela prova de vida que alguns
críticos aproveitam para fazer nestas alturas -, Passos assume estar na
oposição contra a vontade expressa dos eleitores, num novo paradigma eleitoral
que implica a renovação da proposta política desta liderança do PSD, na
oposição.
Ao propor uma reforma do
sistema eleitoral, assumindo ser esta a altura adequada pela inexistência de
eleições legislativas no futuro próximo, demonstra ter assumido, em pleno, o seu
papel de líder da oposição, retirando qualquer argumentação sobre compassos
tácitos de espera pela destruição, por ferrugem, da geringonça.
De certa forma, apesar do uso
do termo “renovação”, ficou claro que o que se espera é uma reafirmação do
caminho traçado no governo, o de que nos compete, a nós, portugueses, a tarefa
de limpar a casa, não o catastrófico discurso papagueado pelo governo que
consiste em esperar que o BCE, a União Europeia ou o Pai Natal façam por nós o
que nos compete. Mais que noções vagas sobre esquerda e direita,
“social-democracia” ou “neoliberalismo”, a renovação proposta parece ser,
exactamente, entre a estratégia que assegura um futuro europeu para Portugal,
através de competitividade e reforma real da crescente burocracia castradora e
a estratégia do governo, que assegura um futuro para o clientelismo do aparelho
de Estado até à próxima explosão que termina sempre com um muito cínico “eu não
tenho culpa”.
Título e Texto: Vitor Cunha, Blasfémias,
2-4-2016
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