João Pereira Coutinho
Passam 100 anos sobre a
revolução bolchevique – e a Rússia optou por não comemorar a data. Vladimir
Putin, manifestamente, não gosta de concorrência desleal. E é provável que os
russos não tenham uma opinião favorável sobre um regime que matou vinte milhões
de compatriotas – e escravizou um continente inteiro. Como diria Lenine, que
fazer?
Sugestão pessoal: enviar para
Moscovo a prosa hagiográfica que se produziu em Portugal na efeméride. Estamos
em 2017. Mas é possível encontrar ainda um partido comunista “ortodoxo” (na
teoria, não na prática) – e dezenas de “intelectuais públicos” que, em jornais
ou revistas, sem falar no circo televisivo, recusam “simplismos”. Na peculiar
cabeça desta gente, a catástrofe do comunismo não pode apagar a sua “mensagem
de esperança”. Imagino que dirão o mesmo em 2033, no centenário da chegada de
Hitler ao poder: o que é o Holocausto quando a Alemanha mostrou que é sempre
possível renascer das cinzas?
Se os russos lessem a prosa da
nossa gente, talvez curassem a respectiva ingratidão. E, quem sabe, talvez
soubessem o que fazer com o corpo embalsamado de Lenine, que permanece no seu
mausoléu à espera de dias melhores (digamos assim).
Este ano, um grupo de
deputados voltou a propor o enterro do cadáver. A coisa é macabra, a maioria
dos russos já deu para o peditório e, por falar em peditório, os cento e
sessenta mil euros anuais de manutenção não compensam.
O partido comunista local
opõe-se. E Putin, para não comprar guerras desnecessárias, prefere não tocar
neste infecto assunto. Serei o único a vislumbrar um compromisso?
Se o cadáver de Lenine
continua a ser controverso, o melhor era despachá-lo diretamente para Portugal.
A julgar pela idolatria reinante, a exibição do homem seria um sucesso bem
maior do que qualquer Web Summit.
Texto: João Pereira Coutinho, SÁBADO,
nº 706, de 9 a 15 de novembro de 2017
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