Alberto Gonçalves
Prosseguem as afrontas da
Jerónimo Martins ao carácter sagrado do Primeiro de Maio. Não satisfeita com a
campanha blasfema realizada no santo dia, que desviou milhares de trabalhadores
dos seus deveres de fé e os levou a disputar ao tabefe torradeiras e sardinha
em lata, a reacionária empresa responsável pelos supermercados Pingo Doce
resolveu alargar o desconto de 50% aos funcionários da casa de serviço à data
e, para cúmulo, pagar-lhes a data a 500% do valor devido. Naturalmente, o sr.
Arménio da CGTP incitou os funcionários a rejeitar “este tipo de atitude fascistóide”
e o bravo Sindicato dos Trabalhadores do Comércio (CESP) já apresentou uma
queixa a quem de direito.
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Cadeia de exploração e opressão do PD |
Não percebi se os
antifascistóides querem ver o repugnante desconto alargado a todos os
assalariados do Pingo Doce ou se querem ver todos os assalariados do Pingo Doce
privados do repugnante desconto. Também não percebi se a indignação sindical
abrange os 500% adicionais ou não. Percebi que o CESP protesta contra o
favorecimento dos sujeitos que exerceram funções no Primeiro de Maio em
detrimento dos que se encontravam em greve.
E protesta muito bem.
Nesta época de capitalismo selvagem e
neoliberalismo depravado (a ordem dos adjectivos é comutativa), é fundamental
haver alguém a lembrar que os trabalhadores são exactamente iguais, trabalhem
imenso ou façam nenhum, sejam assíduos ou adiram a 16 paralizações mensais,
ajudem à produtividade total ou a sabotem por pirraça ideológica. Caso
contrário, acabaríamos a premiar o mérito e o esforço, projecto de loucura
susceptível de reduzir a cinzas o nosso sistema laboral, arrasar a tradição que
o sindicalismo e uma longa linhagem de governantes hoje representada pela
menina Assunção se empenharam em defender e, pior, fulminar a própria natureza
do País. Sem uma profunda crença na igualdade, incluindo a igualdade entre
gente honesta e rematados calões, Portugal seria só as três sílabas do poema.
Ou sílaba e meia, se o Pingo Doce pudesse.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, revista “Sábado”, nº 419, de 10 a
16-05-2012
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