João Bosco Leal
Com o veículo parado diante de
um semáforo, percebi uma pessoa correndo por uma avenida onde eu entraria assim
que o mesmo voltasse para o sinal verde, com as duas mãos na cabeça e
dirigindo-se ao centro do cruzamento da rua em que eu estava com a avenida,
onde haviam diversos objetos esparramados pelo chão.
O homem começou então a
recolher e colocar na calçada tudo o que podia em meio ao movimento de carros
que por lá passavam, uns desviando, outros passando por cima de objetos ou
buzinando, vi que eram caixas com os mais variados pertences.
Identifiquei um espelho de mão
quebrado, algumas canetas, papéis voando em meio a cada um dos veículos que por
lá passavam, uma escova e um secador de cabelos, um boné, camisetas, blusas,
enfim, uma variedade de coisas que me deixavam intrigado sobre o que teria
ocorrido.
Algumas caixas pretas de
plástico estavam quebradas e seus pedaços esparramados pelo chão quando veio
outro homem, provavelmente companheiro do primeiro, pois também desceu a
avenida correndo do mesmo local de onde viera o outro e com este foi conversando
e já ajudando a recolher mais coisas.
O semáforo abriu e enquanto
cruzava lentamente a avenida, já mais próximo do local, pude perceber melhor o
que ocorrera. Um pequeno caminhão levava uma mudança e quando fez a curva
saindo da rua onde eu estava para entrar na avenida, de sua carroceria caíram
dois gaveteiros de plástico que se quebraram ao bater no chão.
Imediatamente lembrei-me de um
conto que havia lido há muito tempo onde um morador de um edifício fazia sua
mudança de um apartamento para outro no mesmo prédio e pouco a pouco levava
pessoalmente seus pertences. As roupas eram transportadas nos próprios cabides,
caixas levavam panelas pratos e talheres, pequenos objetos e tudo o que pudesse
levar com os próprios braços ou no carrinho de compras do prédio.
Em uma dessas vezes entrou no
elevado já cheio de pessoas carregando uma gaveta de seu criado mudo com tudo o
que tinha dentro dela, mas que sequer tinha olhado o que era.
Segurando-a com as duas mãos,
notou que as pessoas olhavam para a gaveta com tanta curiosidade que também
dirigiu para ela o seu olhar. Viam ali expostas muitas de suas coisas de uso
pessoal, como um cortador e uma lixa de unha, um chaveiro antigo, um estojo de
fio dental, uma tesoura de unhas, uma caneta, bilhetes que nem lembrava mais
quem os havia enviado, vários envelopes de preservativos e outros objetos
inconfessáveis. Uma situação constrangedora, que não havia mais como ser
reparada ou escondida.
Os dois casos me fizeram
pensar em como acabamos guardando histórias em gavetas. Quantos papéis,
documentos, bilhetes, lembretes, fotos ou diversos outros objetos guardamos em
nossas gavetas e nunca mais vemos? Quantas vezes ao abrir uma gaveta nos
surpreendemos, com objetos que nos fazem lembrar coisas passadas que já haviam
sido apagadas de nossa mente ou nos mostram algo que sequer lembrávamos
possuir? Quantos segredos podem ser revelados em uma gaveta de criado mudo?
As gavetas são como um arquivo
morto de nossas vidas. De tempos em tempos é necessário reabri-las e delas
retirar o que não serve mais, que não necessitamos ou que já não será usado.
Nelas encontramos coisas que
gostaríamos ou não de lembrar e objetos que mesmo não nos sendo úteis, servirão
para outras pessoas que deles necessitam. Uma ótima oportunidade de realizarmos
atos de caridade, tão necessários na vida de todos.
Abra suas gavetas e reveja sua história, jogando fora as coisas sem
valor, doando o que outros necessitam e lá deixando só o que realmente merece
ser lembrado e guardado.
Título, Imagem e Texto: João Bosco Leal
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Não publicamos comentários de anônimos/desconhecidos.
Por favor, se optar por "Anônimo", escreva o seu nome no final do comentário.
Não use CAIXA ALTA, (Não grite!), isto é, não escreva tudo em maiúsculas, escreva normalmente. Obrigado pela sua participação!
Volte sempre!
Abraços./-