A prisão de Bolsonaro não ocorreu por causa da tornozeleira, mas pelo planejamento que nunca houve de um crime que não foi cometido
Mario Sabino
Para a surpresa de ninguém, os colegas de Turma do ministro Alexandre de Moraes votaram para manter a prisão preventiva de Jair Bolsonaro.
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| Imagem: Siegfried Albuquerque, Facebook |
O enredo todo é estranho, e a
prisão não foi decretada por causa da tentativa de violação da tornozeleira
eletrônica, mas pelo planejamento que nunca houve de um crime que não foi
cometido.
Na sua ordem de prisão, Alexandre de Moraes alega que a vigília de orações em prol de Bolsonaro, convocada pelo filho Flávio, visava a repetir o modus operandi dos acampamentos golpistas de janeiro de 2023. Na adivinhação do ministro, seria para causar tumulto e facilitar a fuga do ex-presidente da prisão domiciliar.
Para compor a sua peça,
Alexandre de Moraes recorre aos casos dos fugitivos Carla Zambelli, Eduardo
Bolsonaro e Alexandre Ramagem e também à história de que Jair Bolsonaro cogitou
pedir asilo à Argentina.
O ministro também afirma, na
justificativa da prisão preventiva de Jair Bolsonaro, que a embaixada dos
Estados Unidos é próxima da casa do ex-presidente (13 quilômetros de distância)
e que poderia ser alcançada em 15 minutos.
A tentativa de violação da
tornozeleira aparece apenas na 14ª página de uma decisão de 17 páginas, em um
parágrafo que começa com um “além disso”, no qual não há nenhuma referência à
forma como se deu essa tentativa.
No frenesi de sábado, a imprensa tentou transformar a tentativa de violação da tornozeleira em principal motivo para a decretação da prisão preventiva, mas, ao que tudo indica, ela foi enfiada às pressas no despacho de Alexandre de Moraes, depois que o texto da ordem de prisão já estava pronto. A tentativa só veio a calhar para maquiar a aparência da arbitrariedade, desde que não se entrasse em pormenores, que nada têm de menores.
É curioso, para não dizer
assombroso, que ela apareça lateralmente, quase como nota de rodapé, porque a
tentativa de violação da tornozeleira, e a imprensa notou isso logo, embora não
tenha dado o braço a torcer, seria o único motivo razoável para que a prisão
preventiva pudesse ser decretada, uma vez que constitui falta grave.
Mesmo assim, antes da tomada
de qualquer decisão da parte do ministro, ele deveria ter ouvido os argumentos
dos advogados de Jair Bolsonaro, o que só foi feito após a decretação da prisão
preventiva.
Solitária como a estrela do
Botafogo, a razão possivelmente concreta para a ordem drástica de Alexandre de
Moraes é também o fato que desmonta de vez a tese de que a vigília de orações
foi convocada para facilitar a fuga do ex-presidente da prisão domiciliar.
Isso, claro, se houvesse
alguém na imprensa disposto hoje a desmontar qualquer decisão do Supremo quanto
a Jair Bolsonaro, a maior causa dos males nacionais, de acordo com todos os
democratas brasileiros. Tudo bem, vou para o abate na área dos comentários
sempre elegantes que acompanham esta coluna.
Atente-se à cronologia dos
fatos. O alerta de que havia algo de errado na tornozeleira foi aceso passados
oito minutos da meia-noite do sábado. Constatou-se que Jair Bolsonaro havia
queimado a caixa do equipamento, não a tira que o mantém preso à sua perna, e a
tornozeleira foi trocada logo em seguida.
Tentativa de violação por
volta da meia-noite, muito bem. A vigília de orações, por sua vez, foi
convocada por Flávio Bolsonaro para começar depois das 19h do sábado. Está lá,
naquele vídeo com a fala do senador que emana eflúvios do Antigo Testamento.
Se você ainda não se
perguntou, eu me pergunto: que plano estrambótico era esse, segundo o qual Jair
Bolsonaro se livraria da tornozeleira quase vinte horas antes de começar uma
movimentação popular supostamente feita sob medida para criar uma confusão que
propiciasse a fuga dele?
Aliás, a cronologia não
sustenta a ordem de prisão, nem tampouco a distância que separa o local marcado
para a vigília de orações da entrada do condomínio onde fica a casa de Jair
Bolsonaro: bem mais de meio quilômetro de distância.
É isto, senhoras e senhores: a
PF, a PGR e o ministro Alexandre de Moraes convenceram a torcida já convencida
de antemão de que Jair Bolsonaro fugiria depois de quase vinte horas da
violação da tornozeleira, esperando que ela não fosse notada e aproveitando-se
de um tumulto causado pelo que seria uma falsa vigília de orações a ser feita a
mais de cinco campos de futebol do condomínio onde o ex-presidente mora.
Imagino que, na suposição
extravagante dos envolvidos na decretação da ordem de prisão, a fuga de Jair
Bolsonaro seria à la O.J Simpson: o ex-presidente fugindo a alta velocidade em
direção à embaixada americana, com a PF no seu encalço tarde demais para evitar
que ele entrasse em território diplomático inviolável, a cena toda filmada de
helicóptero.
Talvez, na imaginação ainda
mais afoita de alguns dos nossos defensores da lei e da ordem, pudesse até
ocorrer troca de tiros entre agentes federais e os marines que fazem a
segurança da embaixada, enquanto o carro do ex-presidente atravessava o portão
do prédio aberto às pressas. Mission accomplished, Mr. President.
A defesa de Jair Bolsonaro
disse que o ex-presidente estava em surto quando tentou abrir a tornozeleira,
efeito colateral dos remédios que lhe foram prescritos. Achava que havia uma
escuta dentro do equipamento e que jamais cogitou fugir. Como ele não tentou
arrancá-la da sua perna e dada a personalidade naturalmente paranoica de Jair
Bolsonaro, a explicação faz sentido.
Já o único sentido da ordem de
prisão preventiva, na minha cada vez mais modesta e temerária opinião, foi o de
minorar o sentimento de impotência de quem deixou Alexandre Ramagem fugir para
os Estados Unidos (Carla Zambelli e Eduardo Bolsonaro entraram para dourar a
pílula). Era preciso mostrar que não se brinca com os homens — e, não menos
importante na demonstração de força, encontrar justificativa para negar o
pedido da defesa de Jair Bolsonaro de prisão domiciliar no cumprimento da pena
de mais de 27 anos por golpismo.
Nem que para isso fosse
imperioso criminalizar a liberdade garantida pela Constituição de cidadãos espernearem
contra decisões da Justiça, inclusive cidadãos bolsonaristas. E a vigília foi,
assim, adivinhada como ato criminoso, ilícito, atentatório ao Poder Judiciário,
que não parece estar mais nem abaixo do Poder Divino, a julgar pelo tom e pelos
adjetivos usados pelo ministro. Aliás, diga-se, nem tanto de passagem, que o
senador Flávio Bolsonaro também virou cabra marcado, visto que teria convocado
ato criminoso a ser perpetrado por organização idem — a saber, o bolsonarismo
militante. A Constituição, ora a Constituição, desde 2019 ela só vale para quem
merece.
Título e Texto: Mario Sabino,
Metrópoles,
24-11-2025, 19h22
Desembargador convoca paralisação do país após prisão de Bolsonaro
24-11-2025: Oeste sem filtro – Turma de Moraes mantém Bolsonaro preso + Messias tenta contornar resistência de Alcolumbre para garantir vaga no STF + Lula afirma que consegue até beber biodiesel da Petrobras
Evidências de fuga⁉️
O custo da omissão
“Trouxeram os fascistas! Trouxeram os fascistas!”
“Eu não ia ficar no Brasil vendo minhas filhas, me vendo ser preso sem ter cometido crime algum"
Em resumo, a fundamentação “psicopática” de Moraes para a prisão de Bolsonaro neste dia 22:
A terceira facada em Jair Bolsonaro
Desvivendo Bolsonaro

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