Aleksandr Soljenítsin
“Trouxeram os fascistas! Trouxeram os fascistas!” – não
era só em Nova Jerusalém que gritavam assim
Não havia quem os
substituísse! – e nós, os pobres cegos de nascença, ainda ousamos, toda a
Primavera e todo o Verão, nas nossas celas calafetadas, esperar uma anistia!
Que Estaline se apiedaria
de nós!... Que ele “teria em conta a Vitória!”… Que nos tendo omitido na
primeira anistia de julho, daria depois uma segunda anistia especial para os
políticos…
Mas se nos agraciasse a nós,
quem desceria às minas? Quem iria para a floresta de serras nas mãos? Quem
cozeria os tijolos e os assentaria nas paredes?
“Trouxeram os fascistas!” Os
de direito comum, que sempre nos odiaram ou desprezaram, olhavam agora para nós
quase com amor, porque os vínhamos substituir.
Aqui está o que foi a grande anistia estalinista, como “nunca se viu no mundo”.
Na verdade, onde é que se viu uma anistia que não
abrangesse os presos políticos?!
Foram pura e simplesmente libertados todos aqueles que assaltaram apartamentos, despiram os transeuntes, violaram raparigas, corromperam menores, enganaram clientes, vigarizaram, estropiaram pessoas indefesas, praticaram caça e pesca furtivas, praticaram a poligamia, a extorsão, a chantagem, a corrupção, a fraude, a calúnia, a denúncia falsa (esses nem sequer foram presos), traficaram narcóticos, os alcoviteiros, os proxenetas, os que causaram vítimas humanas por ignorância ou negligência (isto é nenhuma figura de retórica, estou simplesmente a enumerar os artigos do Código que figuravam na anistia).
Foi retirada metade da pena:
aos delapidadores, falsificadores de documentos e de senhas de racionamento,
especuladores e ladrões do Estado (em todo o caso, Estaline não gostava que
fossem ao bolso do Estado).
Mas nada exacerbou tanto os
antigos militares da frente e prisioneiros de guerra, como o perdão geral
aos desertores do tempo da guerra!
Todos os que foram cobardes,
fugiram das unidades, abandonaram a frente, não compareceram aos centros de
recrutamento, se esconderam durante muitos anos numa cova na horta da mãe, nas
caves, atrás dos fornos, transformando-se em animais curvados e hirsutos, todos
eles, desde que fossem capturados ou se apresentassem no dia da anistia – eram
agora declarados cidadãos soviéticos de pleno direito, sem cadastro,
imaculados. (Aqui está uma ocasião de confirmar a prudência do velho provérbio:
a fuga não é bonita, mas é salutar.)
Enquanto aqueles que não
tremeram, que não se acobardaram, que apararam o golpe pela pátria e pagaram
com o cativeiro, para esses não podia haver perdão, no entender do Comandante
Supremo.
Texto: Aleksandr
Soljenítsin, in “O Arquipélago Gulag”, páginas 257 e 258;
Digitação: JP, 23-11-2025
“Prometo a este fogo e prometo-te a ti, menina: todo o mundo irá saber disto.”
Mais experiências soviéticas…
Começou em 1918, na URSS-União das Repúblicas Socialistas Soviéticas…
[Livros & Leituras] O Arquipélago Gulag
Discurso de Alexander Soljenítsin em Harvard em 8 de junho de 1978
[Debates & Pesquisas] Você leu “O Arquipélago Gulag”?
"Arquipélago Gulag", de Aleksandr Solzhenitsyn, é uma obra-prima que escancara o horror produzido pelo comunismo
Lênin, Stálin e Hitler – A era da catástrofe social
Pedagogia do oprimido

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