segunda-feira, 23 de julho de 2018

[Para que servem as borboletas?] Nossas paixões...


Valdemar Habitzreuter

Quando nossa alma é afetada por coisas externas, também por pessoas com as quais entramos em contato, ou mesmo por pensamentos que partem internamente de nós, opera-se em nós  emoções donde nos advêm paixões, isto é, somos tomados por sentimentos; sofremos algum tipo de alteração em nossa alma, podendo expressar-se por alegria ou tristeza; entra nesse processo o desejo de sempre almejar a alegria, embora possa acontecer que sobrevenha a tristeza. Assim, paixão - passio em latim -, denota sujeição ou passividade ao bom ou ruim que nos afeta. Tudo depende de como nos deixamos influenciar pelas coisas ou pessoas que encontramos na caminhada da vida. Se os encontros são bons, a alegria nos sobrevém; se os encontros são maus, a tristeza se instala. Nossa natureza humana é munida da vontade de viver que, por sua vez, desperta desejos por múltiplas coisas e, assim, poder tocar a vida.

Todos almejamos uma vida longa. Mas, essa vida tem de ser alegre e não triste. É evidente que as paixões são parte da natureza humana e, por isso, não são erradicáveis; assim, devemos admiti-las e saber administrá-las. A questão difícil é: como administrá-las; na maioria das vezes não o sabemos e elas nos trazem tristeza e sofrimento. Falhamos porque deixamo-nos levar pela ignorância, ou seja, não temos um conhecimento adequado das nossas afecções.

A ignorância fica patente quando nos valemos da imaginação achando que possuímos um conhecimento fundamentado na certeza. Mas, imaginar não é conhecimento de causa. Imaginar é ter meras opiniões e deixar-se guiar por elas. Nesse sentido, quando estou alegre não analiso se este estado de alegria é consistente ou apenas uma euforia momentânea que pode transformar-se em tristeza logo em seguida.

O conhecimento inadequado da imaginação, de que tudo o que me afeta tem sua consistência na verdade, é falso; a verdade só se apresenta aos nossos olhos quando nos guiamos pela razão. Nossa razão sempre quererá saber como e por que surgiu tal sentimento – alegre ou triste - que ora me domina, qual sua causa, por que me sinto nesse estado? A razão sempre transita com ideias adequadas que proporcionam uma vida alegre. Mas, para isso é preciso entender o que significa conhecer pelas causas, que não é nada fácil.

Em primeiro lugar, temos que conceber que estamos inseridos num mundo de causalidades. Todo efeito provém de uma causa. A totalidade das coisas existentes no mundo são efeitos de causas que compõe o Universo. O Universo em si é a causa maior do qual tudo emana. A palavra ‘universo’ já denota isso: o Um vertendo-se em múltiplos modos, diversos (Uni+verso). O Universo é a Natureza criadora. Portanto, cada coisa tem um pedigree de primeira ordem, isto é, tudo é sagrado e bom dentro do infinito Universo.

Dar o nome Deus a esse Universo não é exagero, afinal é nele que tudo aflora. As coisas criadas são partes desse Todo que é o Universo, inclusive o ser humano que, no entanto, possui uma peculiaridade: tem ciência dos atributos de extensão e pensamento que são inerentes à natureza do Universo, aos quais ele está ligado.

Assim, a extensão é o corpo de Deus, e o pensamento é sua alma. O ser humano também dotado de corpo e alma é, por assim dizer, um microcosmo do Universo. E é aí que entra a plausibilidade do conhecimento pelas causas. Se Deus, ou a Natureza, só causa coisas boas, não pode haver o mal no mundo. É o ser humano que se permite um conhecimento confuso e inadequado, ficando estacionado na ignorância onde impera a superstição, o medo, os sentimentos tristes, levando-o a admitir o mal que julga conspirar contra ele. Compete ao homem, se quiser levar uma vida de alegria e amor, inteirar-se, ou melhor, progredir em conhecimento, fazer da razão uma paixão que o eleve cada vez mais em conhecimento e, assim, prossiga na busca adequadamente da alegria, levando-o a integrar-se na realidade divina e não se julgar uma parte isolada.

A razão, além de ultrapassar o conhecimento imaginativo, que se vale só da sensibilidade fugidia, deverá adquirir ainda um conhecimento mais elevado que é o conhecimento intuitivo, que, num relance, apreende a totalidade causal, que o leva a enxergar com os olhos de Deus, e o aspecto da eternidade se lhe depara aos olhos, onde a alegria e o amor são a paixão única da vida.
Título e Texto: Valdemar Habitzreuter, 22-7-2018

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