Dias atrás o jornalista
Alexandre Garcia abriu debate interessante, mesmo que involuntariamente. Negou
que haja onda conservadora no Brasil. Segundo ele, o que existe e sempre
existiu é um mar conservador tranquilo, sem ondas. São palavras suas: “Eu
diria que não há uma onda conservadora, o que sempre houve foi um mar
conservador, sem ondas, que estava encurralado pelos meios políticos de
informação. Houve também um domínio, nos últimos anos, dos chamados
progressistas que deixou os conservadores encolhidos e temerosos”.
Mar sem ondas, mar conservador
encurralado. Explicou melhor o pensamento: “Desde as escolas são postos
na cabeça [das pessoas], que um lado é bom e que o outro lado não é bom. Houve
uma censura que se cristalizou no chamado politicamente correto, que foi uma
forma de censura e uma forma de totalitarismo — que é a censura do pensamento —
porque as pessoas devem pensar conforme o padrão do politicamente correto”.
O politicamente correto,
cristalização de censura generalizada, a conhecida patrulha ideológica, observa
com objetividade Alexandre Garcia, é um totalitarismo no âmbito do pensamento.
É totalitarismo generalizado no Brasil, que deixou os conservadores “encolhidos
e temerosos”.
O jornalista atribui às redes
papel libertador do pensamento conservador: “Agora surgiu a libertação
e as pessoas descobriram as redes sociais. Elas viram que ali poderiam ter voz,
que ali teriam uma chance, que se expandiu e aí formou a onda. Pelas redes
sociais estamos livres para falarmos o que quisermos sem sermos tolhidos pela
censura do politicamente correto […], e essa liberdade conduziu a um resultado
eleitoral em outubro de 2018”.
Aqui, Garcia matiza o
pensamento; nas redes, à vera, ele observa ondas. Encrespadas, acrescento. E
contra elas se armou a patrulha, em especial nos meios de divulgação. Continua
ele: “Quando passaram a perceber que teria dois lados, começaram a
gritar que ‘polarizou, polarizou, polarizou’ e chegaram a chamar o outro lado
de radical e até de extremista, com medo da dialética e de ter um segundo
pensamento que acabaria com a monocracia”. Governo de um, monocracia, aqui
tem o sentido de imposição de pensamento único, uma espécie de “1984”. Lembra
deveras Georges Orwell, são espécies dos gêneros “novilíngua” e “polícia do
pensamento”, denunciadas pelo jornalista inglês.
Em resumo, existe no Brasil e
vem de longe um oceano conservador pacato; de momento temos ainda ondas
conservadoras encrespadas. Visto mais de perto, o oceano conservador é imenso,
retorna logo à calmaria, depois das borrascas e tormentas; mais, gosta dela e
para ela retorna, logo que possível. Público de hábitos simples, com escassas
possibilidades de se fazer representar na vida pública, tem o olhar posto na
família, bem como está desabituado a considerar longamente interesses além do
círculo doméstico. Preza a honestidade, a discrição, a palavra dada. Seu maior
entretenimento é o convívio, em especial no interior da família. Temperante por
atavismos, desagradam-no incontinências, desmandos, linguagem chula, palavrões,
insolências, agressões destemperadas. Desconfia de perspectivas e planos
mirabolantes. Tem, a bem dizer, nenhuma presença na vida pública, não é visto
nos meios de divulgação, não chama atenção na economia. Quanto representa do
total da população? Não sei, bem pode ser mais que a metade. Entre o mar
tranquilo e as vagas crispadas, o mais importante é o oceano sereno, ainda que,
as segundas apareçam mais, o primeiro seja quase nunca visto.
O Brasil mar tranquilo se vê
representado no Brasil ondas encrespadas? O tom agrada? O conteúdo convida à
adesão? A postura tranquiliza? Não, o Brasil divisado acima ainda se sente
órfão — pelo menos em larga medida. Ou, quase sempre, como é a sensação do
público, estamos em presença de contrafações.
E os votos? No dia da votação,
o eleitor não escolhe a comida preferida, é obrigado a escolher entre pratos
que lhe são apresentados. E existem as fraudes, os truques publicitários, em
geral desvelados depois que se fecham as urnas e começa o ramerrão do governo
ou as sessões legislativas. Em resumo, continua ainda enorme orfandade pairando
como sombra melancólica sobre todo o Brasil.
Há mais. A representatividade
aqui precisaria se manifestar antes em âmbitos socais e só depois se tornar
política e eleitoral. Seriam necessárias figuras de destaque na família, nas
escolas, no mundo do trabalho, que patenteassem nas ideias e comportamento o
que a metáfora do mar tranquilo procura dizer — serenidade, decência,
compostura. Enfim, tipos humanos que as representassem autenticamente. E em
etapa complementar, não sempre necessariamente cronológica, caminhassem para
ter relevância eleitoral e política.
Viro a página. Corria 1982,
coligação com tintura esquerdista havia ganho eleições no Brasil, na ocasião
governado pelo general João Baptista Figueiredo. Comentou o fato o Prof. Plinio
Corrêa de Oliveira em artigo na imprensa diária, de onde retiro um trecho
(“Folha de S. Paulo”, 14-12-1982): “Contento-me […] em destacar delas
[as eleições] um ponto em torno do qual, a meu ver, tudo gira. É ele de índole
muito mais temperamental do que ideológica, como, aliás, corresponde ao feitio
de nosso povo. [….] O brasileiro é cordato, e só gosta de assistir discussões e
brigas quando não são ‘para valer’ mesmo. Aí elas o encantam. É a hora da
torcida, do fuxico, da fofoca”.
Plinio Corrêa de Oliveira
tratou das possibilidades da esquerda e, a seguir, analisou também as
perspectivas para o centro e a direita, que são os setores dominantes na faixa
do público colhida pela metáfora do mar tranquilo: “O centro e a
direita só continuarão a representar um papel marcante na vida brasileira se
souberem adaptar-se a tal”. Adaptar-se ao fato de que o Brasil privilegia
pacatez, decência, compostura. Do contrário, com o tempo, o mar irá secando,
pode virar lagoa
.
Ele continua no mesmo
diapasão: “O Brasil de hoje quer absolutamente pacatez. Se a
esquerda vitoriosa não souber oferecê-la, esvanecer-se-á. Se o centro e a
direita não souberem conduzir sua luta num clima de pacatez, terá chegado a vez
deles se esvanecerem”.
E olha para o futuro: “Quem
ganhará: a direita? o centro? a esquerda? — Quem conhecer as verdadeiras fibras
da alma brasileira e souber entrar em diálogo pacato com essas fibras. Seja
governo, seja oposição, pouco importa. A influência será de quem saiba fazer
isto”.
Concluiu: “A hora [é] para as
discussões arejadas, polidas, lógicas e inteligentes. Os pacatos toleram tudo,
exceto que se lhes perturbe a pacatez”.
O futuro chegou, pelo menos um
futuro chegou. Fundamentalmente, o temperamento público do Brasil de 1982 é o
mesmo do agora existente em 2020. Morrerão na praia as ondas encrespadas se
deixarem perceber, mesmo ao lado de valores estadeados, ligadas às melhores raízes
do Brasil, destampatórios chulos, insolências, primarismo, falta de compostura,
agressões destemperadas de fundamentação convincente, ausência de decência.
Delas continuará distante o mar tranquilo. O público conservador continuará (ou
voltará a ser) encolhido e temeroso; o mar irá virando lagoa.
Uma nota final. Pelo que me
lembro, ninguém havia realçado antes a importância da pacatez na vida e
política brasileira; fator essencial. Comentário precioso, não o deixemos rolar
pela sarjeta.
Título e Texto: Péricles
Capanema, ABIM,
11-7-2020
“O Brasil de hoje quer absolutamente pacatez. Se a esquerda vitoriosa não souber oferecê-la, esvanecer-se-á. Se o centro e a direita não souberem conduzir sua luta num clima de pacatez, terá chegado a vez deles se esvanecerem”.
ResponderExcluirE olha para o futuro: “Quem ganhará: a direita? o centro? a esquerda? — Quem conhecer as verdadeiras fibras da alma brasileira e souber entrar em diálogo pacato com essas fibras. Seja governo, seja oposição, pouc eU P, Ao importa. A influência será de quem saiba fazer isto”. EU ACRESCENTARIA,O GROSSO DA POPULAÇÃO , O POVO NA SUA ESSÊNCIA ,NÃO QUER DIREITA OU ESQUERDA NEM CENTRO . ISTO É COISA DE INTELECTUAIS,POLITICOS E JORNALISTAS ENGAJADOS OU REMUNERADOS.
Jim, querido e inesquecível amigo,
ResponderExcluirMuito obrigado pela tua atenção.
Muito obrigado pelo "O CÃO QUE FUMA", diariamente me alimento com as informações que este teu espaço oferece. Leio, e muitas vezes releio, matérias com muito conteúdo, que nos fazem bem.
Há bastante tempo "cortei" minhas relações com a TV; me dedico a ler o que verdadeiramente me ajuda a crescer como ser humano.
TV por assinatura, TV aberta, esportes... hum... nos deixam afastados da realidade; diante disso, vamos prestigiar espaços, bons espaços como O CÃO QUE FUMA.
Martin L. King: "O que me preocupa não é o grito dos maus, sim, o silêncio dos bons".
Jim, o lado do bem está calado aqui no Brasil; nós não temos líderes para reagir.
Dr. Ricardo Nogueira, psiquiatra no Hospital Mãe de Deus, em POA, informou em entrevista que no período de janeiro 2020 até julho 2020, SOMENTE NO RS, aconteceram 583 suicídios; mas, o Governador Eduardo Leite está impassível, estamos todos confinados.
Particularmente estou bem, entretanto, fico comovido com o comércio e a indústria sendo abatidos, literalmente.
Jim, desculpa o longo discurso.
Um abraço grande deste teu velho amigo velho (sic).
Vilmar
Oi, véio amigo!
Desde o 707, lá pelos idos de 1973!!
Muito obrigado por prestigiar o nosso blogue. E, por favor, você não tem nada para se desculpar, imagina!
Procuro publicar notícias e artigos positivos sobre o Brasil. Ao mesmo tempo lutando, mesmo que microscopicamente, contra a esquerda que conheci em Brazzaville, entre 1967 e 1972.
Aliás, dessa época tenho um arrependimento pesado: o de, ao longo das mudanças de domicílio, jogar no lixo os tantos exemplares do livro vermelho de Mao Tsé Tung. Se, pelo menos, tivesse conservado unzinho…
Como você, também me solidarizo com aqueles que, ao contrário de mim – com aposentadorias depositadas religiosamente no segundo dia útil de cada mês – PRECISAM de trabalhar para sustentar seus lares, mas estão impedidos.
Um forte abraço de saudades./-
Jim