sexta-feira, 11 de abril de 2014

Aposentados do Aerus completam um mês de protesto e transformam Câmara em dormitório para pressionar governo

Mais de 10 mil ex-servidores de companhias aéreas esperam um acordo sobre fundo falido
Cauê Fonseca

Com idade média de 70 anos, grupo improvisou camas para se acomodar e fixou faixas pedindo apoio. Foto: Cauê Fonseca/Agência RBS
O todo-poderoso Eduardo Cunha (RJ) deixa a sala da liderança do PMDB rumo ao plenário da Câmara. Surpreso, olha a estranha pilha à direita: laranjas, garrafas térmicas e potes.
Mais à frente, no cabide, uma camisa antiga da Varig identifica o grupo. Na quinta-feira, os 20 aposentados do caso Aerus completaram um mês acampados no Salão Verde à espera da chance de negociar com o governo.

Desde que decidiram se “hospedar” na Casa do Povo, os velhinhos do Aerus — idade média de 70 anos — ganharam a simpatia da Câmara. Ordeiros e falantes, começam a rotina às 5h30min, quando os aspiradores de pó acordam o grupo. É hora de devolver as almofadas às cadeiras e recolher a roupa de cama.

Almoço é no “bandejão”, restaurante da Câmara com preços poulares, de até R$ 15. Para as demais refeições, desistiram das telentregas após complicações estomacais. Improvisam frutas e sanduíches. Problema são os banhos. No cair da noite, usam os vestiários de funcionários terceirizados.

A decisão de acampar no Congresso não é inédita. Em agosto de 2013, eles fizeram uma operação de guerrilha. Vestiram diversas mudas de roupa umas sobre as outras e sentaram-se em um dos tapetes em frente à tribuna de imprensa. Ali, ficaram nove dias.
— Daquela vez, fomos hostilizados. Um deputado nos doou colchonetes, e eles foram surrupiados pela própria polícia legislativa. Só não nos tiraram à força porque alguns deputados gritaram: “ninguém mexe com os velhinhos!” — lembra Zoroastro Lima Filho, 83 anos, comandante aposentado da Varig, enquanto veste o pijama.

Na ocasião, aceitaram um aceno de negociação que nunca veio. Agora, respaldados pela decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconhece a responsabilidade da União sobre o fundo falido, negociaram nova ocupação. Eles contam com o apoio do presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e com padrinhos como o senador Paulo Paim (PT) e o deputado Rubens Bueno (PPS-PR).

— Estamos sendo bem tratados, mas ele (Alves) se preocupa com a nossa saúde. Um em cada três já precisou de atendimento no ambulatório da Câmara por problemas respiratórios — diz Graziella Baggio, 58 anos, líder do grupo e ex-comissária da Vasp.

Entediados, os aposentados organizam pequenos atos. Já costuraram e malharam bonecos judas de Arno Augustin (secretário do Tesouro) e Guido Mantega (ministro da Fazenda). Ainda há uma boneca da presidente Dilma Rousseff — de topete e tailleur vermelho —, que ganhou um nariz de Pinóquio e virou ponto turístico.

Na noite de quarta-feira, em que a ocupação completou 30 dias, o grupo encheu balões e preparou o cenário para uma irônica comemoração no dia seguinte, que virou despedida.
Isso porque o grupo recebeu de Paim promessa de uma audiência na Presidência da Câmara, no dia 22, com Luís Inácio Adams, da Advocacia-Geral da União (AGU). O senador prometeu ainda aproveitar a viagem de Dilma ao RS para entregar as reivindicações do grupo à presidente.

Ressabiados, eles ainda esperavam, na noite de quinta-feira, uma confirmação da audiência por escrito, que não chegou. Mais pelo cansaço do que pela esperança de resolução, os velhinhos decidiram aprontar as malas e passar o feriadão de Páscoa em casa.

Saiba o que é o caso Aerus
— Os cerca de 10 mil pensionistas querem que a União assuma a folha do fundo de pensão, estimada em R$ 35 milhões ao mês.

— O caso começou no fim dos anos 1980, quando empresas áreas obtiveram as primeiras autorizações da Secretaria de Previdência Complementar para usar recursos do fundo de pensão, o Aerus, para compensar perdas com o congelamento de tarifas. A verba nunca foi reposta.

— Falido, o fundo está em liquidação desde 2006. Os aposentados e pensionistas têm recebido só um percentual do que teriam direito – cerca de 8%. Em dois meses, o valor cairá a zero com o fim dos recursos fundo.

— Em 12 de março, o STF decidiu que a União deve  pagar indenização à Varig por perdas decorrentes da inflação. O valor pode variar de R$ 3 bilhões, conforme a União, até R$ 9 bilhões, segundo representantes do sindicato Aerus.
Título, Imagem e Texto: Cauê Fonseca, Zero Hora, 11-04-2014

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