domingo, 18 de dezembro de 2016

Pedro e os Lobos


Alberto Gonçalves

Convidaram-me para discutir no Expresso da Meia-Noite as dificuldades de Pedro Passos Coelho em aguentar-se na liderança do PSD. Não fui, mas já que há interessados na minha opinião, ei-la.

Critiquei muito o dr. Passos Coelho quando, aí por 2008, ele era a oposição dentro do partido, e quase tanto quando, pouco depois, ele se estreou na oposição ao governo. À época, se a memória não me falha, achei-o demasiado tolerante perante os perigosos desvarios do eng. Sócrates. Cheguei a achá--lo ao serviço do eng. Sócrates, um exagero justificado de início pelos elogios do dr. Soares (por exemplo) e pelo empenho com que combatia a dra. Ferreira Leite, além das duvidosas companhias que o rodeavam.

Ao contrário do que sucedeu com parte destas, em debandada mal perceberam que não influenciariam o poder, adquiri uma espécie de simpatia pelo dr. Passos Coelho no tempo em que foi primeiro-ministro. Embora a aplicação parcial das medidas da troika - as quais nos livraram provisoriamente da bancarrota - se ficasse pela superfície e não beliscasse os hábitos da casa e do Estado, pareceu-me que a oportunidade desperdiçada se deveu menos ao dr. Passos Coelho do que ao entulho partidário e ao "sistema" que o tolhiam. Hoje, altura em que, sob a aprovação do "sistema", o entulho volta a agitar-se para trocar de chefe, tenho dele a melhor das impressões que se pode ter de um político: por comparação, não é mau de todo.

Se fosse, não causaria o vasto incómodo que por aí se observa. É impressionante a quantidade de vozes que se levantam, ou conspiram baixinho, para exigir o sumiço do dr. Passos Coelho. Dos "barões", "notáveis", "ilustres" e anónimos do PSD, ansiosos por voltar a partilhar o bolo, a emissários assumidos ou dissimulados da esquerda, meio mundo roga ao dr. Passos Coelho que saia do caminho, o caminho dourado da União Nacional. Existe a convicção generalizada de que o homem é um desmancha-prazeres e o último obstáculo a celebrarmos em consenso o país da abundância e dos "afectos". O problema é o país da abundância e dos "afectos" ser uma mentira, uma estratégia que conta com a anestesia geral para despedaçar a sofrível herança anterior a benefício das clientelas, do sucesso eleitoral e, pior, de alucinações ideológicas.

Não sei se, por este andar, o dr. Passos Coelho vai a algum lado. Sei que a sua teimosia em denunciar, nem sempre com assiduidade ou eficácia, a desgraça iminente é uma alusão constante de que nós podíamos ter ido. E de que, se não fomos, a culpa é nossa. Aparentemente sozinho, o dr. Passos Coelho recorda-nos que não há soberania, progresso e outras coisas assim lindas sem responsabilidade, realidade e a dose necessária de sacrifício. Donde o ódio que suscita.
Título e Texto: Alberto Gonçalves, Diário de Notícias, 18-12-2016 

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