quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Não são as armas que matam pessoas, mas as mãos dos mentalmente doentes

Francisco Vianna
A afirmativa do título acima é verdadeira e pode ser demonstrada pelo breve histórico que se segue dos mais conhecidos crimes em massa ocorridos nos EUA nos últimos tempos e as circunstâncias que os envolveram.
1. No massacre de 2007 numa escola técnica da Virgínia, um tal de Seung-Hui Cho, responsável pela carnificina, já tinha sido diagnosticado, ainda criança, como portador de severa desordem de ansiedade e colocado sob tratamento. Mas a escola técnica da Virgínia estava proibida de falar a respeito dos problemas mentais de Cho, por causa das leis federais sobre privacidade. Mais tarde, no curso colegial, Cho passou a apresentar um comportamento ainda mais bizarro do que o apresentado pela média de seus colegas. Ele violentou três mulheres e, sobre isso, permaneceu totalmente calado, recusando-se a contar até para os seus companheiros de quarto. Ele já tinha passado involuntariamente por uma instituição mental durante uma noite e então inadvertidamente se voltou contra o público até que veio a cometer o mais letal assassinato em massa a tiros da história americana.

Cho Seung-Hui era sul-coreano e estudante do Instituto Politécnico da Universidade Estadual da Virgínia (Virginia Tech), em Blacksburg, VA. Invadiu a universidade em 16 de abril de 2007, matando 32 pessoas, deixando mais de quinze feridas e em seguida suicidou-se. Cho estava legalmente nos Estados Unidos desde 1992. O possível motivo para a barbárie teria sido o bullying dos colegas.
2. Em Tucson, no Arizona, em 2011, o atirador de um shopping center, Jared Loughner estava tão obviamente perturbado em seu juízo que se ele tivesse permanecido no Colégio Comunitário Pima o tempo suficiente para pelo menos completar um ano, teria sido muito provavelmente relacionado como perpetrador de assassinato em massa por lá. Depois de Loughner tem feito uma tatuagem, o tatuador, Carl Grace, comentou: "É um cara estranho demais para ser um candidato à Columbine".

Jared Lee Loughner, acusado de assassinato e tentativa de assassinato no tiroteio de Tucson, Arizona, em 8 de janeiro de 2011
Um dos professores de Loughner, Ben McGahee, apresentou inúmeras denúncias contra ele, na esperança de vê-lo removido de sua classe. "Quando virava as costas para escrever no quadro", disse McGahee, "sempre voltava rapidamente, com a nítida impressão que ele tinha uma arma". No seu primeiro dia na escola, a estudante Lynda Sorensen passou um e-mail para suas amigas a respeito de Loughner: "Temos mesmo um estudante em nossa classe que hoje estava bagunceiro; não estou certa de que já estava drogado (como alguém aventara) ou mentalmente perturbado. Ele me deu um pouco de medo. O professor tentou tirá-lo da aula, mas ele se recusou a sair, e foi quando eu conversei com o professor logo a seguir. Espero que ele seja afastado da nossa turma o mais rapidamente possível, e não volte com uma pistola automática na mão".
O último dos diversos e-mails que Sorensen enviou sobre Loughner dizia: “Temos uma pessoa mentalmente instável na nossa classe que me mete um bocado de medo”. Ele é um daqueles cuja foto aparece em notícias, após ter vindo para a aula com uma arma automática. Qualquer um que fosse entrevistado diria, ‘pois é, o cara fazia parte da minha turma de matemática e era realmente esquisito’. Essa era a situação no verão anterior à loucura de Loughner matar seis pessoas num shopping-center de Tucson, incluindo um juiz federal e uma menina de nove anos de idade, além de ter ferido gravemente a deputada republicana Gabrielle Giffords, entre outros.
Loughner também teve desentendimentos com a lei, incluindo uma acusação por posse de uma variedade de drogas proibidas – uma combinação letal com doença mental. Acabou sendo convidado a deixar a faculdade por motivos de insanidade mental. Talvez, se Carl Grace, Ben McGahee ou Lynda Sorensen trabalhasse na área da saúde mental, seis pessoas não teriam morrido naquela manhã de janeiro de 2011, em Tucson. Mas, enviar Loughner para uma instituição mental, no Arizona, teria exigido uma ordem judicial dizendo que ele era um perigo para si mesmo e para a sociedade.
Inúmeros estudos mostram uma correlação entre distúrbio mental severo e comportamento violento. Trinta e um de 61 por cento de todos os homicídios cometidos por indivíduos ocorrem durante seu primeiro surto psicótico – sendo por isso o fato de que os assassinatos em massa frequentemente sejam perpetrados por pessoas sem antecedentes criminais. Não se pode bobear com os mentalmente perturbados, por mais inofensivos que possam aparentar serem.

James Eagan Holmes atirador e assassino em massa perpetrado em 20 de julho de 2012 no Cinema Century, em Aurora, Colorado, que matou 12 pessoas e feriu 58 outras. Não tinha antecedentes criminais e após ter falhado em se suicidar, foi preso, hospitalizado e está condenado à prisão perpétua sem direito à apelação.
3. James Holmes, o atirador acusado do tiroteio de Aurora, no Colorado, é outro que esteve sob cuidados psiquiátricos na Universidade do Colorado muito antes de ter disparado contra uma plateia num cinema. De acordo com os jornais e com os depoimentos em juízo, Holmes contou ao seu psiquiatra, Dra. Lynne Fenton, que ele tinha fantasiado “matar muita gente”, mas a médica se recusou a que os agentes da lei colocassem Holmes em confinamento de 72 horas. No entanto, Fenton se afastou do caso depois que o seu “paciente” fez sérias ameaças contra outro psiquiatra da escola. E, depois que Holmes ameaçou um professor, ele foi, finalmente, convidado a sair do campus. Mas isso foi apenas empurrar o problema com a barriga, pois todos sabiam que Holmes estava profundamente perturbado em sua mente, mas apenas jogaram o problema para a sociedade mesmo com a certeza “clínica” de que ele iria causar estragos em outros lugares.
4. Caso semelhante ocorreu no Brasil, na cidade de Salvador, Bahia, em 1999. Mateus da Costa Meira, um estudante de Medicina, à época, invadiu uma sala de cinema do Morumbi Shopping, em São Paulo, e disparou contra a plateia, matando três pessoas e ferindo cinco. Ele tinha 24 anos na data do crime. A defesa tentou mostrar que Mateus sofria de alucinações, ouvia vozes misteriosas, tinha crises de agressividade, além de um comportamento estranho e solitário. Mas a Justiça de São Paulo refutou a tese de que o ex-estudante era inimputável por doença mental, condenando-o a 120 anos e seis meses de prisão. E isso ocorreu num país onde a posse e o porte de armas de fogo é proibido por lei...

Mateus da Costa Meire, um estudante de Medicina, disparou contra a plateia de um cinema em São Paulo
Certa estava a justiça paulista, ao retirar do convívio social um “doido de pedra” como Meira. No ano passado, a justiça baiana, absolveu Meira, via júri popular, da acusação de tentativa de homicídio contra o colega de prisão, com base na tese refutada pela justiça paulista, ou seja, a de que o ex-estudante de medicina é inimputável por sofrer de doenças mentais atestadas por laudos médicos. Com tal decisão, Mateus foi encaminhado para o Hospital de Custódia e Tratamento (HCT) de Salvador, onde permanece até hoje, onde tem sido mantido incomunicável. A sua defesa pleiteia atualmente, na Justiça baiana, que Mateus seja considerado inimputável também quanto ao crime praticado no cinema em São Paulo. "Para nós, ele é esquizofrênico, mas a Justiça ainda vai avaliar se pode converter a pena em medida de segurança", explica o diretor do HCT Paulo Barreto Guimarães. 
5. De volta aos EUA, pouco se sabe até agora sobre outro demente, Adam Lanza, o autor da chacina da cidade de Newtown, em Connecticut, que matou vinte e seis pessoas numa escola primária da cidade, sendo vinte crianças do jardim-de-infância e seis adultos, incluindo ele próprio e a sua mãe, a quem matou friamente antes de ir à tal escola. Tem sido relatado que a mãe de Lanza, sua primeira vítima, estava tentando convencê-lo a se tratar numa instituição psiquiátrica, provocando a ira do filho. Se isso for verdade – e ao que parece a mídia não está muito interessada em saber se isso é verdade – a Sra. Lanza teria que passar por um processo longo e difícil, difícil ter sucesso.
Tal histórico mostra que, nos EUA, quase ninguém é contra o direito, garantido pela 2ª Emenda Constitucional, de se possuir, portar e usar, dentro da lei, arma de defesa pessoal, de entes queridos, do patrimônio e até de terceiros.
Mas o que parece ser, também, uma quase unanimidade, é o fato de que tal direito, como todos os demais, devam ser consubstanciados por deveres correspondentes e, indubitavelmente, o americano sabe que entre esses deveres devem constar o equilíbrio psicossocial do cidadão, o seu treino e a sua habilidade em lidar e usar suas armas, a reputação de bom cidadão que deve ter, o fato de ser estabelecido e produtivo, além de ter bens e patrimônio capazes de suportar eventuais ações judiciais que venham a ser impetradas em função do uso, mesmo legal, de uma arma. Tal convicção por parte da maioria dos americanos não afasta de forma absoluta a possibilidade de um louco qualquer se apossar de uma arma e cometer suas insanidades, mas que reduz muito essa possibilidade, lá isso não se pode negar. 
Com todos esses casos narrados acima, os EUA são ainda o país onde o índice de assassinatos por arma de fogo é um dos menores do mundo, com uma cifra de 2,6 por cada 100 mil habitantes, ou seja, um dos países mais seguros para se viver. Na totalidade dos países onde a posse, o porte, e o uso legal dessas armas é proibido no continente americano, esse índice chega a ser até quarenta vezes maior, como nos casos da Venezuela, Argentina, Brasil, México e outros.
Desarmar o cidadão de bem, de boa reputação, e consciente de seus deveres e obrigações, é tudo o que a bandidagem, privada e estatal, quer para que ajam livremente, uma vez que não obedecem a proibição de qualquer natureza.
Barak Obama não pode cair na esparrela de querer bater de frente com a 2ª Emenda, mas parece ser esperto o bastante para perceber que os americanos querem que os possuidores de armas, para portá-las e usá-las de forma adequada e legal, estejam de fato preparados tanto sob o aspecto da idoneidade quanto da sanidade psicossocial para fazê-lo.
O Brasil bem que poderia seguir esse modelo.
Título e Texto: Francisco Vianna, 17-01-2012

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